Depois de atingir o menor patamar em quase dois anos, os preços das commodities agrícolas dispararam nos mercados internacionais no último mês. Na média, os contratos futuros de produtos como soja, milho, trigo, açúcar, café e algodão tiveram valorização de 21% desde 1º de junho, de acordo com o índice de commodities Dow Jones-UBS – um fator de risco para a inflação no segundo semestre.
Os produtos agrícolas foram, de longe, o segmento das matérias-primas que mais subiu no último mês. Na média, as commodities (incluindo energia, metais básicos e preciosos) subiram 9,8% no último mês, segundo o mesmo índice. Os contratos de energia avançaram 9,1% e os de metais básicos, 3,5%. Os metais preciosos ficaram praticamente estagnados.
O movimento foi impulsionado principalmente pelos preços dos grãos, que subiram 25% desde 1º de junho. No período, os preços do trigo e do milho saltaram 30,9% e 26,7%, respectivamente, enquanto a soja acumulou ganho de 16%. Os chamados “softs” avançaram 14,8%, puxados por açúcar (14,2%) e café arábica (12,9%).
Na média, os produtos agrícolas já estão no maior patamar desde 21 de setembro do ano passado – apenas um mês depois de atingirem o menor nível desde 13 de setembro de 2010. Contudo, as cotações ainda estão 13% abaixo do recorde registrado em julho de 2008, pouco antes da quebra do Lehman Brothers nos Estados Unidos.
De modo geral, as commodities foram castigadas pelo surto de aversão ao risco que tomou conta dos mercados financeiros entre abril e maio em função da crise na Grécia e na Espanha e das preocupações com o desaquecimento da economia chinesa. Só em maio, fundos de investimento sacaram mais de US$ 8,2 bilhões dos contratos futuros de matérias-primas, de acordo com o último levantamento do Barclays Capital.
Contudo, os ânimos se acalmaram nas últimas semanas. A vitória dos conservadores na Grécia, a expectativa de uma nova injeção de dólares na economia americana pelo Federal Reserve (o banco central dos EUA) e o acordo para a recapitalização dos bancos europeus afastaram o pânico e reativaram o apetite dos investidores por ativos de risco, o suficiente para que voltassem a colocar dinheiro nas bolsas de commodities.
Mas o maior estímulo foi o aumento considerável dos riscos relacionados à oferta de produtos agrícolas, o que ampliou a margem de ganhos dos especuladores. Nos Estados Unidos, a seca que castiga o “Corn Belt” deve comprometer a produtividade das lavouras de milho e soja na safra 2012/13, o que pode derrubar os estoques (principalmente de soja) para níveis considerados críticos. Países como Austrália, Ucrânia e Rússia também sofrem com a estiagem e podem colher menos grãos do que o esperado. No Brasil, as chuvas fora de época prejudicaram a colheita do café e da cana.
“Os mercados perderam fôlego por causa da crise na Europa, mas os fundamentos são altistas. As compras da China seguem muito aquecidas, os estoques são apertados e a produção enfrenta problemas”, afirma Steve Cachia, analista da corretora de grãos Cerealpar.
Ao contrário do que aconteceu em outros períodos de ascensão das commodities, o dólar tem resistido a ceder. Desde 1º de junho, o índice dólar (que compara a moeda americana com uma cesta de divisas importantes) recuou apenas 1,3% – em relação ao real, a queda foi de 1,4%, de acordo com o Valor Data. Isso significa que grande parte da alta das commodities em dólar tende a ser repassada também para os preços em real.
“Acreditamos que esse é um risco importante para a inflação no segundo semestre”, afirma Octavio de Barros, economista-chefe do Bradesco. Segundo ele, a recente alta das commodities deve ter um impacto da ordem de 30 pontos-base sobre a inflação do período. O economista pondera, porém, que essa pressão ainda pode ser revertida, já que a alta é explicada principalmente por fatores climáticos.
Thiago Curado, analista da Tendências Consultoria, acredita que o efeito da alta sobre a inflação brasileira deve ser, ao menos por enquanto, apenas pontual. “De modo geral, os preços das commodities têm se mantido relativamente estáveis desde o último trimestre de 2011”.
Algumas delas, como açúcar, café e algodão acumulam perdas expressivas nos últimos 12 meses (ver gráfico). Além disso, considerando as médias mensais de preço, oito das 10 commodities agrícolas acompanhadas pelo Valor Data registraram queda em junho.
“Apesar da sensação de que o pior já passou, o cenário externo ainda é muito ruim, o que limita o espaço para uma valorização sustentada das matérias-primas”, explica Curado. Além disso, acrescenta, os preços do milho – produto que responde por 70% dos custos de produção das carnes brancas – no mercado interno seguem pressionados pela colheita de uma safra recorde. “O saldo sobre os preços ao consumidor deve ser, neste momento, pequeno”, diz.