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Economia

Crise passou, e risco é câmbio, diz indústria

<p>Nível de ocupação da capacidade já está apenas 2,4 pontos abaixo da média histórica do setor.</p>

Os empresários brasileiros estão convencidos que o país já está no pós-crise e, no cenário de retomada, o câmbio aparece como uma das principais preocupações. O Grupo de Acompanhamento da Crise (GAC), composto por representantes do governo e do setor privado, realizou ontem em Brasília a reunião mais otimista desde o agravamento da crise internacional, em setembro de 2008. No encontro e fora dele, representantes das indústrias passam a mostrar preocupação com a competitividade do setor, o desempenho da balança comercial, o impacto do real apreciado e a necessidade de retomar os investimentos nas áreas de logística e infraestrutura.

“Muitos setores apresentaram recuperação e agora é preciso uma agenda que garanta o crescimento sustentável”, afirmou o presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy. Durante a reunião, disse, foi sugerida a substituição do atual nome do GAC para Grupo de Acompanhamento da Competitividade, para oficializar a chegada do período pós-crise.

Para o coordenador de sondagens conjunturais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Aloísio Campelo, os setores eminentemente exportadores são os que levarão mais tempo para recuperar o nível de atividade antes da crise. “Na demanda externa ainda há um forte componente de incerteza. Mas de maneira geral pode-se dizer que a crise passou”, afirmou. A Sondagem Conjuntural da Indústria da Transformação realizada pela FGV indica que, além de comércio e serviços, parte dos setores industriais já recuperou ou opera em nível muito próximo à média histórica.

Pelo levantamento, o nível de utilização da capacidade instalada (Nuci) da indústria da transformação em julho estava 2,4 pontos percentuais abaixo da média histórica dos últimos dez anos, que é de 82,2%. Entre as categorias de uso, as indústrias de bens de consumo operavam com 3,4 pontos percentuais acima da média. A indústria de materiais de construção, que apresentou recuperação mais significativa a partir de maio, operava com Nuci 4,2 pontos acima da média histórica. Bens intermediários, que respondem por 50% da produção industrial, apresentaram queda de 5,2 pontos percentuais em relação à média histórica e a indústria de bens de capital, queda de 5,9 pontos.

Em relação ao desempenho de setembro (mês de recorde no nível de uso da capacidade instalada), a indústria da transformação ainda opera em nível inferior, com diferença de 5,6 pontos percentuais. A maior queda foi verificada na categoria de bens de capital, de 14,7 pontos percentuais, seguida pelos setores de bens intermediários (4,9 pontos), bens de consumo (4,8 pontos) e materiais de construção (3,2 pontos). “Há recuperação clara nos segmentos mais influenciados pelas medidas anticrise do governo. Mas é uma recuperação lenta”, afirma Campelo. De acordo com o economista, os segmentos de bens não duráveis, como alimentos e produtos farmacêuticos, foram menos afetados pela crise e no segundo semestre também tendem a registrar crescimentos na comparação mensal.

Por outro lado, observou o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, a indústria de bens de capital, que registrou os piores resultados ao longo do primeiro semestre, tende a apresentar uma forte recuperação, sobretudo no fim do ano. “O mais provável é que no quarto semestre o setor volte a liderar o crescimento, como ocorreu entre 2004 e 2008”, disse. Para o terceiro trimestre, a expansão mais forte deve vir do setor da construção, que reage à crise desde maio, observou.

Visão semelhante possui o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat), Melvyn Fox. “As obras do Minha Casa Minha Vida começam agora, o que vai gerar maior demanda por materiais de construção, juntamente com os programas de financiamento a juros reduzidos, que ajudaram na recuperação no primeiro semestre”, afirmou. Conforme sondagem realizada pela Abramat, o percentual de empresários otimistas em relação ao desempenho da indústria em agosto cresceu para 74%, ante 57% em julho. O percentual de empresários que pretende investir subiu 9 pontos em julho, para 44% do total, e o nível de utilização da capacidade instalada aumentou 3 pontos, para 81%. “Há uma mudança no comportamento do setor em relação às expectativas para o segundo semestre.”

Segundo o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto, uma das questões predominantes ontem foi a preocupação com os efeitos da valorização do real e do custo Brasil sobre as exportações brasileiras. Ele se queixou, mais uma vez, que “o ministro [Guido Mantega, da Fazenda] não abre nenhuma indicação de que a política cambial será revista”. Mas disse que “boas notícias” foram relatadas, entre elas a integralização pelo Tesouro Nacional da sua cota nos fundos garantidores, criados para avalizar empréstimos de pequenas e médias empresas.

Na noite de ontem, durante cerimônia na CNI em que foi agraciado com a Medalha do Mérito Industrial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva animou os empresários. “É desejável e possível cortar ainda mais os juros. Temos o menor patamar da nossa história”, disse o presidente, que fez um balanço das medidas adotadas pelo governo para enfrentar a crise.

Em relação ao câmbio, o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, afirmou que há pouco a se fazer. Os principais desafios para estimular as exportações, disse, são os investimentos em logística e a redução do custo dos produtos brasileiros.

O presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Aguinaldo Diniz Filho, considera necessário “evitar a euforia”. “Muitos setores apresentaram melhora e se usou o termo pós-crise. Mas é preciso desonerar a folha de pagamento e dar condições de isonomia para a indústria competir com as de outros países”, afirmou. Ele citou os setores têxtil, calçados e máquinas e equipamentos como os mais afetados atualmente pelos importados.