Fonte CEPEA

Carregando cotações...

Ver cotações

Economia

Ascenção da Bahia

Agricultura de ponta e mazelas estruturais marcam oeste baiano que deve receber melhorias sociais e de infraestrutura.

A rentável colheita de grãos e algodão esperada neste ano no oeste da Bahia alimenta entre governos locais, agricultores e sociedade civil em geral a discussão em torno dos destinos dos lucros. Ao mesmo tempo em que tendem a estimular a expansão da área produtiva e novos investimentos em tecnologias aplicadas nas lavouras, é consenso na região que a bonança tem de servir também para financiar melhorias sociais e de infraestrutura, sob o risco de que o crescimento desordenado trave o desenvolvimento futuro de municípios importantes como Luís Eduardo Magalhães, Barreiras e São Desidério.

Antes de visitar a região na semana passada a convite do Rally da Safra, organizado pela Agroconsult, o Valor conversou, por telefone, com o prefeito de Luís Eduardo Magalhães, Humberto Santa Cruz (PP). Produtor de soja e algodão no oeste baiano, além de café, laranja e mamão irrigados, Santa Cruz adiantou aquilo que a reportagem conferiu in loco nos dias 18 e 19: o que há de melhor em termos de lavouras e carências estruturais agudas.

É certo que “LEM”, como Luís Eduardo Magalhães é conhecida, é uma cidade nova e extensa – tem 3.941 quilômetros quadrados (394,1 mil hectares). Mas seu crescimento populacional tem sido vertiginoso, e na área urbana está difícil combater o avanço das favelas e as mazelas em serviços essenciais como habitação, saúde ou educação. Em 2000, quando passou de distrito da vizinha Barreiras a município, LEM tinha 18 mil habitantes; atualmente, de acordo com o IBGE, tem mais de 60 mil.

“Estamos com produtividades elevadas e preços [dos principais cultivos agrícolas] em nível excelente, e é claro que isso ajuda. LEM é o município que mais cresceu no país na última década e o gestor público não consegue resolver seus problemas sozinho”, diz o prefeito. Segundo ele, governo e produtores assinaram em 2010 um convênio para melhorias em 800 quilômetros de estradas vicinais e outras parcerias foram firmadas para a pavimentação das ruas de bairros carentes da cidade.

Além desse tipo de associação, Santa Cruz diz que o aumento do orçamento da prefeitura em 2011 servirá para irrigar projetos sociais, sobretudo em saúde e saneamento. Em 2010, o orçamento total de LEM foi de R$ 96 milhões, valor que cresceu para R$ 121 milhões em 2011 – 36% do total voltado a gastos com pessoal. Não há um hospital na cidade, e à única maternidade e sua pequena estrutura para pequenas cirurgias o prefeito esperar agregar novos postos de saúde.

No setor de saneamento, o objetivo é alcançar, na área de tratamento de esgoto, pelo menos 50% até meados do ano, ante percentual que hoje é próximo de zero. Em habitação, o déficit já chega a 4 mil moradias de baixa renda, e o número de alunos na rede pública de ensino pulou de 10 mil, em janeiro de 2009, para 14,1 mil no mesmo mês de 2011. Há 23 escolas em LEM, e a prefeitura precisa escalar dois professores por sala de aula para atender à crescente demanda.

Santa Cruz também pretende implantar no município, até pela grande área que ele ocupa, um conceito de cidade inteligente, com escolas, postos de saúde e outros serviços interligados pela internet. Quando o valor da produção agropecuária aumenta, afirma, a arrecadação de ICMS aumenta e o combate às mazelas fica um pouco menos difícil. Mas o crescimento acelerado continua, e os desafios vão aumentar. “Nos próximos cinco anos, a expectativa é que nossa população dobre; nos próximos 15 anos, deverá triplicar”, afirma Santa Cruz.

Segundo a Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba), as colheitas de soja, algodão, milho, café, arroz, feijão, capim para sementes e sorgo deverão somar 6,2 milhões de toneladas neste ano em todo o oeste do Estado, 7% mais que em 2010. E, conforme o prefeito de LEM, o valor bruto da produção deverá alcançar R$ 6,2 bilhões, com crescimento de 9%. Os incrementos de volume e receita serão puxados pelo algodão, uma lavoura de custo elevado e alto risco, sujeita a grandes prejuízos ou, como no ciclo atual, lucros também polpudos, estimados em mais de R$ 3 mil por hectare em 2010/11.

Diante dos excelentes preços e margens das principais lavouras do oeste da Bahia neste ano, o presidente da Aiba, Walter Horita, está otimista. “Só não vai ganhar dinheiro na agricultura este quem não colher. Desde que estou na agricultura, 2011 será o melhor ano em temos de rentabilidade”, disse Horita, que produz no oeste baiano desde 1984, em recente entrevista ao Valor. Em seus cálculos – e a depender do comportamento das chuvas nas próximas semanas -, a margem poderá chegar a 200% em algumas lavouras de algodão, enquanto na soja, que ocupa a maior parte da área plantada na região, será de até 100%.

Como sempre na agricultura, a situação dos produtores não é homogênea. O nível de utilização de insumos, a estratégia de vendas, o endividamento e questões fitossanitárias são apenas alguns dos fatores que influenciam a rentabilidade das plantações. Como lembra o produtor Clovis Ceolin, de São Desidério, 60% da safra de algodão que começará a ser colhida na região a partir de maio foi vendida no ano passado com preços inferiores aos praticados atualmente. Já eram preços remuneradores, mas não haviam alcançado as máximas históricas depois vistas no mercado internacional.

No caso da soja, como confirmou o Valor na maioria das lavouras que visitou em Barreiras a convite do Rally da Safra, o problema é a elevada incidência de um fungo conhecido como mofo branco, cujo combate vem elevando custos e contra o qual ainda não há fungicidas específicos. Em parte da área plantada por um grande produtor da cidade, a colheita de soja não renderá mais que 40 sacas de 60 quilos por hectare por causa do mofo branco, e inicialmente eram esperadas pelo menos 55 sacas.

Grandes grupos como o Sementes Aurora, que conta com 8 mil hectares próprios e 5 mil arrendados, além de uma rede de cooperados que agregam outros 30 mil hectares à sua área de cultivo de sementes de soja e milho, o ataque ao mofo tem sido feito com manejos químico e biológico e maior espaçamento entre as fileiras das lavouras. A doença tem sido evitada, mas a batalha já representa 33% do custo direto com insumos (exceto fertilizantes).

Nada que desanime os agricultores. Walter Horita, da Aiba, informa que, dependendo do resultado das discussões ambientais que cercam o novo Código Florestal que entrará em vigor, a área total de plantio no oeste da Bahia poderá chegar a 2,5 milhões de hectares, com áreas de preservação permanente (APPs) e 20% de reserva legal nas propriedades. Como ele acredita que o fluxo migratório vai perder força, as prefeituras deverão conseguir, a partir de agora, melhorar a infraestrutura disponível, inclusive para melhorar a qualificação profissional da mão de obra disponível na região.