Hoje (08/10), na reunião do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC), no Rio de Janeiro, o plano setorial da Agricultura para reduzir as emissões de gases-estufa pode ser fechado. Se isso ocorrer, será o primeiro plano setorial a decolar entre os cinco que o Brasil se comprometeu a fazer ao divulgar as metas voluntárias nacionais em novembro de 2009, pouco antes da conferência do clima de Copenhague. Tem 60 páginas e alguns eixos que estimulam o sistema de plantio direto, mudanças no financiamento agrícola, transferência de tecnologia para os produtores e o aproveitamento energético a partir de dejetos de animais.
No item do financiamento agrícola, a ideia é abrir linhas que financiem sistemas e não apenas lavouras. “Não é para financiar só a lavoura de soja ou de milho, mas o sistema integrado, que pode ser lavoura e pecuária, por exemplo”, diz o pesquisador Eduardo Assad, da Embrapa Informática. Além de ser um formato mais moderno, o sistema integrado permite que o saldo entre as emissões produzidas e o sequestro de gases-estufa que ocorre quando as plantas crescem, possa ser positivo. “Um boi produz, em média, 1,8 tonelada de CO2 equivalente ao ano e um bom pasto, retira três toneladas de CO2equivalente”, exemplifica Assad. Nessa conta, sobra 1,2 tonelada que pode ser vendida no mercado de carbono no futuro.
O plano setorial segue nessa toada. Dejetos de suínos devem virar matéria-prima para produção de biogás. Em outra ponta, a intenção é ampliar as florestas plantadas em 3 milhões de hectares. A estratégia também procura estimular a transferência de tecnologia ao produtor e o plantio direto na palha da cana, soja, milho e feijão. Há ainda um mecanismo que inocula uma bactéria na semente da planta e permite que ela retire o nitrogênio do ar. No sistema tradicional, o agricultor joga fertilizante e nesta operação se produz NOx, um gás-estufa 296 vezes mais forte que o CO2. Nesse novo sistema, com a bactéria, o processo se inverte.
No início dos trabalhos, a proposta de mitigação de gases-estufa da Agricultura reuniu técnicos do ministério e da Embrapa, mas depois se ampliou. Hoje também concentra entidades de classe como a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) entre outras, além de ONGs como o WWF-Brasil. A coordenação de todos os planos setoriais (há o da energia, do desmatamento da Amazônia e do Cerrado e também do setor siderúrgico) cabe à Casa Civil.
“Nós não admitimos a possibilidade de parar de crescer”, disse ontem em seminário em São Paulo Tereza Campello, que coordena o plano setorial da Agricultura. Ela deu os números: o setor agrícola responde por 25,6% do Produto Interno Bruto e por quase 22% das emissões do país. Se nesse porcentual for somado o desmatamento da Amazônia e de outros biomas, na rubrica conhecida como “uso da terra”, somam-se quase 58% das emissões. “Nossa agenda de crescimento tem que ser adequada com o compromisso de reduzir emissões”, continuou ela. Tereza repetiu a máxima de que a mudança climática tem que ser encarada pelo Brasil como uma oportunidade. “Se não for assim, será limitadora. Podemos ter no futuro que lidar com barreiras alfandegárias justas ou injustas que vão nos impor por conta da agenda do clima.”
O advogado Guarany Osorio, especialista na arquitetura legal climática que está se montando no Brasil, indicou os buracos deste queijo suíço, no evento “Rumo às baixas emissões da agropecuária brasileira”, promovido pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia – IPAM e o Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas. No contexto nacional, o país tem hoje um plano, uma política e um fundo nacional sobre mudança do clima, mas os fios estão desamarrados. Referindo-se à meta de corte de emissões de 36,1% a 38,9% até 2020 que o governo divulgou em 2009, Osório questionou: “Como vai se computar a meta de São Paulo, por exemplo? O Brasil terá uma conta única? Qual será a estrutura governamental para cuidar do tema?”. O pesquisador Daniel Nepstad, do Ipam, assinalou que o Brasil tem que ter ” uma política nacional integrada que traga benefícios para os produtores que fazem a coisa certa no chão. Porque, sem o produtor, nada disto irá para frente”.