Uma coalizão de 35 entidades de representação de agricultores dos Estados Unidos pediu ao governo de Barack Obama para abrir na Organização Mundial do Comércio (OMC) uma nova disputa relacionada ao subsídio ao algodão americano. Os produtores dos EUA tentam, assim, evitar que o Brasil exerça o direito de impor uma retaliação de US$ 800 milhões aos americanos.
As entidades enviaram carta ao negociador-chefe de comércio dos Estados Unidos, Ron Kirk, pedindo para Washington reabrir o caso na OMC. Os representantes de classe querem provar que as modificações na legislação americana já teriam eliminado os subsídios nas garantias de crédito à exportação condenados pelos juízes. Os produtores reclamam que, se o Brasil aplicar a retaliação, causará “danos injustificados” para o agronegócio dos EUA.
Diante do peso dos signatários do documento, as chances de os produtores serem atendidos pela administração Obama parecem razoáveis. A lista inclui o Conselho Nacional de Agricultura e a Federação de Agricultores Americanos, além de entidades produtoras de grãos, milho, trigo, arroz, soja, lácteos e carnes (bovina, suína e de frango). Todas elas têm lobbies fortes no Congresso.
“Esse é um recurso jurídico disponível aos EUA, mas as chances de [os americanos] ganharem são ínfimas”, reagiu o embaixador brasileiro na OMC, Roberto Azevedo. “A OMC comprovou que não houve mudança significativa nos programas de garantia de crédito à exportação”. O contencioso do algodão começou em 2002.
A OMC autorizou o Brasil a aplicar sanção contra produtos americanos porque considerou que os EUA não eliminaram todos os subsídios no crédito à exportação. O montante da retaliação foi calculado em US$ 247 milhões, considerando os subsídios concedidos em 2006. Para o Brasil, o montante deve ser de US$ 800 milhões neste ano, já que as subvenções aumentaram. Mesmo se os americanos voltarem com novo painel, o Brasil pode aplicar e manter as sanções.
As entidades de classe dos agricultores americanos insistem, em peso, que os EUA já modificaram três programas de garantias de credito à exportação. Elas argumentam que um deles vai mesmo gerar retorno de US$ 54 milhões ao governo em 2010, na medida em que o prêmio cobrado pelo governo mais do que compensa o custo das operações do programa.
Os agricultores americanos voltaram a utilizar o velho argumento de que o Brasil contestou programa de crédito para exportação que, na verdade, teria sido usado sobretudo pelos bancos brasileiros. Alegam os americanos que os benefícios obtidos pelos bancos brasileiros superam em muito o valor da retaliação que o Brasil pode aplicar contra produtos americanos.
Como exemplo, os americanos citam que, desde 2002, instituições financeiras brasileiras obtiveram financiamento de mais de US$ 5,4 bilhões pelo programa. Do total, US$ 2 bilhões teriam sido obtidos entre 2002 e 2003, quando o país teve dificuldades de acesso ao crédito internacional. “Na prática, a liquidez fornecida pelo GSM-102 foi importante para permitir ao Brasil evitar o colapso de seu sistema bancário”, afirmam os agricultores na carta à administração Obama.
Eles insistem que, na recente crise global, os bancos brasileiros de novo recorreram aos créditos subsidiados americanos como fonte de liquidez para o comércio exterior. Segundo os americanos, os brasileiros obtiveram mais de US$ 1,1 bilhão em empréstimos no ano fiscal 2008-2009.
O argumento americano sobre bancos brasileiros foi usado durante a disputa diante dos juízes, e rejeitado. A razão é simples, segundo o embaixador Azevedo. “Não importa quem se beneficia, se é banco brasileiro ou chinês. O importante é que, sem o subsídio, a contribuição financeira, os produtores americanos não teriam realizado todas as operações de exportação, que afetaram os preços internacionais e prejudicaram produtores brasileiros”.
Para os produtores americanos, “um novo painel de cumprimento das decisões da OMC é o melhor caminho para assegurar um resultado justo para todos os lados”. Para o Brasil, por sua vez, se a disputa voltar à OMC, simplesmente será confirmado que os americanos deram garantias de crédito que não ocorreram em condições de mercado e que houve, sim, benefício para os produtores americanos.