Da Redação 07/07/2005 – A negociação agrícola entrou em crise aguda na Organização Mundial de Comércio (OMC). Nesta semana, as discussões ficaram perigosamente bloqueadas e num ambiente de fricções. O mediador, Tim Groser, pela primeira vez advertiu que dificilmente apresentará um texto envolvendo um “pacote agrícola” até o fim deste mês, como previsto inicialmente – o que pavimentaria o terreno para concluir a Rodada de Doha em 2005.
Representantes do G-20 acusam tanto a União Européia como os Estados Unidos de não mostrarem qualquer movimento. “Só quem quer negociar é o Brasil e o G-20”, afirmou um negociador depois de intensas reuniões envolvendo diferentes grupos em Genebra.
A UE, paralisada por causa de sua situação interna, acusa os EUA de não se comprometerem em cortar subsídios domésticos. Já os americanos dizem que só se comprometerão se puderem explicar a seus agricultores, deputados e senadores que eles, em contrapartida, vão obter a abertura de mercados para os produtos agrícolas.
Ora, é exatamente o que a UE não quer e nem pode fazer. Marianne Fischer Boel, comissária européia de agricultura, chegou a considerar uma “má idéia” a posição de seu colega do comércio, Peter Mandelson, de barganhar o acesso a mercados de países emergentes para produtos industrializados pelo acesso de produtos agrícolas na União Européia.
O Brasil fica, assim, sem margem de manobra. Brasília não pode se comprometer com uma abertura para produtos industriais e serviços, como querem americanos e europeus, se não tiver a contrapartida na agricultura.
Nesse cenário, o pacote do fim do mês vai depender da mini-conferência que reunirá cerca de 30 ministros na semana que vem em Dalian (China). Se os principais atores da negociação – como EUA, UE, Brasil e Austrália – não se entenderem pelo menos sobre a estrutura de uma fórmula para cortar tarifas agrícolas, estará comprometido o plano de se definir a partir de setembro os percentuais de reduções tarifárias e de subsídios.
Assim, a ambição liberalizadora de toda a Rodada de Doha está encolhendo dia a dia. O “esquemão” no qual importantes negociadores se apóiam é o de tentar a todo custo dar um sinal positivo até o fim deste mês, e deixar que o próximo diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, “quebre essa castanha” – ou seja, tente impulsionar a Rodada de Doha a partir de setembro, quando assumirá.
A expectativa é que Lamy saiba precisamente até onde europeus e americanos podem fazer concessões em agricultura até a conferencia de ministros da OMC, em dezembro próximo, em Hong Kong.
Ontem, na véspera do encontro de cúpula do G-8, o Grupo de Cairns, liderado pela Austrália, lançou um comunicado conclamando os países mais ricos a realmente afrontarem o problema da pobreza nas nações em desenvolvimento por meio de “fortes reformas” nas políticas agrícolas. Para o Grupo de Cairns, que inclui os países do Mercosul, a reforma deve começar pela abolição dos subsídios à exportação, pelo corte dos maciços subsídios internos que distorcem o comércio internacional e também por uma abertura genuína dos mercados.
A agricultura representa entre 30% e 50% da produção econômica dos países em desenvolvimento, comparado a entre 3% e 5% nas economias industrializadas. No entanto, o protecionismo continua forte nos países ricos, que lançam mão de políticas que também deprimem preços. Se houver realmente reforma agrícola, através da Rodada de Doha, dois terços dos países em desenvolvimento terão ganhos de US$ 50 bilhões, diz o Grupo de Cairns – para o qual está na hora de comprometimentos concretos.