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Exportação

'Básico do básico' ganha espaço na exportação

Os básicos exportados pelo Brasil tornaram-se mais básicos. O fenômeno é evidente no grupo dos cinco produtos mais importantes da pauta de exportação.

As commodities vendidas ao exterior não só avançaram de 65% em 2009 para os atuais 70% de participação na exportação brasileira como também passaram por um processo de maior “empobrecimento”. O fenômeno é evidente no grupo dos cinco produtos mais importantes da pauta de exportação brasileira – minério de ferro, petróleo, soja, açúcar e café. Dentro de cada um desses grupos, os embarques dos produtos mais básicos cresceram em ritmo mais acelerado do que aqueles com maior valor agregado.

Dentro do complexo soja, por exemplo, a exportação do grão avançou desde 2005 muito mais que rapidamente que os embarques de farelo e óleo. De janeiro a novembro do ano passado, a soja em grão representou 68% dos US$ 22,97 bilhões exportados com o produto e seus derivados. Nos mesmos meses de 2005, essa fatia era de 57,3%. Há seis anos, a venda ao exterior de farelo de soja equivalia a pouco mais da metade da soja em grão exportada. No ano passado, essa participação caiu para 34,14%.

Em 2005, o minério de ferro aglomerado representava 39,2% do minério de ferro total exportado pelo Brasil. O valor embarcado de minério de ferro teve forte elevação no ano passado, mas a versão não aglomerada, que é mais bruta, avançou muito mais que o minério aglomerado, cuja participação caiu em 2011 para 23,8% do total exportado do produto. O não aglomerado avançou, no período, de 60,8% para 76,2%. Os dados são do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic).

No grupo do açúcar, os produtos mais industrializados também perderam espaço. De janeiro a novembro de 2005, o açúcar refinado representava 39,8% do valor total embarcado do grupo. No mesmo período do ano passado, a participação caiu para 20,8%. A boa notícia é que o álcool etílico passou a integrar o grupo no decorrer dos últimos anos, assumindo fatia de 8,7% do total embarcado no ano passado. Mesmo assim, o açúcar bruto, menos processado que a versão refinada, elevou sua representatividade de 60,2% em 2005 para 70,5% do total exportado dentro do grupo de açúcar e álcool no ano passado.

Para o economista Fabio Silveira, sócio da RC Consultores, os exemplos revelam que a perda de competitividade em razão do custo elevado de industrialização atinge não só os manufaturados mais sofisticados, mas também as cadeias produtivas mais curtas. “Há um estreitamento do número de bens exportados acompanhada da redução de patamar tecnológico”, diz ele. Quanto mais longa a cadeia produtiva, explica o economista, mais representativa a carga tributária e mais pesado o custo financeiro e o volume de encargos trabalhistas.

Fabio Trigueirinho, secretário-geral da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), explica que um dos desafios da produção brasileira de soja é conseguir exportar não só o grão, mas também os derivados, que têm maior agregação de valor.

O desafio esbarra em políticas protecionistas no destino. A China, parceiro mais importante na venda ao exterior da soja brasileira, diz Trigueirinho, aplica tarifas mais elevadas para os desembarques de farelo e óleo do que para a soja em grão. O problema, porém, não está somente na ponta do desembarque.

“Os argentinos conseguem exportar uma proporção maior de farelo e óleo de soja”, lembra José Augusto de Castro, presidente em exercício da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). No Brasil, a soja em grão significa 68% do total exportado dentro do complexo soja. O farelo representa 23,2% e o óleo, 8,7%. Na exportação argentina do complexo soja entre janeiro e agosto de 2011, 48,6% foram de farinha. Tanto o óleo quanto o grão ficaram com uma fatia próxima a 26% cada um.

A carga tributária é a maior variável que diferencia as condições de produção entre o Brasil e o país vizinho, diz Trigueirinho. O principal problema é com o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). O tributo pesa mais quando há algum processo de industrialização, principalmente quando se trata de exportação.

Se é produzida num Estado e vendida desse local diretamente ao exterior, sem processamento, em grão ou apenas triturada, a soja fica livre do ICMS, porque na operação de venda ao exterior o imposto não é cobrado.

O problema é quando a soja produzida no Mato Grosso, por exemplo, é vendida para ser beneficiada em outro Estado. Nessa operação o grão é tributado com 12% de ICMS. Depois de virar farelo ou óleo, o produto fica livre de imposto na operação de exportação. Teoricamente a indústria fica com o crédito do imposto. Ou seja, os 12% de imposto pagos seriam ressarcidos ao exportador.

Isso, porém, não acontece na prática. O imposto poderia ser compensado com o ICMS devido nas operações internas, mas as indústrias não possuem vendas domésticas suficientes para utilizar todo o crédito ou as operações internas são espalhadas por todo o Brasil. Poucas são no Mato Grosso – continuando com o mesmo exemplo dado -, Estado no qual está o crédito de ICMS.

O crédito não recuperado significa custo definitivo. “Na verdade, a margem permitida pelo maior valor agregado com a industrialização da soja não compensa esse custo”, diz Trigueirinho. Na Argentina, diz, há uma política de apoio à exportação, cuja produção conta com tributação mais favorável e subsídio na aquisição de energia.

O sistema brasileiro de impostos faz o contrário: estimula a exportação da matéria-prima e não do manufaturado. E o ICMS é apenas um exemplo. Há dificuldade com outras contribuições federais, como Funrural, PIS e Cofins, lembra Trigueirinho. Resultado: o Brasil é o segundo produtor de soja e apenas o quarto processador do grão no mundo.

A soja é apenas um exemplo dos efeitos do imposto para a industrialização de produtos básicos, diz Castro. O problema se repete nas demais commodities. Para alguns grupos de produtos, lembra ele, é possível que o Brasil não tenha capacidade de produção industrial e, por isso, o produto mais bruto ganhe espaço na exportação em ritmo mais acelerado.

Ele dá como exemplo o setor de celulose e papel. Dentro desse grupo, a celulose avançou de 58,9% das exportações do setor para 69,4%. O papel recuou de 40,9% para 30,5%. “O Brasil tem atraído muito mais investimentos em celulose do que em papel”, diz Castro. Mas talvez, afirma, isso também seja resultado de uma política que acaba desestimulando a industrialização, principalmente quando o objetivo é a exportação.

Silveira lembra que a taxa de câmbio também contribuiu nos últimos anos para tornar a exportação menos rentável. A valorização do real frente ao dólar fez a pressão dos custos em moeda nacional ser maior, diz, agravando problemas estruturais nos custos de produção.

A solução, porém, não está simplesmente no câmbio, segundo Silveira. “Precisamos da coordenação e definição de uma política industrial mais ambiciosa, capaz de tornar a produção nacional mais competitiva.”