Com a deterioração crescente da economia internacional nas últimas semanas, começam a ganhar importância os cenários alternativos para a economia brasileira neste ano, contemplando os efeitos negativos de um quadro de ruptura na Europa. A LCA Consultores, que tradicionalmente opera com mais de um conjunto de projeções, estima um PIB de 2,6% no quadro básico, e de 1,2% no adverso.
Já a MB Associados trabalha com um crescimento de 2,5% no cenário em que a Grécia não sai da zona do euro, mas montou um em que o Produto Interno Bruto (PIB) pode encolher 1% caso os gregos deixem a união monetária. Se a intensidade do impacto da piora externa sobre a economia brasileira divide os analistas, há um consenso de que o investimento, pelo lado da demanda, e a indústria, pelo lado da oferta, vão sofrer mais.
A LCA atribui 25% de probabilidade ao cenário adverso, percentual que, na visão de Fernando Sampaio, sócio-diretor da consultoria, pode aumentar, dado o crescimento das incertezas em relação à situação da Europa. Se concretizado esse quadro, o investimento teria queda no ano, encolhendo 1,2%, enquanto a produção industrial recuaria 0,5%. Ele acha improvável, porém, uma retração do PIB neste ano, mesmo em caso de saída da Grécia da zona do euro.
“A política econômica ainda tem cartuchos para estimular a atividade”, diz Sampaio. Para ele, se a situação externa piorar muito mais, atingindo duramente a atividade econômica doméstica, é possível apelar para cortes ainda mais fortes dos juros, redução dos compulsórios e relaxamento adicional das medidas macroprudenciais (de controle do crédito). Depois do arsenal monetário, o governo também poderia promover algum um afrouxamento da política fiscal, com aumento de gastos, e uma atuação mais agressiva do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O câmbio mais desvalorizado, por sua vez, pode dar alguma ajuda à indústria, contribuindo para deter a perda de mercado para os importados, acredita ele.
No cenário base, em que a economia internacional não desanda, a LCA espera que o PIB cresça 2,6% neste ano, puxado especialmente pelo consumo das famílias, que avançaria 4,1%. Mesmo no quadro adverso, com alta do PIB de 1,2%, o consumo das famílias ainda registraria uma expansão razoável, de 3,4%. O impacto do aumento de 14% do salário mínimo e o mercado de trabalho aquecido impulsionam esse componente da demanda, ainda que o alto endividamento de muitas famílias seja um entrave a um avanço mais forte.
Já o economista-chefe da MB, Sérgio Vale, é mais pessimista. Na semana passada, ele reduziu a estimativa de crescimento para 2012 de 3% para 2,5%, por causa da deterioração recente do quadro da Europa. Nessa hipótese, ele considera uma situação política complicada na zona do euro, mas não uma ruptura. A Grécia ainda ficaria na união monetária. “No entanto, apenas a nova rodada de mudança de percepção em relação a Europa já é suficiente para mudar a trajetória de crescimento de curto prazo para baixo”, diz ele, que considera 2,5% um teto para a expansão do PIB em 2012.
No primeiro trimestre, o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), que tenta antecipar o comportamento do PIB, cresceu apenas 0,15% em relação ao trimestre anterior, feito o ajuste sazonal. Indicadores econômicos de abril tampouco sugerem uma reação expressiva da economia. Ao lado do cenário externo complicado, isso contribuiu para que muitas instituições reduzissem abaixo de 3% as suas estimativas para o PIB neste ano.
Vale traça um quadro muito negativo para a indústria, que já foi muito mal no primeiro trimestre. Na sexta-feira, ele reduziu a previsão para a produção industrial neste ano de um já magro 1,2% para um tombo de 2,2%, no cenário que não contempla ruptura da zona do euro. Para ele, a piora acentuada do quadro externo em maio pode provocar quedas adicionais da produção neste mês e no próximo, “pelo menos”.
Vale também está pessimista em relação ao investimento. Prevê, por enquanto, uma alta neste ano de apenas 0,1%, mas já vê como mais provável uma queda. Se o cenário de ruptura na Europa se precipitar e a Grécia deixar a moeda comum, as coisas podem ficar bem piores, diz ele. Há o risco grande de contágio para outros países da periferia da zona do euro, elevando ainda mais a incerteza global.
Por aqui, o PIB poderia cair até 1% neste ano, com a possibilidade de a produção industrial recuar algo como 10%, acredita Vale. Nesse cenário, o investimento poderia cair 15% ou mais. Com uma deterioração forte do cenário externo, os já ressabiados empresários se tornariam ainda mais cautelosos, engavetando projetos de ampliação e modernização da capacidade produtiva.
A Tendências Consultoria revisou neste mês a estimativa de crescimento deste ano de 3,2% para 2,5%, projeção idêntica à do cenário pessimista definido em março, que tinha como uma das premissas uma ruptura na zona do euro apenas em 2013.
O economista Juan Jensen, da Tendências, diz que, quando for revisto no mês que vem, o quadro adverso certamente apontará uma expansão mais modesta da atividade neste ano. Como Sampaio, Jensen acha improvável um PIB negativo em 2012, ainda que a situação europeia piore significativamente. Em caso de o cenário externo degringolar, o investimento seria bastante afetado, diz ele, acreditando também que o consumo das famílias não sairia ileso.
O economista Aurélio Bicalho, do Itaú Unibanco, por sua vez, revisou a sua projeção para o PIB de 2012 para baixo, mas ainda acredita num crescimento superior a 3% – a estimativa caiu de 3,5% para 3,1%. A atividade econômica nos primeiros meses do ano mostrou que a retomada tem sido lenta, mas ele acredita numa recuperação mais forte no segundo semestre. A massa salarial cresce com força, por causa do novo salário mínimo e do desemprego baixo, impulsionando as vendas nos supermercados, e a confiança do consumidor está em níveis elevados, diz Bicalho. Os efeitos defasados da queda dos juros e o aumento dos gastos públicos também devem incentivar a economia na segunda metade do ano, acredita ele.
O Itaú Unibanco ainda não elaborou um cenário alternativo, levando em conta uma deterioração mais forte da economia internacional, mas pode fazê-lo em breve, de acordo com Bicalho. Para o primeiro trimestre, ele projeta crescimento de 0,7% em relação ao trimestre anterior, feito o ajuste sazonal, acima do 0,5% projetado pela LCA, MB e Tendências.
Apesar de o IBC-Br ser considerado um bom termômetro para a tendência do PIB, ele costuma mostrar alguma diferença em relação ao resultado divulgado pelo IBGE, o que ajuda a entender por que as consultorias não alinham automaticamente as suas estimativas ao número do IBC-Br.