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Economia

BCE contesta Brasil sobre taxa de câmbio

Representante do banco europeu disse que não está havendo guerra de moedas, e sim câmbio flutuante.

O vice-presidente do Banco Central Europeu (BCE), Vitor Constancio, disse ontem que não está havendo guerra de moedas, e sim câmbio flutuante, numa dura reação a avaliação do ministro da Fazenda, Guido Mantega, sobre a onda de desvalorizações em vários países e que teve repercussão internacional.

Por sua vez, o presidente do Banco Central brasileiro, Henrique Meirelles, endureceu o tom defendendo monitoramento “das economias sistematicamente importantes” para evitar que elas acabem empurrando as outras para crises, e exemplificou que a acumulação de reservas pelo Brasil ajuda a estabilidade global.

As duas autoridades monetárias participaram ontem, em diferentes momentos, de seminário sobre serviços financeiros na Europa, em Bruxelas, que atraiu banqueiros, reguladores e representantes de governos.

Em entrevista ao Valor, o vice-presidente do BCE considerou “exagerada” a avaliação de Mantega de guerra de moeda. “Não existe guerra”, rejeitou Vitor Constancio. “Não há comparação com a grande depressão dos anos 30, que é o período citado por guerra de moedas. A situação é de volatilidade das taxas de câmbio, mas isso sempre existirá”.

O ex-presidente do Banco Central de Portugal acrescentou : “Existe é câmbio flutuante, e esperamos que as principais moedas devem também se comportem respeitando esse sistema”.

Indagado se não é mais fácil um europeu fazer essa avaliação, quando o euro sofreu forte desvalorização e turbina suas exportações, ele retrucou sorrindo: “O euro já desceu, mas está se valorizando. São situações normais nos mercados cambiais. Insisto, é câmbio flutuante e esses episódios podem acontecer. O BCE não tem uma política definição de taxa de câmbio.”

O vice-presidente do BCE rejeitou também sinalizações brasileiras para se tentar coordenação do G-20 na área cambial, em novembro em Seul (Coreia do Sul). “É difícil isso, mas o G-20 está monitorando a situação. Em caso de flutuações condenáveis, (os BCs) podem coordenar suas atuações. Mas não é o caso neste momento, não é uma situação pior do que tem sido dos últimos meses”.

De seu lado, o presidente do BC, Henrique Meirelles, acabou “chutando o pau da barraca”, numa expressão ouvida no seminário na Europa endividada e economia quase estagnada. Saindo das discussões técnicas sobre regulação, ele defendeu que não bastava endurecer regras sobre instituições financeiras sistematicamente importantes. E que é preciso monitorar “economias sistemicamente importantes”, ou seja, grandes e mais perigosas para causar problemas na economia mundial. Não citou os EUA ou qualquer outro país, mas ninguém ignorou a direção da mensagem e recebeu aplausos do auditório composto na maioria por europeus.

“Há duas lições importantes desta crise. A primeira é que uma regulamentação prudencial sólida que assegure a estabilidade dos sistemas financeiros é fundamental para o crescimento sustentado dos países. Instituições financeiras vulneráveis aos ciclos econômicos ou com excesso de risco geram prejuízos econômicos graves aos países. A estabilidade financeira dos bancos é importante. “Mas também a estabilidade financeira do país é importante, porque, quanto mais estável o pais, mais estáveis as companhias, os bancos e a situação financeira das famílias serão”, afirmou.

No caso especifico do Brasil, ele mencionou “a construção de reservas internacionais, a relação cadente da dívida pública sobre o PIB nos últimos oito anos, inflação na meta, com economia estabilizada.” “E isso propicia condições para se diminuir o nível de risco global do país, dando mais condições para que o próprio sistema seja mais estável.”

Parece claro que EUA, China e os europeus não vão deixar o Fundo Monetário Internacional (FMI) monitorar efetivamente suas políticas econômicas, como fazia junto aos países em desenvolvimento. Mas o ex-diretor do fundo, Jacques de Larosiere, hoje sem responsabilidade e sem sofrer as pressões, mostrou-se simpático à ideia de Meirelles. “É preciso pegar o bicho pelos chifres”, disse.

Encerrando o debate, o comissário europeu encarregado do mercado interno e dos serviços, Michel Barnier, reconheceu a evidência de que “o mundo não termina nos EUA e UE” e anunciou que procurará os emergentes “para construir juntos a bases de novas regras e normas comuns”.