O novo regime de câmbio na Venezuela deve ter “algum impacto negativo” sobre as exportações brasileiras àquele país, avalia o Ministério do Desenvolvimento, em estudo preliminar preparado reservadamente, ainda com muitas dúvidas em relação às mudanças cambiais no país vizinho.
O governo brasileiro teme consequências negativas para as exportações dos produtos de maior valor agregado, como automóveis, celulares, calçados e alguns produtos alimentícios.
As vendas à Venezuela já vêm caindo fortemente, inclusive para produtos alimentícios considerados essenciais, como carne bovina, carne de frango e leite e creme de leite condensado (quedas de 60%, 45% e 88%, respectivamente, em 2009, comparadas com 2008). Parte da queda se deve à política deliberada do governo de dar preferência à industrialização, no país, de alguns desses gêneros, como os bovinos vivos – que tiveram aumento nas importações, de 17,5% e são, hoje, o principal produto de importação brasileiro na Venezuela. Enquanto as compras de açúcar refinado caíram 10%, as de açúcar em bruto aumentam 81,6%.
No ano passado, as vendas totais daquele país caíram de US$ 5,2 bilhões para US$ 3,6 bilhões. As exportações brasileiras de produtos industrializados à Venezuela ainda representam 73% das vendas ao país, 66,4% das quais em manufaturados como máquinas e equipamentos, e 6,8% semimanufaturados, como óleo de soja em bruto.
Os manufaturados são os alvos principais das medidas anunciadas pelo governo venezuelano, que quer reduzir as importações naquele país.
Na semana passada, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, criou um regime de câmbio duplo e desvalorizou o bolívar, a moeda nacional, criando uma taxa maior para produtos considerados “não essenciais”. Segundo estudo preliminar do Ministério do Desenvolvimento, caem nessa segunda categoria cerca de 30% a 40% das vendas do Brasil ao país.
O estudo nota que a maior parte dos produtos vendidos à Venezuela cai na categoria de bens essenciais, sujeitos ao câmbio mais favorável, de 2,60 bolívares por dólar (20,9% acima da taxa anterior, de 2,15). Mas a recessão econômica, a crise energética devido à seca e a inflação em alta no país tendem a provocar “impacto negativo” nas vendas, que já vêm caindo, avaliam os especialistas do Ministério do Desenvolvimento.
Os fatores negativos podem compensar os pontos favoráveis da mudança no câmbio, que deve garantir aumento na receita do governo, o maior comprador de produtos importados de primeira necessidade na Venezuela.
Como o governo venezuelano não definiu, ainda, quais são os produtos “essenciais” e quais são os “não essenciais”, nem os desdobramentos da crise de desabastecimento que ameaça ocorrer no país, é difícil ter uma medida confiável do impacto das mudanças sobre as compras venezuelanas de mercadorias produzidas no Brasil.
Os responsáveis pela política de comércio exterior estão preocupados porque a Venezuela é, ainda, o país com que o Brasil tem seu maior superávit comercial, mesmo após a forte queda nos resultados, no ano passado. O saldo comercial, de US$ 4,6 bilhões em 2008, caiu para US$ 3 bilhões, 34% menor, mas, ainda, o resultado mais favorável ao Brasil em suas relações comerciais com outros países.
Vem caindo, também, a quantidade de empresas brasileiras que comerciam com a Venezuela. Em 2008, eram pouco mais de 3 mil e passaram a menos de 2,8 mil em 2009. O governo brasileiro tem realizado esforços com as autoridades venezuelanas para reduzir a burocracia e as retenções injustificadas de pagamentos das vendas feitas pelas empresas brasileiras, mas a morosidade da burocracia no país tem provocado queixas constantes dos empresários brasileiros. Os técnicos preveem que a complexidade do regime recém-instalado e as dificuldades do governo Chávez para controlar os preços deve motivar um aumento no número de reclamações.