A crise acelerou a mudança de perfil dos dez maiores importadores e exportadores do País. O avanço das commodities na pauta de exportações brasileiras, iniciado há alguns anos, intensificou-se em 2009. Como resultado, restou apenas a Embraer como fabricante de manufaturados entre as dez empresas que mais venderam ao exterior no ano passado, em termos de valor. Em 2008, ao lado da Embraer, duas montadoras estavam entre as dez maiores. Em 2005, havia quatro indústrias de manufaturados na lista.
No total, 585 empresas deixaram de vender produtos no exterior no ano passado – um queda de 3% no total de exportadores. Foi o segundo ano consecutivo com queda na quantidade total de companhias que vendem no exterior. Foi a primeira vez, contudo, que o total de grandes exportadores diminuiu – caiu de 260 para 223 o número de empresas com exportações anuais acima de US$ 100 milhões. A principal razão para esse encolhimento no ímpeto exportador foi a concentração das vendas externas nas commodities, que passaram por um vale de preços em 2009.
A queda no número de companhias exportadoras ocorreu em todas as faixas de valores superiores a US$ 40 mil. Entre US$ 10 milhões e US$ 100 milhões, o total de empresas com vendas no exterior caiu de 1.441 para 1.180
Para o secretário-adjunto de Comércio Exterior, Fábio Martins Faria, a redução nas faixas de maior valor exportado aconteceu em função de uma combinação de fatores. Além da redução de preços de commodities no ano passado, houve também dificuldade dos fabricantes brasileiros de manufaturados para colocar grandes volumes no mercado internacional. “A queda no número de exportadores já era esperada, em função da redução de 22% nos valores totais embarcados em 2009, na comparação com o ano anterior.”
“Os preços resultaram num rebaixamento geral das exportadoras para faixas de valores menores”, diz José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil. Ele acredita que a redução no número de exportadores reflete o domínio das commodities, principalmente agrícolas, na pauta de exportações e na classificação das que mais vendem ao exterior.
A alteração não se restringiu às exportações. No ranking dos maiores importadores, subiram as montadoras. Entre as dez maiores, estão quatro fabricantes de automóveis: Honda, Fiat, Volkswagen e Toyota. Em 2008, eram apenas duas montadoras. A explicação geral da mudança no caso das montadoras está na importação de insumos para produção voltada ao mercado interno, num ano em que houve queda na demanda internacional. Isso fez elas reduzirem o peso entre os maiores exportadores e aumentarem a participação entre os grandes importadores.
“Essa mudança na classificação das empresas é resultado da tendência de maior exportação de produtos básicos”, diz o economista Júlio Callegari, do J.P. Morgan. “Ao mesmo tempo, em 2010, a combinação do nível de atividade doméstica muito forte com o câmbio apreciado deve fazer com que os exportadores continuem se voltando mais para o mercado interno”, completa ele.
A força do mercado não fez diferença apenas para as montadoras de automóveis. Benjamin Sicsú, vice-presidente de novos negócios da Samsung, credita principalmente ao mercado interno a subida do oitavo lugar, em 2008, para a quarta posição em 2009 na classificação das dez maiores importadoras.
Em 2009, a Samsung Eletrônica desembarcou US$ 1,47 bilhão em insumos importados. No ano anterior, US$ 1,55 bilhão. A apesar da redução nos valores totais, Sicsú informa que houve, no ano passado, um aumento no volume e no número de insumos importados. Isso aconteceu em função de novas linhas de produtos. “As câmeras fotográficas e os ‘home theaters’, por exemplo, passaram a ser fabricados em setembro e outubro de 2008 e pegaram o ano cheio de 2009”, diz Sicsú. Para 2010 estão previstos duas linhas novas, de notebooks e ar-condicionado.
Ele explica que a empresa importou mais insumos para elevar a produção para o mercado brasileiro. A arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da companhia, diz, aumentou 3% de 2008 para o ano passado. Na fábrica da Samsung instalada em Manaus, houve elevação no número de trabalhadores. A empresa fechou com 1.560 funcionários em 2008 e ao fim do ano passado estava com quadro ampliado para 1.990 empregados.
Como resultado, a empresa aumentou seu faturamento entre 10% e 15% em 2009, na comparação com o ano anterior. “O crescimento aconteceu porque houve ganho de ‘market share’. Nós éramos o quarto em venda de celulares em 2008 e no ano passado ficamos em primeiro”, exemplifica Sicsú.
O aumento de produção interna gerou ritmo vigoroso de importações, explica o executivo, porque os produtos fabricados pela Samsung no Brasil possuem alto índice de insumos produzidos no exterior. “A participação dos importados é em média de 70% do valor dos produtos fabricados no país.” Segundo ele, a apreciação da moeda nacional não significa, necessariamente, uma vantagem com a significativa importação de insumos. “Essa redução acaba sendo repassada ao preço interno do produto, porque a concorrência no setor é muito grande.”
Fabricante de resinas e petroquímicos básicos, a Braskem subiu de colocação na lista dos maiores importadores, como também dos grandes exportadores. Em 2008, a petroquímica era a 27ª maior importadora. No ano passado, subiu para o sexto lugar. Na classificação dos que mais venderam ao exterior no ano passado, a companhia ficou em sétimo lugar. Em 2008, ela havia ficado em 23º .
O diretor de exportação da Braskem, Edison Terra, explica que o salto no ranking dos maiores exportadores deve levar em consideração que em 2008 houve um cenário atípico. Ele explica que a Braskem teve de janeiro a julho de 2008 paradas programadas de manutenção. “No segundo semestre, quando a empresa estava com sua capacidade industrial renovada, a crise já estava afetando o mercado internacional.” Além disso, lembra ele, outras duas centrais petroquímicas também tiveram paradas para manutenção praticamente no mesmo período, o que resultou em menor excedente de produção e uma queda no volume de exportação do setor. Dessa forma, a exportação da Braskem também caiu em 2008.
Em 2009, porém, diz Terra, a empresa foi beneficiada pelo chamado “efeito China”, principalmente durante o primeiro semestre. Importante mercado para as resinas termoplásticas da Braskem, a Europa reduziu o volume de exportações, mas a petroquímica destinou suas vendas para o países asiáticos.
“As exportações para a China mais do que compensaram a queda de vendas para o mercado europeu no primeiro semestre de 2009”, explica o diretor. Segundo ele, no ano passado os chineses aumentaram em 25% as importações totais de resina. No terceiro e quarto trimestres de 2009, as vendas para os demais mercados apresentaram melhora e, ao mesmo tempo, os preços se recuperaram no mercado internacional, embora tenham terminado o ano passado com valores entre 60% a 70% abaixo do pico de 2008. Para 2010, diz o diretor, a Braskem espera uma demanda chinesa no mesmo nível do ano passado, já que o crescimento de 25% de 2009 elevou bastante o patamar de comparação.
Com exportações puxadas pela China e produção para o mercado interno, diz Terra, a subida na classificação das maiores importadoras foi natural, já que aumentou a demanda pelo insumo importado pela petroquímica.