Da Redação 05/10/2005 – Frustrado. É assim que o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, resume seu sentimento diante da falta de recursos para o setor enfrentar o que ele chama de “a maior crise da agricultura brasileira em tempos recentes”. Após uma palestra para empresários em Zurique, em que esbanjou otimismo pedindo investimentos estrangeiros no País, Rodrigues recebeu a imprensa e não poupou lamentações: criticou o câmbio, a falta de recursos orçamentários, a taxa de juros e ainda alertou que, se a situação não mudar, o País poderá chegar à contradição de ser temido no exterior como uma potência no setor agrícola e ter de importar alguns alimentos em 2006, como milho.
“A crise na agricultura tem um efeito muito maior para o setor que o impacto da crise política. A crise é muito profunda. Estou frustrado por não ter conseguido equacioná-la, mas compreendo as dificuldades que o governo tem”, aponta o ministro, queixando-se da falta de recursos.
Segundo ele, essas preocupações estão sendo levadas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva desde novembro do ano passado. “Eu entendo a posição do ministro da Fazenda, Antônio Palocci, e estamos nos falando sempre. Estou frustrado, mas entendo que o cobertor é curto.” Chamado por Lula de “ministro cricri”, Rodrigues confirma que “está atrás de dinheiro”.
O que o ministro alerta é que já se pode esperar uma redução do volume físico da produção agrícola para este ano, além de uma pequena queda do superávit comercial. “A área plantada de grãos no Brasil deve cair em 5% neste ano e o padrão tecnológico cairá muito mais”, disse Rodrigues.
Segundo ele, se chover de forma satisfatória em 2006, a safra ficará entre 115 milhões e 120 milhões de toneladas de grãos. Mas um clima pouco adequado pode derrubar o volume para 110 milhões de toneladas. “Seria um desastre”, afirmou, destacando que a perspectiva para este ano era de uma safra de 132 milhões de toneladas de grãos que não irá se confirmar diante da seca no Sul e da quebra de 10 milhões de toneladas de soja.
Rodrigues destaca que os indicadores da crise são inúmeros: queda de 40% no uso do calcário neste ano, queda de 16% do uso de fertilizante, redução de 25% no uso de semente e 20% de diminuição do uso de defensivos agrícolas. O principal indicador, porém, é a queda da renda agrícola em R$ 17 bilhões entre 2004 e 2005.
Segundo o ministro, a perda de renda ainda levou a uma grande inadimplência no setor, que foi respondida pelo governo com a prorrogação de dívidas de R$ 4 bilhões. Rodrigues diz que isso fará com que as taxas de juros sejam ainda maiores em 2006. “A taxa de juros é maior com menos dinheiro, quando a renda é menor.”
Rodrigues insiste que um dos obstáculos ao crescimento da agricultura no Brasil é a limitação de recursos. “O governo gasta muito com a área social e fica pouco para o resto. Não estamos recebendo o suficiente para investimento e pesquisas. Não temos orçamento nem para logística e infra-estrutura.”
O ministro afirma que quer mais R$ 2 bilhões da poupança do Banco do Brasil para o custeio da safra e lembra o compromisso de Lula de alocar R$ 1 bilhão para a comercialização. “Desse total, R$ 400 milhões já foram dados, e essa semana devem sair mais 300 milhões”, afirmou. “Os instrumentos de política agrícola só funcionam com dinheiro.”
Outro ponto destacado por Rodrigues é o câmbio em relação ao dólar. “Com esse câmbio, não há política agrícola que resolva. Com esse câmbio, não há ação do governo que resolva.” Ele destaca que, no caso da soja, muitos exportadores que produzem longe dos portos não conseguem ter preços competitivos. “A conta não fecha. Não adianta uma política agrícola. Vai fazer o quê?”, lamenta. “O câmbio é pesado para nós.”
O ministro ainda põe indiretamente a responsabilidade pelo câmbio sobre o Banco Central e seu objetivo prioritário de lutar contra a inflação com taxas de juros elevadas. “O BC é responsável por combater a inflação, não eu.” Ele garante, porém, que “não pode brigar” com a visão da política monetária do governo porque faz parte dele.
Inflação – Ironicamente, a crise na agricultura pode até provocar aumento dos preços dos alimentos. “Como a oferta de alimentos vai ser menor, pode ser que os preços dos alimentos subam.” Para completar o cenário de contradições, o ministro alerta que o Brasil poderá ter de importar certos produtos no futuro, apesar de sua competitividade agrícola.
“Atravessamos o ano passado com 11% de estoques sobre o consumo nacional. Este ano, a proporção será de 6%. Se 2006 for um ano ruim para a agricultura, poderemos zerar os estoques em relação ao consumo e nos transformar em importador, como no setor do milho.” Questionado se a frustração não o levava a pensar em deixar o governo, Rodrigues reagiu: “Essa não é pergunta que se faça.”
Mais tarde, confessou que esse tema passou por sua cabeça. “Mas temos de ter esperança. É disso que vivemos.” E completou: “Não é fácil ser agricultor no Brasil. Um terço da renda vai para bancos, um terço para o governo e assim mesmo somos competitivos.”