O Brasil, só no ano passado, deixou de vender US$ 5,5 bilhões com a perda de espaço no seu principal mercado, a América Latina. O cálculo é da Confederação Nacional da Indústria (CNI), em estudo elaborado a pedido do Valor. O montante equivale a 11% de tudo que o Brasil vendeu à região em 2011 e é a diferença entre o que o país exportou para a região e o que exportaria se tivesse mantido a mesma fatia de mercado que detinha em 2008. A perda de competitividade da indústria brasileira é a maior responsável pelo mau desempenho do país, na avaliação da entidade.
Pelo levantamento da CNI, os bens industriais que mais perderam participação foram automóveis, pneus, escavadoras, polímeros, tratores, partes e acessórios para veículos e aços laminados. Os empresários falam em “carnificina” por parte dos concorrentes, que não se resumem à China, principal ameaça às vendas brasileiras: países como Turquia, Coreia, México e até nações ricas como a Alemanha passam a ocupar o espaço que antes era do Brasil.
“O problema da perda de competitividade é geral, e leva a um dado avassalador: a pauta de comércio de manufaturados do Brasil com o mundo, que tinha um superávit da ordem de US$ 10 bilhões em 2005, em 2011 fechou com um déficit de US$ 92 bilhões”, disse o presidente executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo de Mello Lopes. “É uma inversão de US$ 100 bilhões, em seis anos”, enfatizou.
A América Latina é o principal bloco consumidor dos manufaturados do Brasil, e absorve 44% das exportações brasileiras desse tipo de produto. As perdas de mercado latino-americano são sentidas principalmente nas vendas da indústria para a Argentina, onde, segundo a CNI, o Brasil perdeu três pontos percentuais em sua fatia de mercado entre 2008 e 2011. Nesse período, outros países, principalmente China e México, avançaram, respectivamente, 3,2 e 0,6 pontos percentuais. A Coreia do Sul e até a União Europeia também avançaram no mercado argentino, ganhando espaço antes ocupado pelas indústrias brasileiras.
Segundo a consultoria Abeceb.com, do economista Dante Sica, a fatia do Brasil nas importações de manufaturados pela Argentina caiu de 32% no primeiro semestre de 2011 para 29% no primeiro semestre de 2012, segundo dados do Indec, o instituto de estatísticas argentino. Nesse período, a Alemanha elevou sua participação de 6% para 7%, os Estados Unidos mantiveram sua parcela de 11% e a China teve uma pequena queda, de 17% para 16%. Os outros seis principais parceiros da Argentina conseguiram manter sua participação e o restante dos fornecedores aumentou em um ponto percentual, para 20%, a fatia no mercado vizinho.
A comparação do desempenho do Brasil com outros países mostra que, mesmo nos mercados para os quais consegue aumentar em termos absolutos suas exportações, o Brasil perde terreno para concorrentes mais agressivos: no Peru, um dos mercados hoje mais dinâmicos na América Latina, o Brasil, no primeiro semestre deste ano, aumentou em apenas 2,7% suas vendas, bem menos que o aumento de 21% do Japão e China, 25% do México e quase 50% da Alemanha, segundo dados da Comissão de Promoção para Exportação e Turismo (Promperu).
“O real valorizado desviou uma parte de nossa competitividade”, analisou o diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI, Carlos Eduardo Abijaldi.
Ele acredita, também, que o crescimento do mercado interno no Brasil fez com que muitas empresas desistissem de buscar mercado lá fora e se contentassem com as vendas internas. “Houve essa válvula de escape”, comentou. No caso da Argentina, maior mercado brasileiro de manufaturados, as barreiras informais impostas pelo governo local também afetaram as vendas e prejudicaram o desempenho brasileiro, acredita o diretor da CNI, que constatou, porém, perda de mercado do Brasil nos nove principais mercados da América Latina. Apenas na Colômbia e na Argentina os Estados Unidos não acompanharam a China, aumentando participação.
A exportação de manufaturados brasileiros à região é fortemente influenciada pelo comércio de automóveis, que é afetada por acordos de livre comércio firmados pelos países vizinhos com outros e responde às condições de mercado e à estratégia das grandes montadoras.
O Brasil tem aumentado as vendas de autopeças para o mercado argentino, mas aumenta a importação de automóveis e vende menos carros. A queda, em pontos percentuais, da participação dos automóveis brasileiros nos mercados chegou a 18,4 no Chile, 16,8 na Venezuela e 4,7 na Argentina, entre 2008 e 2011. No Peru, a participação brasileira no mercado de veículos de transporte coletivo de passageiros caiu, em quatro anos, de quase 60% para 25%.