As exportações americanas de carne bovina devem chegar a valores recordes neste ano, puxadas pelo forte consumo na Ásia, baixa oferta no mercado internacional e o enfraquecimento do dólar. O renascimento do setor nos Estados Unidos, depois do duro golpe provocado pelo surgimento da doença da “vaca louca” em 2003, acirra a competição com os produtores australianos, mas por enquanto tem pouco impacto para o Brasil.
“Estamos indo bem comparado com os anos anteriores, mas ainda estamos recuperando participação de mercado que perdemos com a BSE [sigla em inglês para doença da vaca louca]”, afirma Jim Robb, diretor da Livestock Marketing Information Center, um centro de pesquisa do Colorado.
De janeiro a maio deste ano, as exportações americanas de carne bovina chegaram a US$ 2,086 bilhões, alta de 44% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo dados do Departamento de Agricultura compilados pela Federação dos Exportadores de Carne dos Estados Unidos. O volume de embarques cresceu 28%.
Segundo Robb, embora os valores exportados sejam recordes, os volumes embarcados estão apenas recuperando os níveis históricos. A doença da “vaca louca” surgiu em 2003 e, no ano seguinte, as exportações tiveram uma queda de 82%.
Muitos atribuem o impulso nas exportações ao enfraquecimento do dólar, mas analistas ouvidos pelo Valor afirmam que esse não é o fator principal. “Acho que dão mais peso ao enfraquecimento do dólar que o merecido”, diz Brett Suart, co-fundador da Global AgriTrends, consultoria especializada em comércio agrícola mundial.
Um fator mais importante, afirma, é a queda na produção mundial de carne por quatros anos seguidos, algo inédito em muitas décadas. A Austrália enfrentou secas por oito anos, a pecuária se retraiu na Argentina devido à intervenção oficial, e a produção caiu nos EUA e no Canadá. Enquanto isso, o consumo cresceu, sobretudo na Ásia, puxado pelo aumento da renda.
Mas também há efeitos da desvalorização cambial americana. “A moeda que é mais importante para as exportações americanas é o dólar australiano”, afirma Stuart. Cerca de 75% das exportações americanas vão para cinco mercados: Canadá, México, Coreia, Japão e Vietnã. Os EUA fornecem 44% da carne importada por esses países, enquanto a Austrália fornece 43%. “De março de 2009 para cá, o dólar australiano subiu quase 70% em relação ao dólar americano”.
Stuart diz que o Brasil fornece muito pouco para esses cinco países – cerca de 1% das importações. Mais de metade das exportações brasileiras vai para Rússia, Irã e Egito. Os EUA vendem para a Rússia, mas os volumes não são tão representativos. Os EUA vendem sobretudo miúdos para o Egito. Apenas Hong Kong é um mercado relevante tanto para EUA e Brasil.
“Os Estados Unidos tomaram um pouco da fatia de mercado da Austrália na Coreia do Sul”, afirma Robb. “Também tomou um pouco do mercado do Brasil na Rússia, mas não considero que seja algo muito grande”.
Há pelo menos duas explicações para Brasil e EUA atuarem em mercados distintos: o rebanho americano é alimentado com grãos, por isso a carne tende a ter mais gordura, atendendo o gosto do consumidor asiático. No Brasil, é alimentado a pasto, produzindo uma carne mais magra. Além disso, alguns países asiáticos só adquirem carne de áreas livres de aftosa sem vacinação. O Brasil ainda vacina.
Embora as exportações estejam bem, são relativamente pequenas para a indústria americana. Apenas cerca de 10% da carne do país é exportada. Os EUA são também um grande importador, sobretudo da Austrália, que fornece carne para hambúrger. A recessão fez os consumidores trocarem o bife pelo hambúrger, que é mais barato.
Ainda há dúvidas sobre quanto tempo os EUA serão capazes de sustentar recordes de exportação. Robb acha que poderá haver uma desaceleração no último trimestre em virtude da queda da produção americana, que tende a elevar os preços. A alta de preços leva algum tempo para se refletir em aumento de rebanho. “Esse é um ciclo que produção que leva anos”, afirma.
Stuart acha, porém, que o bom ciclo exportador poderá avançar em 2012 porque a oferta de carne bovina é apertada no mercado internacional, frente à demanda asiática, e o dólar americano tende a seguir fraco. “Vai haver boa demanda para a carne brasileira também”, diz. “As exportações brasileiras só não cresceram tanto porque a demanda interna é forte”.