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Energia

Argentina e Brasil avançam em projeto de hidrelétricas

Em meio às dúvidas sobre o abastecimento de energia nos dois países, Brasil e Argentina pretendem acelerar o projeto de construção de duas usinas hidrelétricas no rio Uruguai.

Argentina e Brasil avançam em projeto de hidrelétricas

Em meio às dúvidas sobre o abastecimento de energia nos dois lados da fronteira, o Brasil e a Argentina pretendem acelerar o projeto de construção de duas novas usinas hidrelétricas no rio Uruguai. Juntas, elas vão ter capacidade para gerar 2.200 megawatts (MW) e estão orçadas preliminarmente em US$ 5,2 bilhões. Os investimentos e a energia produzida serão divididos pelos dois países em partes iguais.

Um consórcio de empresas brasileiras e argentinas elabora, desde maio do ano passado, os estudos de viabilidade técnica e os estudos de impacto ambiental (EIA-Rima) das usinas de Garabi e Panambi. O prazo para a entrega dos trabalhos vence em fevereiro de 2015. A Eletrobras, que toca o projeto das hidrelétricas junto com a estatal argentina Ebisa, já conta com uma antecipação. “Esperamos ter os estudos prontos no fim deste ano”, afirmou ao Valor o diretor de geração da Eletrobras, Valter Cardeal.

O Ministério de Minas e Energia foi na mesma linha. Consultado pelo Valor, informou que as estatais “estão se esforçando junto aos consultores para completar os estudos em 2014”.

Um passo importante para tirar as usinas do papel, segundo Cardeal, foi dado na semana passada: o Ibama liberou o termo de referência definitivo dos estudos ambientais. Com isso, os empreendedores já têm um roteiro completo para o processo de licenciamento das hidrelétricas.

Se o projeto for mesmo levado adiante, não será preciso fazer um leilão de concessão das usinas, o que normalmente ocorre no setor. Como elas estão na fronteira, a Eletrobras e a Ebisa ficam responsáveis pelo empreendimento e podem partir diretamente para a licitação das obras civis, constituindo uma empresa binacional – nos moldes de Itaipu – para isso. A expectativa de Cardeal é que as empreiteiras possam ser contratadas e as obras tenham início ainda em 2015, antecipando os planos de construção a partir de 2016.
 
A usina de Garabi tem potência de 1.152 MW e orçamento estimado em US$ 2,7 bilhões. Panambi está projetada para gerar 1.048 MW e exige investimentos de US$ 2,4 bilhões. O modelo de comercialização da energia ainda está em processo de definição, mas cada país vai ficar com metade de tudo o que for produzido.

Apesar do otimismo oficial, a possibilidade de avanços concretos é colocada em xeque por analistas como Nivalde de Castro, coordenador do grupo de estudos do setor elétrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

“A maior dificuldade dessas usinas é a situação econômica e financeira da Argentina”, afirma Castro, um estudioso do processo de integração energética da América do Sul. Ele duvida da capacidade do país vizinho de bancar metade dos investimentos nas hidrelétricas, ou mesmo de ter garantias suficientes para um financiamento de longo prazo.

Para o professor, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) “teria dificuldades” em financiar a parte argentina das usinas, porque falta um marco regulatório claro e as tarifas de energia são fortemente subsidiadas no país vizinho. “Como a Argentina pode assinar um contrato de longo prazo com um agente financiador, se não permite sequer o reajuste de tarifas?”, questiona Castro.

Nos bastidores, empreiteiras interessadas nas hidrelétricas de Garabi e Panambi apontam as mesmas dificuldades e estão pouco esperançosas de que as obras possam começar em 2015.

Caso saiam da gaveta, as duas usinas constituem uma das últimas oportunidades de ter grandes aproveitamentos hidrelétricas perto dos principais centros de consumo de energia, nas regiões Sul e Sudeste. As apostas mais recentes para a ampliação do parque gerador brasileiro estão concentradas na Amazônia.

Mesmo longe da floresta amazônica, o projeto de Garabi e Panambi enfrenta forte resistência de movimentos sociais e ambientais. Em ofício enviado a várias autoridades federais, no dia 13 de fevereiro, o Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (Ingá) aponta dez problemas e riscos decorrentes das usinas. “Temos todos os indícios de que o rio Uruguai já tem sua capacidade inteiramente comprometida para aproveitamentos hidrelétricos”, diz o coordenador-geral do instituto, Paulo Brack.

Brack diz que as quatro usinas construídas nos rios Uruguai e Pelotas – Itá, Machadinho, Foz do Chapecó e Barra Grande – comprometem a oxigenação por causa das águas paradas e ameaçam a sobrevivência de espécies como o dourado. O peixe, segundo ele, precisa de corredores de 80 quilômetros a 120 quilômetros sem barragens para sobreviver.

No ofício – enviado ao Ministério do Meio Ambiente, ao Ibama e ao Ministério Público Federal -, o Ingá também questiona a legalidade dos projetos. Lembra que, para a construção da hidrelétrica de Barra Grande, foi firmado termo de compromisso que determinava a criação de um corredor ecológico do rio Pelotas-Aparados da Serra, na mesma região, e a aquisição de área de 5.740 hectares para fins ambientais. Nada disso, segundo o instituto, teria ocorrido. Outra promessa que teria ficado no papel foi uma avaliação ambiental integrada dos dois lados do rio Uruguai – Argentina e Brasil.

A estatal argentina Ebisa afirma que foram estudadas 42 alternativas de localização para as barragens. Isso permitiu reduzir em 72% a área de inundação inicialmente prevista e preservar o Salto do Yucumã, um dos pontos turísticos mais valorizados do Rio Grande do Sul, o que é visto com temor por ambientalistas.

O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) também se articula contra as duas hidrelétricas e tem estimativas de que elas podem exigir a remoção de 15 mil famílias em 30 municípios.