O agricultor é um personagem fundamental no Brasil, pois é ele o responsável por grande parte da receita que entra no País. No Paraná, a sua importância é ainda maior, pois aqui a produção agrícola é muito significativa: em 2008, o Estado foi responsável pela segunda maior participação no valor da produção agrícola nacional, segundo dados da pesquisa Produção Agrícola Municipal (PAM), divulgada em outubro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No entanto, por ironia, o agricultor é o profissional que mais está sujeito a lidar com fatores imprevisíveis, como o clima e o câmbio, por exemplo. E justamente estes dois fatores é que estão causando muita dor de cabeça para eles nos últimos meses, principalmente para quem produz grãos.
Como os preços agrícolas são balizados pelas cotações internacionais em dólar, a perspectiva dos especialistas é de que a receita da produção agrícola no centro-sul do País (soja, milho, arroz, feijão, trigo e algodão) caia cerca de 4,5% no ano que vem. A previsão é da RC Consultores. Isso significa, segundo a consultoria, que os agricultores brasileiros vão deixar de ganhar R$ 3,3 bilhões em relação à última safra. Os especialistas e agricultores consultados por O Estado dizem que as perdas já estão ocorrendo, seja de lucro nas vendas, seja nas exportações. Para se ter uma ideia, de janeiro a setembro deste ano, os valores das exportações de soja caíram 1,5% em relação ao mesmo período do ano passado; 1,6% de queda nas de farelo; e 21%, nas exportações de milho, segundo dados da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep). Embora o volume exportado até tenha aumentado (principalmente de milho), os tempos são de “vacas magras”.
“Esse quadro já era, de certa forma, aguardado por nós, pois tivemos a crise financeira no ano passado, o que já era uma sinalização. E agora temos a questão do câmbio. Não podemos quantificar as perdas ainda, pois dependemos do comportamento da safra nos Estados Unidos e da Argentina, por exemplo. Se a safra americana quebrar, o preço da soja aumenta, então a situação fica mais favorável para nós. Porém, ainda não podemos fazer essa avaliação”, comentou a economista do Departamento Técnico da Faep, Gilda Bozza. O superintendente adjunto da Ocepar, Nelson Costa, diz que a situação já é difícil, independentemente dos resultados das outras safras. “Atrás do dólar a R$ 1,72 temos os custos de produção dos agricultores. Eles compraram insumos, por exemplo, quando o dólar estava a R$ 1,80 e agora ele vai ter que vender com base nos R$ 1,72, então veja a perda que ele vai ter se projetarmos a entrega da safra para março”, comenta.
Recuperação é improvável
Para exemplificar o problema em números, em março deste ano, o preço da saca de milho, por exemplo, era R$ 22. Hoje, passou a R$ 17,50. O representante da Associação dos Produtores de Milho do Estado do Paraná (Apromilho), Alexander Mittelstedt, está desanimado, embora acredite que esse valor de R$ 17,50 se mantenha para a venda da safra em 2010. Segundo ele, além do tempo chuvoso (que atrasou as plantações em pelo menos 20 dias e, consequentemente vai diminuir também o estoque), a queda na renda é certa por conta da desvalorização do dólar, principalmente devido à diminuição nas exportações.
“Como produtor, nós sofremos muito. Agora, além do clima, que deixou estradas intransitáveis e atrasou a aplicação dos herbicidas, deixando algumas plantações com problema de pragas, temos o dólar baixo. Com o dólar baixo, diminui as exportações e o nosso estoque interno vai acumular, mesmo com o consumo interno aquecido. Não sei o quanto teremos de perdas, mas que ganharemos menos já é certeza, calculo cerca de 30% a menos”, lamentou.
Os especialistas têm a mesma visão pessimista acerca da situação dos agricultores. O economista e diretor do curso de Economia do Centro Universitário FAE, Gilmar Lourenço, diz que não acredita em uma recuperação deste cenário até a época da venda da safra 2009-2010. O economista aponta dois principais fatores que levam ao pessimismo: o primeiro é a previsão da safra americana (que para ele não deve ter quebra). “Não deve haver explosão de demanda”, diz ele. Outro fator é o “fantasma” do clima péssimo que vem rondando as lavouras. A mesma visão tem a RC Consultores. Segundo eles, o preço em dólar das commodities em queda são irreversíveis para a safra de 2009-2010. A projeção da RC Consultores é uma queda de preços em dólar para a soja de 6%; para o milho, de 8%; e para o trigo, de 9%. O cenário mais favorável, segundo a RC, fica para o algodão, com alta de 6%, devido à queda na produção e do aumento das compras da China.
Lourenço ainda critica as políticas agrícolas brasileiras. “Nossos seguros para a safra são insuficientes, nossa estrutura de escoamento é precária. Aqui no Brasil, a agricultura deveria ser mais protegida, como é no mundo todo, pois o agricultor lida com questões imprevisíveis. No Brasil não há planos de longo prazo para a agricultura e não há incentivos para a produção de outras culturas, como a fruticultura, por exemplo, que dá um lucro bem maior. Mas infelizmente é mais caro cultivar frutas e os agricultores não se animam para isso”, lamenta.
Seab aposta em retomada, se o tempo ajudar
Ao contrário dos especialistas e produtores, o secretário de Estado da Agricultura e Abastecimento do Paraná (Seab), Valter Bianchini, está mais otimista em relação à safra 2009-2010. Segundo ele, o Paraná tem potencial para produzir 30 milhões de toneladas de grãos no ano que vem, enquanto na safra passada encerrou com 25,28 milhões de toneladas. Mas isso se o clima ajudar. “No ano passado tivemos uma produção recorde. Mas este ano quase tudo está dando errado para o setor de grãos. Embora haja diminuição da área plantada de milho, aumento na de soja, e manutenção na de feijão, com certeza, retomaremos a produção se o clima ajudar. E com a recuperação na produção teremos o aumento na renda”, analisa. O secretário também está apostando na quebra das safras americana e argentina, o que poderá contribuir com o aumento nos preços. “Mas ainda é cedo para falar”, diz ele.
No entanto, quando o assunto é o câmbio, o secretário se sente um pouco mais inseguro. “Se o valor do dólar se mantiver, se tivermos boas safras no restante do mundo, estimo que as perdas das rendas em todo o País poderão ser de 3% a 4%”, analisa. O secretário diz, ainda, que o governo brasileiro tem investido em políticas públicas para a agricultura, como o aumento do crédito e a intervenção do Ministério da Fazenda na questão do câmbio, ocorrida na semana passada.
Porém, para o economista e diretor do curso de Economia do Centro Universitário FAE, Gilmar Lourenço, as medidas do Ministério (como a de taxar custos para o investimento no Brasil) são insuficientes perto da valorização cambial. “Elas não animam, só tiveram efeitos especulativos até agora”, avalia. Já o presidente da Associação dos Produtores de Milho do Estado do Paraná (Apromilho), Alexander Mittelstedt, acredita que o quadro pode mudar no ano que vem. “Acredito que o governo vai ajudar, pois tem também a questão política do dólar, e não só das exportações. Sem falar que ano que vem é tempo de eleições”, comenta.
Paraná é destaque em pesquisa
Na pesquisa do Produção Agrícola Municipal (PAM), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgada em outubro, o Paraná se destacou na citricultura. O Estado teve produtividade de frutas, em 2008, superior à dos outros estados brasileiros (517,4 mil toneladas de laranja, por exemplo). O Estado também foi responsável por mais da metade da produção de trigo (50,9% do trigo produzido no País vem do Paraná); milho (26,5%) e feijão (22,3%). O Paraná se destacou, ainda, como segundo maior produtor de soja (19,9%), perdendo apenas para o Mato Grosso, responsável por 29,1% da produção nacional.
No Paraná, o maior produtor de trigo, em 2008, foi Tibagi. Já com relação ao feijão, os municípios destacados na pesquisa do IBGE foram Prudentópolis, Castro, Irati, Reserva e Lapa. A respeito da soja, nenhum município paranaense apareceu no ranking dos 20 maiores produtores.