A FAO e a OCDE apontam: até 2019, os EUA continuarão a ser os maiores produtores agrícolas do mundo, mas o Brasil terá a maior alta nas exportações de carnes e oleaginosas. É preciso porém, eliminar os gargalos na infraestrutura para garantir a expansão agrícola, alerta o economista Delfim Netto.
Certamente, todos nós já ouvimos previsões otimistas sobre o crescimento da agropecuária brasileira, as mais entusiastas repetindo o bordão que num futuro próximo o Brasil se afirmará como o “celeiro do mundo”. Poucas vezes temos visto, no entanto, um cenário tão cor-de-rosa como o que foi apresentado à imprensa mundial no relatório da FAO/OCDE sobre as perspectivas do aumento da produção e do comércio agrícolas para os próximos dez anos. As vedetes nesse cenário extremamente promissor são os países emergentes e entre eles o grande protagonista é o Brasil.
O interessante é que as projeções vêm datadas para o período 2010/2019 e mostram estimativas não só de produção e consumo, mas também da expansão do comércio e de evolução dos preços. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) partem, obviamente, da expectativa de uma nova década de crescimento, acreditando na recuperação da economia global turbinada pelo aumento da renda e consequente expansão do consumo das populações dos países emergentes (China e Brasil em destaque, mais Rússia, Ucrânia e Argentina).
No que se refere ao Brasil, basicamente o estudo aponta para um crescimento da produção agropecuária de 40% a 60% entre 2010 e 2019, com os preços sustentados para os principais grãos e carnes. No mesmo período, para Estados Unidos e Canadá, a projeção de crescimento é da ordem de 10% a 15%, enquanto para a Comunidade Europeia a previsão é de um crescimento de apenas 4%, ou menos. As estimativas em relação à produção de alimentos na China, Rússia e Ucrânia são de crescimento da ordem de 26% a 30%; para a Índia, 20%, e de apenas 7% na Austrália, outro grande país produtor.
Os Estados Unidos continuarão a ser os maiores produtores mundiais de grãos e de proteína animal, mas o Brasil terá a maior taxa de crescimento das exportações de carnes e oleaginosas. Os maiores produtores de soja continuarão a ser, nessa ordem, os norte-americanos, brasileiros e argentinos. O Brasil poderá elevar sua fatia de 26% para 35% no comércio do grão até 2019.
Outra projeção do estudo é que o comércio mundial do etanol crescerá três vezes até o final da década e que o Brasil será o maior fornecedor internacional do produto, assim como permanecerá o maior exportador de açúcar no mercado global.
É evidente que todas essas estimativas são interessantes, projetam o Brasil numa posição destacada, eventualmente tornam mais atrativos os investimentos, mas é sempre bom ir pensando nos obstáculos que são bem visíveis para quem quiser enxergar. Dois, apenas, são mais do que suficientes para desmontar qualquer cenário otimista.
O primeiro deles é o estado precário de nossas vias de transporte e de escoamento da produção, seja para o consumo interno, seja de acesso aos mercados externos. No Centro-Oeste brasileiro e na nova fronteira agrícola do nordeste baiano e do Mapito (Maranhão-Piauí-Tocantins), por exemplo, estamos comemorando uma excelente colheita de grãos na atual safra 2009/2010, mas os produtores estão tendo os lucros engolidos pelos custos do transporte, com estradas semidestruídas pelas chuvas e elevação de custos insuportável, devido ao desgaste dos equipamentos e material rodante.
A consequência será a redução das áreas de plantio e dos investimentos que afetarão o volume das próximas safras. É preciso eliminar os gargalos na infraestrutura para garantir a expansão agrícola.
O segundo problema é que precisamos aumentar a capacidade de dar emprego de boa qualidade aos brasileiros. Isso não será feito apenas com as atividades agropecuária e mineradora que estão ganhando em produtividade e são poupadoras de mão de obra. Precisamos expandir celeremente a produção industrial e de serviços e complementar o crescimento do mercado interno com o aumento das exportações. Esse, seguramente, é o problema que não vamos resolver se continuarmos mantendo, ao mesmo tempo, o maior juro do mundo e o câmbio mais valorizado do planeta.