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Commodities testam novo patamar de preços

<p>As turbulências nas bolsas causadas pela crise no mercado imobiliário de crédito de alto risco nos EUA acirraram o debate sobre o comportamento dos preços internacionais das commodities agropecuárias no médio e longo prazo.</p>

Redação SI (20/09/07) –  E a conclusão dominante é que o patamar atual, bem superior ao nível médio dos últimos anos, deverá se consolidar.

É bom que se diga que, ainda que prevaleça entre especialistas, essa visão não é preponderante. Até porque mesmo quem concorda com ela ressalva que a turbulência financeira externa não terminou. Mas as previsões de que a demanda dos países emergentes – sobretudo China e Índia – seguirá aquecida e a nova disparada do petróleo, com seus reflexos favoráveis à expansão dos biocombustíveis, reduzem significativamente a margem para recuos expressivos.

"O crescimento de emergentes como Rússia, China e Índia criou a perspectiva de aumento da demanda, o que não existia até 2005", observa o professor Guilherme Dias, da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA/USP). Isso ocorreu, acrescenta, em um momento de ajuste de safras, intensificado pelo "problema crônico" de clima na Austrália.

Esse cenário recente levou os fundos, ativos no mercado acionário, a uma participação mais agressiva nos mercados futuros de produtos agrícolas, e eles ganharam força na formação dos preços, turbinando tendências e muitas vezes "atropelando" o que sinalizam os fundamentos de cada mercado. Eis um risco algumas vezes ignorado: para Dias, essa participação tende a perder força a partir da contaminação da economia real pelos tremores no mercado financeiro.

Ele lembra que existe um "problema sério" de endividamento dos consumidores dos EUA, e que esse quadro ainda pode levar ao desaquecimento da economia mundial. "Pode haver um ajuste para um nível de crescimento menor dos asiáticos", diz, referindo-se a China e Índia. Neste caso, com impacto sobre a demanda.

José Carlos Hausknesht, analista de agronegócio da MB Associados, também vê riscos, mas não acredita em recuo da demanda da China. Assim, afirma, as commodities agrícolas deverão continuar sustentadas. "Haverá uma acomodação nos próximos meses, mas em um patamar acima das médias históricas", diz. Hausknesht também destaca o "fator etanol", que tem ajudado a elevar as cotações do milho – com reflexos principalmente sobre a soja – e que a cada salto do petróleo se fortalece, mantendo viva a discussão sobre a concorrência entre alimentos e energia.

"A China não foi atingida pela turbulência e continua com demanda aquecida", afirma Hausknesht. "Temos um potencial de consumo dos países emergentes e também dos países ligados ao petróleo. Esses países [produtores de petróleo] estão comprando alimentos e devem continuar com forte demanda", diz. Os mercados do Oriente Médio estão entre os mais importantes importadores de carne e açúcar, sobretudo.

Fernando Homem de Melo, especialista de agronegócios da Universidade de São Paulo (USP), concorda. "O mercado de biocombustíveis continua firme e puxará os preços dos grãos". Mas tanto Hausknesht quanto Homem de Melo ponderam que um agravamento da crise americana poderá afetar também as cotações das commodities agrícolas. Apesar disso, sustentam que não há nada no momento que justifique uma queda drástica dos preços, afirmam. "Vivemos hoje o melhor dos mundos para as commodities agrícolas", afirma Homem de Melo.

Ele não espera uma forte desaceleração da economia global, até porque algumas bóias de salvação já estão nas águas. A última delas foi jogada pelo Fed. O banco central americano surpreendeu e reduziu, na última terça-feira, a taxa de juros americana em 0,50 ponto percentual, como medida para evitar o desaquecimento do consumo no país. Além disso os preços do petróleo no mercado internacional se transformaram em um gatilho para manter valorizados os grãos ligados à produção de biocombustíveis, como etanol e biodiesel.

Mesmo com o aumento da oferta dos grãos, sobretudo milho, as cotações podem até recuar por conta da superoferta, mas não com força. "Os EUA vão manter a demanda por milho para combustível e a União Européia vai aumentar a produção de biodiesel", aposta Homem de Melo.

Antes da demanda pelos biocombustíveis, o avanço da produção de carnes no mundo já vinha sustentando os preços de soja e milho – insumo para ração animal -, lembra Anderson Galvão, da consultoria Céleres, que acredita em um patamar mais elevado para os preços. Além da demanda aquecida, ele aponta a alta dos custos de produção – petróleo mais caro significa fertilizante mais caro – como justificativa para a valorização dos mercados.

Apesar de também trabalhar com um cenário de continuidade da demanda por commodities pela China e para a produção de biocombustíveis, André Pessôa, da Agroconsult, avalia que a valorização é "momentânea". No longo prazo, diz, a tendência é de queda das cotações, graças ao aumento da produtividade. "Não acho que a China e os biocombustíveis gerem mudanças estruturais no mercado", afirma, categórico. O raciocínio de Pessôa é que ganhos de produtividade nas commodities agropecuárias elevam a oferta, o que ajuda a segurar os preços – que nesta safra 2006/07 estão, em alguns casos, 35% mais elevados que na média das cinco temporadas anteriores, conforme relatório conjunto de OCDE e FAO divulgado pouco antes da turbulência.

"A história mostra essa tendência de queda", diz. De fato a Revolução Verde iniciada na década de 1950 foi preponderante para evitar que alimentos se tornassem artigos de luxo nas últimas décadas, e é quase consenso que novos avanços tecnológicos evitarão que isso aconteça no futuro. Mas também essa evolução atualmente enfrenta resistências muito maiores, especialmente socioambientais.