A visita de ministros da economia a Washington nesta semana para uma reunião do Fundo Monetário Internacional se dá num momento em que a economia mundial depende cada vez mais da China. Nas três últimas décadas, a economia chinesa cresceu cerca de 10% ao ano. Esse ritmo chinês que se destaca ainda mais este ano, com a economia mundial às voltas com a turbulência no Japão, no Oriente Médio e em parte da Europa.
O economista-chefe do Banco Mundial, Justin Yifu Lin, afirmou que a China respondeu por cerca de um quarto do crescimento mundial entre 2000 e 2009, tirando os Estados Unidos da liderança e ficando bem à frente de qualquer outra nação. Mas a aposta na continuação do sucesso de Pequim não é garantida. Muitos países que cresceram rápido acabaram perdendo fôlego.
Vejamos três problemas que podem converter a China em outro caso de insucesso nos próximos anos.
A bolha imobiliária estoura
Nas 30 maiores cidades chinesas, os preços dos imóveis residenciais subiram cerca de 50% nos últimos dois anos, segundo a consultoria Dragonomics Research, de Pequim. Numa espécie de reprise do que aconteceu nos Estados Unidos por volta de 2007, o chinês comum virou um especulador do mercado imobiliário, na crença de que o preço dos imóveis só pode subir.
Diferentemente do americano, o chinês tem poucas opções de investimento que não o mercado imobiliário. Os juros pagos por bancos estão bem abaixo da inflação; a bolsa é vista como um jogo de cartas marcadas; e o governo não permite aplicações financeiras no exterior.
Grandes empresas estatais também são grandes especuladoras. Em fins de 2008, a China mandou os bancos estatais emprestarem mais para combater a recessão mundial. Boa parte desse crédito foi para indústrias estatais que despejaram dinheiro no mercado imobiliário, afirma o economista Yongheng Deng, da Universidade Nacional de Cingapura. Segundo ele, o valor de terrenos vendidos em leilão em oito grandes cidades chinesas dobrou em 2009.
Para tentar desinflar essa bolha, o governo chinês já tomou medidas, como aumentar a entrada exigida no financiamento de imóveis e tributar as propriedades. Mas pode não ser suficiente. Os governos locais dependem da receita da venda de terrenos para financiar suas operações – e como oportunidade para falcatruas. O UBS Investment afirma que será “muito difícil” para a China evitar o estouro da bolha no “médio prazo”, o que em geral significa nos próximos três a cinco anos. Mas há quem diga que a correção pode vir antes.
Nicholas Lardy, um especialista em China, sustenta que um colapso do mercado imobiliário poderia tirar 2,5 pontos percentuais do crescimento chinês – um golpe pior do que o sofrido pelo país no início da atual crise financeira mundial.
Reequilíbrio desequilibrado
A China cresceu depressa ao investir pesado em estradas, aeroportos, terminais de cargas, minas, siderúrgicas e outros projetos e ao ajudar o exportador com baixos salários e uma moeda desvalorizada. Só que essa estratégia econômica pode estar perdendo fôlego. Embora o investimento tenha subido para quase 50% do PIB, a criação de emprego não cresce mais do que cerca de 1% ao ano. Já as exportações dificilmente seguirão no ritmo dos últimos anos, devido à queda da demanda na Europa e nos Estados Unidos.
Os dirigentes chineses sabem que precisam se concentrar muito mais no potencialmente vasto mercado interno. Priorizar a demanda interna é a meta formal dos líderes do país desde 2007, pelo menos, mas o governo fez pouco progresso. Aliás, a contribuição do consumo interno para a economia continua a cair e hoje está por volta de 35% do PIB – cerca de metade do nível dos Estados Unidos.
Recentemente, líderes chineses voltaram a declarar que iriam “reequilibrar” a economia, desta vez com a promessa de elevar os rendimentos dos trabalhadores para que, no mínimo, sigam a taxa de crescimento. Mas soltaram poucas políticas concretas para facilitar a vida do consumidor chinês.
“A magnitude do problema é enorme”, diz Michael Pettis, professor de finanças da Universidade de Pequim. É que, enquanto o velho modelo perde força, o país não vem avançando rumo a um novo modelo de crescimento.
Agitação política
Dirigentes chineses falam de uma “sociedade harmoniosa”, mas agora reprimem defensores da democracia incentivados pelas manifestações no Oriente Médio. Nas ruas, no entanto, são poucos, ou nulos, os protestos.
Embora o chinês se revolte contra a apropriação de terras por autoridades locais e outros abusos de poder, os protestos são esporádicos e raramente têm caráter nacional. Às vezes, os chineses encaram o governo central em Pequim como um aliado na luta contra funcionários locais corruptos, e não como alvo de protestos.
Só que o conflito político, quase que por definição, não dá aviso prévio. Um desastre nuclear como o japonês, por exemplo, seria “uma catástrofe para o regime” na China, diz Arthur Kroeber, diretor-gerente da Dragonomics. Isso porque o padrão de construção das usinas nucleares chinesas provavelmente é menos rigoroso que o do Japão e a capacidade do governo de administrar uma crise muito mais limitada. Isso poderia provocar revolta contra Pequim.
No passado, ao ver indícios de instabilidade política, Pequim tentou conter a insatisfação com avanços econômicos. Uma razão para o governo estar focado na inflação – de 5%, cerca do dobro do ritmo do ano passado – é que a revolta com a alta dos preços precedeu a agitação política, sobretudo durante os protestos na Praça da Paz Celestial, em 1989.
O maior revés na trajetória econômica da China veio nos dois anos seguintes a esse episódio, quando a taxa de crescimento do país caiu em dois terços – para uma média de apenas 4%. A instabilidade política produziu estagnação econômica.