“Cientistas alertam que pandemias piores estão a caminho senão protegermos a natureza” – Jordam Davidson – Ecowatch, 04 de maio de 2020
A frase acima alerta para uma situação muito séria que expressa a pura realidade, uma vez que existem vírus piores, como o Ébola ou o da Febre hemorrágica brasileira, que é considerada doença rara, isolada e de alta letalidade, a qual foi identificada em uma vítima no interior de São Paulo em janeiro de 2020[i].
Devemos nos conscientizar que é na natureza que se encontram as soluções dos problemas para a raça humana.
Neste artigo tentaremos mostrar que essa pandemia vem comprovando que o poder econômico é importante, mas não suficiente para impedir o avanço de destruições. Precisa-se cada vez mais de ações de solidariedade, decisões precisas dos governantes e comportamentos coerentes do ser humano.
A SARS-2 vem ensinando, ainda, que sem Ciência, Tecnologia e Inovação o mundo não conseguirá resolver este problema e outros que ainda virão. A descoberta de princípios ativos e rotas de pesquisa para encurtar o tempo de descobrimento de novas terapias experimentais, vacinas ou testes em drogas, se faz mais do que necessária e virá através das pesquisas.
O futuro está exigindo (neste momento de fragilidade) a busca de elementos que compatibilizem produções com a preservação do meio ambiente e da biodiversidade. As energias renováveis serão elementos da mais alta relevância e os biocombustíveis firmarão, ainda mais, sua importância no contexto.
Visualiza-se que a importação de alguns bens, antes vista como uma boa alternativa econômica, hoje está sendo traduzida em uma forte negatividade para diversos setores, pois fragilizou empresas, segmentos e países, não só no presente, mas continuarão no futuro. Mudanças de comportamento e pensamento já começam a ocorrer em tomadores de decisão.
As nações estão se convencendo, s.m.j, que investimentos massivos em defesa nacional (e.g, poderio bélico) não substituem ou não são mais importantes do que o direcionamento de recursos para P, D&I, seja para novos princípios ativos ou para entendimento do vírus e sua complexidade. Sem falar da necessidade de apoio à retomada da produção interna de equipamentos e itens para proteção individual, bem como da reindustrialização da economia, como um todo. O pequeno vírus está deixando um rastro de consequências diversas na sociedade mundial.
A Organização das Nações Unidas (ONU) declarou, recentemente, através de seu Secretário Geral, que essa pandemia está gerando consequências que já estão sendo sentidas e que ficarão como um legado ao mundo, podendo, inclusive, serem consideradas similares aos deixados pela Segunda Guerra Mundial.
Esta questão acha-se confirmada na manifestação da chanceler alemã Angela Merkel quando, em reportagem da BBC News, afirmou que “…desde a Segunda Guerra Mundial, não há em nosso país um desafio que dependerá tanto de nossa ação solidária conjunta…”. Diga-se de passagem, a Alemanha está entre os países mais eficientes no controle da COVID-19.
A atual pandemia, associada à globalização e a interconectividade das nações, gerou uma verdadeira ação baseada no uso do poder econômico para a realização de pesquisas e para a compra de equipamentos e elementos médico-hospitalares, medicamentos e bens intermediários. Em alguns países tem ocorrido até impedimentos de exportação e medidas econômicas já estão em curso.
A nível de Brasil, em 07/05/2020, segundo a Agência Safras, o atual ministro da economia reconheceu que “…a economia brasileira está agora iniciando o processo de entrada em colapso, o que poderá trazer sérias consequências socioeconômicas…”.
Na mesma data, o Congresso Nacional promulgou a Proposta de Emenda à Constituição 10/2020 (PEC 10/20), que trata do Orçamento de Guerra, para combater a crise gerada pela pandemia do novo coronavírus.
Nos Estados Unidos o governo adotou a Lei de Produção de Defesa (DPA), criada na época da Guerra da Coreia (1950), que concede ao governo federal poderes para requisitar fábricas e/ou exigir que as empresas aceitem e priorizem contratos governamentais.
Não restam dúvidas que os danos mundiais provenientes desta pandemia, segundo, ainda, as declarações do Secretário da ONU vão desde as consequências sanitárias até o aumento da instabilidade econômica, da violência e dos conflitos.
A Organização das Nações Unidas reconheceu, também, que a gravidade da crise e a eficácia limitada das ações de política monetária, motivou muitos governos, especialmente no Leste da Ásia e nos países desenvolvidos, a adotarem grandes pacotes de estímulo para enfrentar os impactos sanitários, econômicos e sociais da pandemia.
Os pacotes objetivam desde o aumento das capacidades de seus setores de saúde, para garantir a disponibilidade de suprimentos médicos, testes COVID-19 gratuitos e agressivos e cobertura de assistência médica aprimorada, até os financiamentos para pesquisa e desenvolvimento de vacinas e tratamentos.
Em um outro momento, o Secretário geral da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) expressou que o mundo vai levar anos para se recuperar do impacto da pandemia do novo coronavírus. Segundo ele “o choque econômico já é maior do que a crise financeira de 2008 ou a de 2001. Um crescimento global previsto para este ano de 1,5%, disse, já soa otimista demais”.
Infelizmente, quando voltamos as nossas atenções para a América Latina, não podia ser diferente. A análise da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) é taxativa em dizer que a economia brasileira encolherá 5,2% e os demais países conviverá futuramente com a pior crise social, a ser representada por desemprego e pobreza para milhões de pessoas.
A cada dia fica mais evidente que ajustes na economia mundial serão incalculáveis. Principalmente em questões onde se perceba a forte dependência de importações para a solução de problemas internos de cada país. Está visível que economias estão recorrendo às aquisições externas de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), gel hidroalcoólico e máscaras para a população em geral, por incapacidade de produção interna. Outro gargalo é a insuficiência de kits de teste diagnóstico e ventiladores.
A Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), cita que “ 70% das empresas do setor já lidam com problemas de abastecimento de componentes e insumos importados da China”.
Segundo Okubo (2020)[1] o novo Coronavírus vem mostrando como a indústria mundial depende da chinesa. Muitas companhias tiveram suas produções prejudicadas depois da crise que a China começou a enfrentar por conta do vírus.
A dependência do fornecimento de bens intermediários oriundos da China para a produção de diversos equipamentos ou eletrônicos em outras economias é o melhor indicador. A recuperação do mercado industrial de diversos países será lenta, se ainda prevalecer a necessidade dos bens produzidos na economia chinesa[2]. Já estamos num choque de oferta.
Percebe-se, claramente, que diversas empresas internacionais estão convivendo com interrupção de suas atividades econômicas, levando a problemas de sobrevivência, manutenção de empregos e giro de suas economias, por não terem sido atendidos pelos fornecedores chineses, principalmente.
A estratégia, no momento, que está sendo colocada em prática em inúmeros países, inclusive Brasil, visando amenizar as consequências de se depender das exportações daquele país, é a reconversão das linhas de produção.
A Associação Brasileira dos Fabricantes de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), “criou um grupo com 50 empresas associadas para a produção de peças, partes e equipamentos médicos. As empresas irão produzir desde ventiladores pulmonares a escudos de proteção facial, bem como peças, insumos e componentes, auxílios em sistemas de montagem, serviços de usinagem, corte a laser de peças e testes de validação. A multinacional alemã Thyssenkrupp Autômata, que fabrica peças para a indústria aeronáutica em Taubaté (SP), irá produzir um total de 120 mil máscaras do tipo “face shield“.
Um outro bom exemplo, seria a parceria da Klabin com o Instituto Senai para desenvolver um espessante à base de madeira em substituição à matéria-prima derivada de petróleo utilizada para transformar o álcool líquido em gel.
Além destas reconversões de linhas de produção, começam a ocorrer cobranças aos governos para incentivar a ampliação da produção interna. Na nossa opinião está clara que a desindustrialização contribuiu para a fragilidade de economias e que a China “permitiu que a transformassem numa grande potência industrializada (Figura I)”.
Karen Harris, diretora geral da consultoria Bain & Company´s disse recentemente que “as empresas perceberam o perigo que significa somar dependência e distância. Mas é certo que as redes de produção nacionais também se paralisam no caso de uma pandemia. Dá no mesmo. Através do planeta circula uma corrente de desconexão. “Até mesmo antes da crise muitas multinacionais com sede nos Estados Unidos já estavam reconsiderando sua dependência da China. Primeiro pelos custos, mas além disso pela guerra comercial e os impostos”.
César Sánchez Grande (diretor de análise e estratégia da Ahorro Corporación Financiera) cita que “…A verdade econômica se rege sob suas próprias leis da atração. Mudanças chegam. As grandes empresas terão que repensar onde e como produzem. Muitas moléculas são fabricadas na China, refinadas na Índia e, após uma longa viagem, terminam nas farmácias e hospitais europeus. Quando a crise passar, ocorrerá uma reindustrialização da Europa e dos Estados Unidos, pelos problemas nas redes de abastecimento que muitas empresas estão sofrendo nesses momentos…”.
O Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI) menciona em um trabalho, datado de 08/05/2020, intitulado “ Reconversão industrial em resposta à pandemia do Covid-19”, que “a indústria é um dos mais importantes motores do crescimento econômico, pelas inúmeras relações que estabelece com outros setores e entre seus próprios departamentos, e destacada fonte de novos produtos, novas tecnologias e novas formas de produzir, de maneira a alavancar a produtividade total da economia. É isso que indica boa parte das pesquisas que se debruçam sobre a economia real, isto é, sobre as atividades produtivas.
Por todos estes fatores, grandes potências econômicas do mundo nunca desistiram de estimular o desenvolvimento de suas competências industriais, por meio de um conjunto de ações e políticas que, inclusive, ganharam força nos últimos anos. Países desenvolvidos, como EUA, Alemanha e Japão, e os principais emergentes, como a China e a Índia, traçaram estratégias para fortalecer o setor industrial e tornar a indústria 4.0 uma realidade “.
Não restam dúvidas, contudo, que umas dessas nações erraram em transferir segmentos de suas indústrias para outros países (parte motivados pelo custo irrisório de mão de obra) e hoje estão passando por problemas na deficiência de peças ou equipamentos, frente à pandemia
A crise que o coronavírus está provocando, ensina que um país quando adota, única e exclusivamente, a estratégia de suprir o mercado interno com fortes participações de importações de bens ou insumos, que sejam considerados fundamentais para setores que promovam qualidade de vida, lucros econômicos e sociais, passa e passará por crises seríssimas.
Hoje o mundo está vendo que segurança (estamos nos referindo a biopirataria ou guerra biológica), saúde, saneamento, educação, alimentos e C,T&I são merecedores de investimentos e que Parcerias Público e Privada, para se buscar evoluções e revoluções tecnológicas, carecem de maiores atenções e investimentos.
Precisamos visualizar que viver de exportação de commodities causa diferentes fragilidades. A nossa opinião está baseada na dependência elevada do Brasil de insumos para produção no campo e que ao aumentar áreas de produção, fragiliza-se a biodiversidade e as condições climáticas.
No início deste mês (05/2020), a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) previu que a pandemia poderia custar à economia global até US$ 2 trilhões neste ano (cerca de R$ 10 trilhões) e que países que dependem da venda de matérias-primas, como o Brasil, estão em uma situação mais delicada, alertou a UNCTAD.
Diríamos que a economia brasileira, hoje está baseada em soft ou hard commodities (figura II). Este ciclo iniciou na década de 80, quando ocorreram as primeiras privatizações, as quais foram apresentadas como a grande solução para o País.
Os governantes buscavam o pagamento das dívidas e motivados pelos bons resultados no comércio exterior, face às elevadas demandas de commodities, executaram a venda de estatais e o Brasil passou a focar particularmente no “campo” e na extração de minerais.
O relatório da Comex, de 16/04/2020, cita que “… a exemplo do que vem acontecendo nas últimas décadas, a pauta exportadora brasileira para a China seguiu marcada por uma forte concentração nos produtos básicos, de baixo valor agregado. Apenas três produtos responderam, no primeiro trimestre deste ano, por 77% de todo o volume exportado para a China (soja, petróleo e minério de ferro)…”.
Na nossa opinião, os tomadores de decisão na época não se preocuparam (ou não raciocinaram) que estava iniciando a dependência da importação e uma possível acomodação com a busca da atualização científica e tecnológica e aos investimentos em P,D&I (figura III). Os problemas ficariam para os próximos.
Como resultado temos uma forte queda desde 1985 da participação da indústria de transformação no PIB (figuras IV e V), o que pode ser traduzido como um grave erro de estratégia ii .
Houve uma falta de consciência que esta indústria era e é um importante elemento de desenvolvimento e que sua ínfima existência dentro da fronteira provocaria uma forte dependência em setores econômicos do País e que um dia sentiríamos em uma situação, como a atual.
Como se não bastasse, nos anos 90, foi realizada a abertura econômica, que promoveu liberalizações, desregulamentações e privatizações, agravando, ainda mais o domínio de grandes empresas em diversos segmentos no Brasil.
Em muitos setores, já tínhamos conhecimentos e, com certeza, poderíamos não vir a depender para a produção interna – como a dependência da China[3].
Alguns economistas usavam como argumentos que seria o fato de “haver uma certa acomodação de empresas brasileiras com a falta de competição, o que permitia altos preços e baixa qualidades. Com certeza a maioria dos nossos produtos não eram muito competitivos”. Pegando, como exemplo, o carro nacional da Gurgel, diríamos que a sua qualidade não era das melhores” e os preços dos produtos no Brasil eram elevados.
Entretanto, entramos com a nossa opinião, que diverge um pouco da de alguns especialistas “o produto ou a empresa nacional eram de baixa qualidade e os preços elevados”.
Como utilizar esse argumento? Esqueceram da EMBRAER?
Esta empresa, criada em 1968, sempre foi um exemplo e a qualidade das aeronaves nacionais produzidas por ela não permitiram ou permitem questionamentos.
Com certeza, um dos fatores que alavancou a capacitação dessa empresa e levou à produção de um bem competitivo no mercado internacional foi a perspicácia do governo na época em investir em C,T&I e a existência no Brasil de competência técnica. Basta acreditar. Ela competiu e compete no mercado internacional.
Infelizmente está em processo de discussão, desde 2017, o processo de formação de sociedade com a companhia americana The Boeing Company.
Para fechar o nosso posicionamento, afirmamos que os produtos fabricados no Brasil apresentam um preço elevado, não por falta de competição, mas sim por excesso de carga tributária.
Não temos dúvidas que as décadas de 80 e 90 deixam como resultados o início da fragilidade do Brasil e a mudança da China como produtora de produtos de baixo preço e qualidade. A pandemia atual está mostrando isso.
Hoje a China figura como uma grande fornecedora, para diversos países, de bens manufaturados e com tecnologias inseridas. O que vem promovendo um repensar e uma reavaliação em diversas economias das estratégias adotadas no passado. Conforme já mencionamos.
Mas o que causou este avanço visível da China? Na nossa opinião foi a visão de longo prazo de seus governantes de que os investimentos crescentes em P&D (média 20% aa), a partir de 1999, impactariam positivamente na economia do país. Em 2007 teria alcançado 1,44% do PIB. A meta era elevar as despesas com Pesquisa e Desenvolvimento para 2,5% do PIB em 2020.
Arbix et al, cita que a evolução do investimento em pesquisa e desenvolvimento (P&D), que saltou de menos de 1% do PIB no início dos anos 2000 para pouco mais de 2,0% em 2014, surpreendeu pela dimensão e velocidade com que diferenciou a China dos demais países dos Brics[iii].
O representante do Investiment and Technology Promotion Offices (ITPO) da United Nations Industrial Development Organization (UNIDO) cita que a Covid 19 parou a sociedade chinesa, mas não a C,T&I, uma vez que a China a visualizou como uma das grandes ferramentas de crescimento e de desenvolvimento.
Eles tiveram clareza e visualizaram que a pesquisa de ponta, depende da ciência que a antecede em uma ampla variedade de fronteiras a qual, certamente, gerou ou irá gerar o conhecimento que terá utilidade um dia mais à frente.
Estendendo um pouco mais o debate com relação a China, percebe-se que foi considerado naquele país a educação básica, agricultura e C, T &I como setores prioritários
Além do que, dentre os ministérios componentes do Conselho de Estado, o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) é o principal agente do sistema nacional de inovação chinês (figura VI).
Para facilitar o entendimento, citamos que o Ministério administra os programas de C&T, desde a pesquisa básica até a comercialização das descobertas; apoia processos inovativos nas empresas; e administra e promove parques científicos e incubadoras (Cassiolato, 2013)[4].
Cassiolato, aponta, ainda, “…O papel do Estado e do Partido Comunista Chinês (PCC) – nesse processo é de importância sem precedentes. Tudo que ocorre na China é, em grande medida, resultado da atuação do Estado. O poder político permanece fortemente concentrado, e a capacidade administrativa do aparelho estatal cresce e se adapta tão velozmente quanto as transformações econômicas ocorrem…”.
Vale citar que hoje eles já se destacaram no exame do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA) e suas universidades já estão entre as cem melhores do mundo (ver o THE – Times Higher Education University rankings 2019)
Mas não podemos desanimar com relação ao Brasil. Certamente temos capacidade para crescer e desenvolver. Necessitamos, contudo, de investimentos em C,T&I e apoio às instituições que realizam os projetos de P,D&I, àquelas que analisam e financiam as propostas, bem como às empresas e aos setores que são necessários ou temos potenciais. Um outro bom exemplo, que mostra a capacidade brasileira, estaria ligado aos biocombustíveis. É necessário, contudo, manter os investimentos e o apoio. Vejamos o exemplo a seguir.
Os EUA perceberam que o setor de biocombustíveis é estratégico e merece investimento. Com isso, direcionam, de forma constante, recursos para incentivar a pesquisa, além de apoiarem a produção.
Com o patrocínio da NASA, cientistas da Universidade da Flórida vêm pesquisando as propriedades do Pinhão Manso para conversão em biocombustível, enviando, inclusive, células da planta à Estação Espacial, com o objetivo de verificar se a microgravidade pode influenciar no crescimento das culturas.
Em 2017, NASA e da Boeing recorreram à tecnologia brasileira desenvolvida pelo professor Expedito José de Sá Parente e fecharam um acordo com a empresa nacional Tecbio, com o objetivo de testarem o biocombustível produzido naquele país, para ser usado em larga escala na aviação comercial.
As pesquisas com o pinhão manso, desde a época de 80, constavam na agenda de apoio da FINEP (Empresa Pública do MCTIC) e nos experimentos da EMBRAPA. Como analista da Finep, presenciamos, já naquele tempo, o apoio financeiro à pesquisa com este vegetal.
Claro que não é a mesma coisa, mas um projeto de C,T&I pode levar muito tempo para demonstrar dados concretos[5].
Em relação, ainda, à biocombustíveis e aos EUA, citaríamos os testes que estão sendo realizados com a planta Cannabis sativa, que vem despertando um forte interesse nas pesquisas. Este vegetal mostra uma eficiência de aproveitamento (97% do óleo convertido em biodiesel) e a facilidade de crescimento em solos não exigentes de fertilidade ou de qualidade. Com isso, seria possível produzir biocombustíveis e não competir com áreas de produção de alimentos e não comprometer a biodiversidade daquele país.
A Unitade States Environmental Protection Agency (EPA) em 2018 estava com 38 projetos de biocombustíveis de primeira e segunda gerações em desenvolvimento e atenta ao potencial de crescimento do segmento.
O mundo já mostra acreditar que os biocombustíveis formam um setor dos mais importantes para o presente e futuro, merecendo apoio para produção, pesquisa e hoje, diante da pandemia, necessita de total atenção para sustentação das empresas e produtores do segmento.
Continuando a falar de biocombustíveis, destacamos o apelo dos governadores de estados produtores nos EUA ao USDA, com vistas à obtenção de financiamento para ajudar a resolver os “danos econômicos e perdas de emprego que os produtores de biocombustíveis estão sofrendo”.
É tudo uma questão de entender as ligações. Hoje, estamos convivendo com uma pandemia, que provoca uma retração no consumo de combustíveis de transporte, uma vez que diminuíram o quantitativo de viagens internacionais e nacionais e para uso diário em motores, que por sua vez impactam numa menor necessidade de etanol ou biodiesel e provoca diminuição ou paralisação da produção.
A realidade brasileira não difere da mundial. A pandemia e as medidas de lockdown no mundo e no Brasil vem impactando fortemente de forma negativa no trâmite de pessoas entre países, estados, cidades e bairros, provocando uma queda da demanda de combustíveis que, por sua vez, estão convivendo com uma forte redução no preço do petróleo e do etanol, comprometendo todo o segmento e exigindo à busca de soluções entre setores público e privado (Figura VII).
De acordo com o diretor técnico do grupo industrial Unica, Antonio de Padua Rodrigues, “… as usinas do Centro-Sul, a maior região produtora de cana do país, têm capacidade suficiente para estocar 60% da produção anual total de etanol em tanques. O principal problema é o custo para manter esses grandes estoques sendo que, sem vender, as usinas não têm receita…”.
O estudo do Cepea, da Esalq/USP denominado “Especial Coronavírus e o Agronegócio”, aponta com muita clareza o impacto do coronavirus.
Segundo o Cepea, ” … a pandemia do novo coronavírus no agronegócio. Mesmo tendo setores de alimentação considerados essenciais que não sofrerão com a crise, os setores de biocombustíveis, horticultura, floricultura, lácteos e agroindústrias como a têxtil-vestuária sentirão queda.
De acordo com a pesquisa, isso se dá devido a esses setores dependerem principalmente da demanda interna do país e serem produtos substituíveis e não essenciais, que a população para de consumir quando tem menos dinheiro…”.
As questões apresentadas até o momento nos trazem a certeza que o mundo errou em algumas questões e, nosso ponto de vista, a mais grave seria a insuficiência de sensibilidade ou visão de que dinheiro aplicado em C,T&I é investimento e não deve ser considerado como gasto ou despesa.
Infelizmente, a nível de Brasil, por exemplo, temos nos deparado com a triste realidade da forte queda iniciada em 2013 e que permanece até 2018 nos investimentos em Ciência e Tecnologia. O resultado é a nossa distância em relação aos países desenvolvidos em termos de investimento em P&D e as consequências ao País.
A Coréia do Sul, o Japão e a Alemanha, que despontam como os maiores investidores em pesquisa e desenvolvimento, compõem a lista dos países mais eficientes em termos de controle da pandemia atual e na descoberta da solução (figura VIII).
Segundo Pimentel (2019), um estudo realizado em nações do G20 demonstrou que, a despeito da importância das outras áreas, CT&I deve entrar na equação de desenvolvimento de qualquer país que almeja o crescimento econômico (figura IX).
Aqui acrescentamos o nosso ponto de vista de que todos setores são fundamentais. Sejam eles os de saúde, segurança, infraestrutura, agronegócio e educação. Entretanto, o mais importante seria a C,T & I, uma vez que está inserida em todos os segmentos, exercendo um papel de grande insumo para o desenvolvimento de todos os demais e para busca de um mundo melhor.
Não restam dúvidas que esta pandemia vem confirmando e deixará marcas positivas e negativas no mundo atual.
Oportunistas e dificultadores de solução estão sendo identificados e grandes mudanças de comportamentos, pensamentos e decisões sensatas precisarão ocorrer e ser implementadas. Em todos os países se observa (ou deveria) um grande desempenho (ou colaboração) dos que querem realmente solucionar ou amenizar o problema da Covid-19 e os que não querem, uma vez que o lucro social não é prioritário.
Todos sabemos que o problema é mais do que sério e precisamos correr. A chefe técnica da Organização Mundial da Saúde, Maria Van Kerkhove, em coletiva de 08/05/2020, externou que a OMS espera descobrir quais medicamentos realmente são seguros e eficazes para o tratamento da Covid-19 nos próximos meses. Esperar é insano.
Ao se falar em colaboração e mostrar a relevância da C,T&I, citamos que a NASA em seu Laboratório de Propulsão a Jato, na Califórnia, desenvolveu um novo ventilador de alta pressão, voltado às necessidades de pacientes com a COVID-19, o qual foi submetido a um teste crítico na Icahn School of Medicine no Mount Sinai, em Nova York – epicentro da COVID-19 nos Estados Unidos. Como procedimento padrão, o equipamento foi revisado para uma autorização de uso em caráter de emergência pelo Food and Drug Administration (FDA).
Um ponto muito importante é a engenharia deste ventilador ter sido a construção com menor quantidade de peças e com itens atualmente disponíveis para fabricantes em potencial. Dessa forma, agilizou-se o quantitativo produzido e barateou-se o custo final de venda e o de manutenção.
Outros dois bons exemplos seriam a construção de um capacete de oxigênio, que objetiva substituir o ventilador (em casos mais amenos) e o desenvolvimento de um dispositivo menor, portátil e econômico, cuja finalidade é a descontaminação em menos de uma hora e em espaços menores, como ambulâncias e carros de polícia. Cada um foi desenvolvido em diferentes Centros da NASA.
Pelo lado do Brasil, devemos citar que grandes resultados estão sendo alcançados, graças aos investimentos em pesquisas, aos apoios às empresas nacionais, através de melhoria da condição de créditos, suspensão de pagamento de dívidas ou incentivo na forma de subvenção para P,D&I.
Em termos de P, D&I, brilhantes trabalhos vêm sendo desenvolvidos por pesquisadores, empresas ou por startups, que estão contribuindo fortemente para o conhecimento, o controle e a solução da pandemia[6].
Vale expressar que algumas ICT’s no Brasil se destacam mais por buscarem associar pesquisa com eficiência de gestão[7].
Como exemplo, citamos que engenheiros da Escola Politécnica da USP, realizaram um projeto que culminou em um respirador para uso emergencial que pode ser produzido em pouco tempo e com baixo custo. Comprovando a capacidade interna do país e justificando a posição da USP entre as 300 melhores (ver o THE – Times Higher Education University rankings 2019).
Pesquisadores da Unicamp em parceria com a USP estão desenvolvendo um teste rápido para Covid-19, capaz de confirmar a infecção em cinco minutos. A previsão é de que o produto esteja disponível já em maio. Para criar o exame, os cientistas buscaram as “impressões digitais” do vírus. Ou seja, identificaram as moléculas que existem na doença com a ajuda de um programa de inteligência artificial.
Em um outro momento, os informativos mostram que são necessários em média 15 dias para obter o sequenciamento genético do coronavírus. Entretanto um grupo de cientistas brasileiros apresentou resultado em apenas 48 horas. O estudo foi realizado por pesquisadores do Instituto Adolfo Lutz (IAL), da Universidade de Oxford e do Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo (IMT-USP).
“A USP e o Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP) estão se preparando para iniciar a produção em escala do ventilador pulmonar emergencial, Inspire, desenvolvido por uma equipe de pesquisadores da Escola Politécnica (Poli)”.
Destacamos, também, uma matéria vista em 12/05 no jornal da USP “ …uma parceria da USP com a iniciativa privada deverá resultar, em breve, em mais uma arma na luta contra a covid-19. Uma equipe multidisciplinar da universidade formada por pesquisadores da Escola Politécnica (Poli), Faculdade de Medicina (FM) e da Faculdade de Odontologia (FO) está desenvolvendo um capacete que, adaptado ao respirador artificial, dispensa o uso do tubo endotraqueal em pacientes internados nas UTIs…”.
Não se pode mais questionar que a redução nos investimentos em C,T&I é um elemento de retrocesso e que impacta negativamente na economia e no avanço social. Precisa-se consolidar capacidade de produção de produtos nacionais com intensidade tecnológica em caráter emergencial.
Com certeza o apoio recente a diversas ações em C,T&I e a ação ativa do governo federal, representado por Ministérios (MCTIC e Saúde), ICT’s e instituições como Finep[8], CNPq, Institutos Butantan e Bio-Manguinhos, além de FAP’s e empresas nesta pandemia, corroboram o importante papel da P,D&I e da experiência de instituições, como a Finep, na solução desta crise sanitária e na busca de amenizar outras viroses ou, quiçá, se preparar para as variações ou rotas da Covid-19[9].
O MCTIC e Saúde[10], através da Finep e do CNPq estão apoiando projetos de P, D&I tanto para as ICT’s, Hospital das Forças Armadas, Rede Nacional de Ensino e Pesquisa, Instituto Laura, bem como para as empresas nacionais e que totalizam R$ 106,5 milhões.
Adicionalmente, estão disponíveis R$ 600 milhões pela Financiadora ao segmento privado, visando projetos que busquem a reconversão industrial; o desenvolvimento e escalonamento de dispositivos médicos ou que facilitem a aquisição de dispositivos essenciais para as instituições de saúde no combate ao coronavirus SARS-COV-2.
Por falar em utilização de recursos nesta luta contra a Covid-19, devemos mencionar que o “ …Ministério da Saúde já liberou R$ 11 bilhões em ações contra o coronavírus. Estão incluídos repasses diretos de recursos para estruturação dos serviços de saúde, além de aquisição de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) usados por profissionais de saúde, de testes de diagnóstico, medicamentos, respiradores, contratação de profissionais de saúde e habilitação de leitos de UTI para tratar pacientes com a doença. O balanço das ações foi apresentado pelo ministro da Saúde, Nelson Teich, junto com o Secretário Executivo, general Eduardo Pazuello, nesta segunda-feira (11)…”.
Encontrar princípios ativos para novas drogas, que sirvam para produção de antibióticos, vacinas e medicamentos, e incentivar a P,D&I , precisam ocorrer continuamente, sempre contando com a experiência e know how de instituições nacionais e buscar formas e elementos que promovam o desenvolvimento sustentável. A preservação da biodiversidade e da qualidade da água, do ar e da terra deverá constar na lista de todas as ações.
Neste sentido, afirmamos que “ o Brasil tem pela frente grandes desafios, que são, por um lado, promover o conhecimento, a exploração científica e a manutenção da nossa vasta biodiversidade para uso na produção de novas drogas e, por outro, dar continuidade à produção de alimentos e de biocombustíveis, que são considerados como setores econômicos importantes para tirar o País da recessão e promover o desenvolvimento”.
Está evidente que o segmento de biocombustíveis precisa se preparar e buscar o aumento da produtividade como uma de suas prioridades através, preferencialmente, de formas sustentáveis.
Esta pandemia tem mostrado ao Brasil e ao mundo a necessidade de fortes reflexões e avaliações a respeito de prioridades, de comportamentos e de modelos de desenvolvimento implantados nos Países.
Precisa-se fazer uma análise retrospectiva, verificar erros, quais medidas corretivas precisão ser implantadas, além do que foi feito por outras economias. No caso do Brasil, persistir nesta política adotada desde a década de 80 é dar continuidade ao caos.
Fica, ainda, evidente, que a presença do governo e de instituições públicas no apoio da pesquisa, no desenvolvimento e na inovação, associada às ações de controle do coronavírus, corroboram que é inconcebível sua função como simples regulador. As consequências já estão conhecidas e outros países mostram estratégias diferentes.
Precisamos buscar uma alteração do perfil dos produtos exportados. As aquisições das empresas nacionais por capital estrangeiro deveriam acender a luz amarela e, finalmente, precisávamos amenizar a fuga de cérebros, evitarmos a paralisação de projetos vitais e o fantasma do famoso contingenciamento deveria não aparecer mais[11].
Além do que, será lamentável comprovar o que parte da sociedade tem demonstrado como receio, que se resume na insegurança de que os fatores que estão levando o Brasil a uma fragilidade venham a cair na cesta da naturalidade e a vida volte ao “comum”.
Finalizamos este artigo dizendo seis coisas:
– o pequeno vírus (considerado um inimigo ainda desconhecido), nos provou que teve liberdade de ação; que agiu com igualdade entre países (com ou sem poder econômico); e promoveu a fraternidade entre cidadãos, fazendo com que a busca da vitória na guerra ao seu combate envolvesse um maior números de pessoas e países, exigindo união e sabedoria;
– declaramos os nossos sentimentos àqueles que perderam familiares ou amigos nesta pandemia;
– solidarizamo-nos com empresas ou comércios que finalizaram as suas atividades por causa desta crise econômica e social;
– registramos o nosso repúdio àqueles que se aproveitam de situações como essa para obterem lucros financeiros ou vantagens pessoais, dificultando soluções e prejudicando a sociedade;
– entendemos que ações de curto prazo e emergenciais de controle ou extinções de problemas, exercem um custo aos cofres públicos superiores aos investimentos de longo prazo e planejados – como educação, C,T&I , segurança e saúde;
– enaltecemos e deixamos o nosso muito obrigado e parabéns aos pesquisadores e professores, que estão se dedicando à busca de soluções (apesar de limitações); aos empresários que se uniram e saíram de suas rotinas de produção, fazendo reconversão de suas linhas de produção e apoiando com recursos próprios as produções internas; profissionais de segurança da sociedade e de serviços essenciais que continuaram suas atividades; as instituições que apoiam e financiam a P,D&I e, principalmente, a todos médicos(as), enfermeiros (as) e outros profissionais da saúde, que estão abrindo mão de suas vidas e segurança e vêm se dedicando ao bem da sociedade;
Estas são as nossas opiniões.
[i] Boletim Epidemiológico da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (Volume 51 | Nº 03 | Jan. 2020), a notificação de um caso confirmado para o gênero Mammarenavirus, com aproximadamente 90% de similaridade com a espécie Sabiá foi recebida em 17 de janeiro de 2020.
[1] Okubo, Beatriz (05/05/2020)- CORONAVÍRUS: IMPACTO NO MARKETING DIGITAL E NA ECONOMIA MUNDIAL
[2] O Brasil depende em 20 % de bens intermediários vindo da China. (Consultoria Oxford Economics, ligada à Universidade de Oxford, no Reino Unido)
[3] O Brasil depende em 20 % de bens intermediários vindo da China. (Consultoria Oxford Economics, ligada à Universidade de Oxford, no Reino Unido)
[4] Boletim de Economia e Política Internacional nº 13, Janeiro/Abril 2013
[5] Guy de Capdeville e Bruno Galveas Laviola – 11 set 2013 citam em artigo intitulado “ Pinhão-manso: insucesso ou erro de estratégia? O seguinte “… a Embrapa vem desde o ano de 2008 estruturando, coordenando e participando de projetos de pesquisa em redes nacionais e internacionais. Podemos citar como principais projetos: “Fontes Alternativas de matérias primas para produção de agroenergia”, financiado pela Embrapa, Petrobrás e Finep; “Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação em Pinhão-Manso para Produção de Biodiesel – BRJATROPHA”, com financiamento da Finep/MCTI…”;
[6] Um exemplo é o corona BR, que se trata de uma Plataforma desenvolvida pela startup Pixit. A plataforma é inédita e 100 % nacional.
[7] USP aparece na relação das 300 melhores Universidades do mundo segundo o THE – Times Higher Education University rankings 2019
[8] Secretaria Executiva do FNDCT – Fundo de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
[9] Se chegou e sugeriu-se às temáticas por Comitê e representantes possuidores de larga experiência e competência no segmento.
[10] Ministério da Saúde comparece com R$ 20 milhões.
[11] O contingenciamento consiste no retardamento ou, ainda, na inexecução de parte da programação de despesa prevista na Lei Orçamentária em função da insuficiência de receitas
[i] Ver “ Desindustrialização contribuiu negativamente para o desenvolvimento brasileiro” – Paulo Morceiro – 12/2018
[ii] Arbix et al (2000) USP – Made in China 2025 and Industrie 4.0: the difficult Chinese transition from catching up to an economy driven by innovation