Redação (18/02/2009)- Preocupado com o que classifica de desequilíbrio na relação entre os dois países, a Argentina pediu ontem ao Brasil que regulamente o chamado Mecanismo de Adaptação Competitiva (MAC), que permite aos dois países levantar barreiras à importação de produtos do outro, em caso de forte e súbito aumento de importações. Segundo o ministro de Relações Exteriores argentino, Jorge Taiana, eles querem, também, estender a outros setores industriais o mecanismo "flex", existente no setor automotivo, que limita as exportações a um percentual das importações entre os sócios. Fabio Rodrigues Pozzebom/AB
Ministros brasileiros e argentinos durante reunião de comércio entre os dois países, no Palácio do Itamaraty
As propostas argentinas fazem parte do pacote de sugestões levados à reunião, ontem, entre 6 ministros e quase 40 assessores argentinos e brasileiros, marcada para evitar uma escalada protecionista no Mercosul. Ao fim do encontro, de quase duas horas e meia, o ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, em entrevista ao lado de Taiana, declarou que encontrar um ponto comum entre as demandas argentinas e as reivindicações brasileiras de fim de barreiras ao comércio bilateral será um "teste de estresse" da viabilidade do Mercosul. "Estamos vivendo a hora da verdade", afirmou.
Na entrevista após o encontro, nem Taiana nem Amorim revelaram as propostas discutidas na reunião. Reconheceram que houve divergências, mas enfatizaram o "bom diálogo" e o interesse em encontrar uma solução conjunta, "mutuamente satisfatória". O governo brasileiro rejeita propostas de aumentar restrições ao comércio bilateral, e oferece, em troca, a criação de mecanismos para estimular investimentos na Argentina e incentivar exportações ao Brasil, como aumento do comércio em moeda local. Foi criado um grupo de trabalho encarregado de criar uma proposta comum, com "meios financeiros criativos."
O grupo terá de se reunir no dia 4 de março, em Buenos Aires, com a tarefa de produzir um relatório para ser discutido entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Cristina Kirchner, que se encontram em São Paulo, em março, e em Buenos Aires, em 23 de abril. O grupo também discutirá, segundo Amorim, "propostas criativas" para atender às preocupações argentinas com o desequilíbrio de comércio, "tendo compreensão eventualmente se houver setor que esteja sendo profundamente afetado, mas também buscando evitar o protecionismo como prática e olhando o crescimento do comércio como objetivo final."
Até lá, continuam em vigor as barreiras não-tarifárias aplicadas pela Argentina, com licenças não-automáticas de importação para produtos como têxteis – alvo de reclamação de industriais brasileiros, que sugeriram retaliações comerciais ao sócio no Mercosul. "As normas vigentes na Argentina seguem em vigor, como no Brasil seguem em vigência as normas do país", disse Taiana, para quem medidas brasileiras de incentivo à indústria e de exigência de normas técnicas têm o mesmo efeito de distorcer o comércio bilateral.
Os argentinos comparam o que se passa entre Brasil e Argentina à situação existente no mundo, em que os países ricos vêm criando mecanismos de apoio financeiro às indústrias. Esse apoio, classificado como um "subsídio" na Argentina deixa aos países "pobres" como única compensação para seus produtores o levantamento de barreiras ao comércio, para proteger as indústrias locais. Caso contrário, dizem, numa união aduaneira como o Mercosul, a tendência dos investimentos é deslocar-se para o país mais forte economicamente, no caso o Brasil, esvaziando o sócio menor.
O encontro também teve a participação, pelo Brasil, dos ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Desenvolvimento, Miguel Jorge, e, pela Argentina, dos ministros da Economia, Carlos Fernández, e da Produção, Débora Giorgio. Esta última afirmou que a Argentina tenta criar uma política industrial e pede ao Brasil que garanta um espaço para consolidação de alguns setores industriais argentinos.
Os dois governos concordaram em dois pontos: discutirão pontos comuns de defesa comercial em relação a terceiros países (asiáticos, especialmente) e coordenarão posições para a reunião do G-20 financeiro, que reunirá em abril chefes de Estado das economias mais influentes, entre elas o Brasil, e será precedida por uma reunião, em março, dos ministros da Fazenda desses países.