Osler Desouzart
A avicultura, tanto de carne quanto de postura, desempenha um papel fundamental no cenário global e na América Latina. Com crescimento constante, a região se consolida como uma das principais produtoras e exportadoras, graças ao uso de tecnologias avançadas e práticas sustentáveis. Esta análise apresenta as oportunidades e questões que envolvem o setor avícola, considerando tanto o contexto mundial quanto o latino-americano.
Neste mês de novembro, a importância desse setor será debatida no OVUM 2024 – XXVIII Congresso Latino-Americano de Avicultura, que acontece em Punta del Este, Uruguai. O evento, além de celebrar os avanços da avicultura na região, será uma oportunidade para discutir os principais desafios e oportunidades no cenário global, conectando as tendências mundiais com a realidade da América Latina.
É comum ler notícias que informam que a nutrição humana prioriza os produtos de origem vegetal e que os de origem animal são os responsáveis por todos os males do mundo. Esse mantra é repetido por ativistas alimentares, o que me leva a chamá-los de “os novos evangelistas”.
Os fatos e dados contestam esse novo evangelho. No Gráfico I, observamos que entre 1990 e 2023, a produção mundial de carne de aves cresceu 8 vezes mais, e a de ovos 35 vezes mais, do que a expansão demográfica mundial no mesmo período. Contudo, produtos de origem vegetal, como soja e milho, também registraram um importante crescimento, compatível com sua utilização em rações animais, cujos rebanhos cresceram notavelmente no mundo.
Essa constatação estatística é confirmada no Gráfico II, que mostra que a expansão de 295% no fornecimento de energia alimentar (kcal/pessoa/dia) em nível mundial entre 1965 e 2022 deve-se ao fato de que o consumo de produtos de origem animal cresceu 479%, comparado a um aumento de 258% dos produtos de origem vegetal.
Estudos de dados de 204 países mostram que a equação “+ RENDA = + PROTEÍNAS ANIMAIS” ocorre em 202 desses países, como demonstra o exemplo da China, que lidera a nova expansão da demanda global por produtos do agronegócio, especialmente na Ásia.
E continuaremos a produzir e consumir mais carnes, apesar da campanha liderada pelos novos evangelistas, que afirmam que o consumo de carne destruirá o planeta. Até 1979, a carne bovina era a mais consumida no mundo, posição que perdeu para a carne suína naquele ano. E desde 2018, as carnes de aves, lideradas pelo frango, ocupam o primeiro lugar, posição que não mais perderão, graças à sua eficiência no uso de recursos naturais, já que a agricultura e a pecuária dependem de fotossíntese, terra arável e água, recursos escassos e mal distribuídos no planeta.
Qual é a carne de aves mais produzida e consumida no mundo? O frango é o rei, e sua posição só se fortalece, uma vez que a produção mundial de peru vem experimentando reduções progressivas desde 2016.
A Tabela I mostra que a geografia da produção de carne de aves sofreu mudanças significativas desde 1965, quando passamos da produção de quintal para a avicultura industrial. Até a primeira metade da década de 1990, a produção mundial era concentrada na América do Norte e Europa, liderança que foi cedida para a Ásia e América Latina desde 1995.
E essa liderança em termos de crescimento se acentuará na próxima década (conforme o Gráfico V).
Os prognósticos exibidos no Gráfico VI devem ser superados na América Latina, já que só o Brasil exportou 5.139 mil toneladas de carnes de aves em 2023. Os números relativos a 2024 seguem com uma discreta redução em relação a 2023, devido a um falso positivo de Newcastle, episódio encerrado, o que resultou na suspensão temporária de embarques para China e México, dois de seus maiores mercados.
As razões para o crescimento do consumo de aves de corte, centrado no frango, não estão no “preço”, como muitos pensam. Abaixo estão alguns dos fatores que contribuem para essa posição:
- Frango é acessível, fácil de encontrar, conveniente, versátil, simples de preparar e pode ser cozido de inúmeras maneiras. Seu sabor é amplamente aceito.
- O frango não sofre restrições religiosas e é considerado uma carne saudável, com baixo teor de gordura.
- Mais produtos de frango foram introduzidos no mercado desde os anos 1990 do que todas as outras carnes juntas, permitindo seu consumo várias vezes por semana sem se tornar monótono para o consumidor.
- As aves, especialmente o frango, requerem menos recursos naturais para sua produção do que qualquer outra espécie animal terrestre.
Há ainda muito a ser dito, mas vou finalizar essa parte relativa à avicultura de carne com três gráficos que apresentam o balanço mundial e latino-americano de carnes de aves (Gráficos VI e VII). O terceiro gráfico mostrará os principais países produtores de carne de aves em 2032, já que as projeções para 2033 são preliminares e não cobrem todos os principais países.
A Tabela III exibe os dados de produção disponíveis de países latino-americanos, com minhas desculpas aos amigos dos países cujos dados não estavam disponíveis quando da elaboração deste artigo.
Agora, passemos à avicultura de postura, de suma importância, pois os ovos são tão nutritivos que muitas vezes são chamados de “o multivitamínico da natureza”. Depois do leite materno, o ovo é o alimento mais completo da natureza.
Ovos são uma fonte de alimento completa, especialmente recomendados para a primeira e terceira idades. O ovo faz parte da dieta do bebê a partir dos 6 meses de vida.
Dois carotenoides presentes no ovo, luteína e zeaxantina, têm ação antioxidante, combatendo os radicais livres. A luteína também estimula a formação óssea e inibe a ação de osteoclastos, células responsáveis pela reabsorção óssea. Os ovos contêm ainda leucina, que favorece a síntese de massa muscular e pode ter um efeito positivo na manutenção óssea.
Mas os ovos aumentam o colesterol e o risco de doenças cardíacas ou AVC? Estudos observacionais e meta-análises recentes descobriram que consumir ovos pode não aumentar o risco de doenças cardíacas ou seus fatores de risco, como inflamação, endurecimento das artérias e altos níveis de colesterol. Hoje, é amplamente proclamado que os ovos são saudáveis, acessíveis e saborosos.
Em nível mundial, estima-se que, em 2022, 149 milhões de crianças menores de 5 anos tenham atraso no crescimento (muito baixas para sua idade), 45 milhões tenham desnutrição (muito magras para sua altura), e 37 milhões sofram de sobrepeso ou obesidade. Quase metade das mortes de crianças menores de 5 anos está relacionada à desnutrição.
Iniciativas como “um ovo por dia” têm tido sucesso na prevenção da desnutrição em países africanos e do sudeste asiático, seguindo o exemplo bem-sucedido da China.
Como estamos vivendo mais e tendo menos filhos, a família de hoje muitas vezes inclui animais de estimação. Hoje, estima-se que haja cerca de 900 milhões de cães e 370 milhões de gatos no mundo. Cerca de metade da população mundial possui um animal de estimação. Mas sabiam que oferecer ovos para cães tem se tornado comum, devido à maior demanda por dietas naturais? Os ovos são uma excelente alternativa como lanche para eles.
A Tabela III confirma que a América Latina e o Caribe apresentam o segundo maior crescimento na produção de ovos, logo após a Ásia, posições que não mudarão na próxima década (conforme o Gráfico XI).
Isso se deve ao fato de que três países asiáticos representaram 50,6% da produção mundial de ovos em 2022, e outros três (Japão, Turquia e Paquistão) estavam entre os 15 maiores produtores mundiais, como mostra o Gráfico XII. É interessante observar que Brasil, México, Colômbia e Argentina também fazem parte dessa classificação.
Para evitar que este artigo se transforme em um tratado entediante, vou resistir à tentação de incluir mais dados e comentários. Concluirei com as projeções até 2033 dos balanços de produção de ovos no mundo e na América Latina, observando apenas que há indicações de que as exportações latino-americanas de ovos devem superar as projeções apresentadas no Gráfico XIV.
Finalmente, a Tabela IV traz as projeções de produção de ovos de alguns países sul-americanos até 2033.
O hemisfério americano continuará gerando excedentes exportáveis de produtos agrícolas e pecuários, e a América Latina desempenhará um papel preponderante nesse processo.
Contaremos com um “time dos sonhos” de cientistas, empresários e pesquisadores que ajudarão a tirar a avicultura de carne e postura do quintal e tornar a carne de aves e os ovos acessíveis globalmente.
O programa de conferências nos ajudará a colocar em prática o que o guru Arie de Geus ensinava: “A fonte básica de toda vantagem competitiva reside na capacidade relativa de cada corporação de aprender mais rapidamente do que seus concorrentes”.
Com o crescimento contínuo do setor, a América Latina se posiciona como um líder estratégico no abastecimento global de alimentos. Este avanço traz não apenas oportunidades econômicas, mas também a responsabilidade de garantir práticas éticas e sustentáveis na produção.
Confira a nossa participação ao evento OVUM 2024 que estamos presentes com a Avicultura Industrial n°1336 no Uruguai! Leia aqui