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Dívidas rurais alcançam R$ 37 bilhões

<p>Estudo inédito mostra que existe uma inadimplência de 46% em débitos de médios produtores.</p>

Da Redação 10/06/2005 – Descontentes com a reunião “infrutífera” de quarta-feira com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e bastante irritados com os poucos recursos dados ao ministro Roberto Rodrigues (Agricultura), os ruralistas decidiram tentar uma última cartada para arrancar do governo uma renegociação “ampla, geral e irrestrita” de parte dos R$ 37 bilhões em dívidas rurais ativas.

No próximo dia 27, os produtores iniciam, em Brasília, um “tratoraço” de cinco dias para forçar uma decisão sobre o que seria a quarta rolagem dos débitos do setor agropecuário desde 1995. Os ruralistas avaliam que a forte pressão política sofrida pelo governo nos últimos dias pode ajudar a desatar o nó da nova rolagem das dívidas.

Um levantamento inédito obtido pelo Valor mostra que um terço das dívidas agropecuárias estão atrasadas. Há uma inadimplência de 46% nos débitos de médios produtores, que têm R$ 6,04 bilhões em financiamentos atrasados desde 1998. Desse total, 65% são de contratos acima de R$ 200 mil. Os empréstimos a grandes produtores registram um índice de atraso menor, de 12% – há R$ 1,5 bilhão pendurados na conta dos bancos. Os agricultores familiares beneficiados pelo Pronaf (programa nacional de apoio à agricultura familiar) têm R$ 300 milhões atrasados e não pagos – ou 11% do total emprestado. Nos fundos constitucionais do Norte (FNO), Nordeste (FNE) e Centro-Oeste (FCO), a inadimplência chega a 39%. Há R$ 2,7 bilhões em débitos atrasados de pequenos, médios e grandes produtores rurais.

Os números inéditos foram consolidados num estudo pela Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados a partir de dados oficiais de bancos federais, privados e do Tesouro Nacional. É a primeira radiografia profunda das dívidas do setor, que será usada para sustentar um projeto de lei da própria comissão. A proposta autoriza a prorrogação de parcelas de crédito rural vencidas e a vencer até este ano.

Pelos dados dos ruralistas, o Tesouro teria uma “folga” de R$ 5,221 bilhões já autorizados até 2025 pela lei da rolagem em 2002. Sem uma nova renegociação, a União deixaria de receber R$ 3,672 bilhões e poderia ter uma nova receita de R$ 5,448 bilhões até 2025 com a medida.

Os dados mostram que poucos produtores honraram as dívidas securitizadas pela primeira vez em 1995 por um prazo de dez anos. No vencimento da primeira parcela, em 1997, só metade pagou. Em 1998, foram só 30%. Os motivos vão desde a ocorrência de estiagens, geadas e perda de receita até problemas pessoais com gerentes de bancos. O saldo daquela rolagem está hoje em R$ 13,133 bilhões.

Depois, uma lei de 2002 (n 10.437) foi ainda mais benevolente: alongou esses prazos da securitização até 2025. Mas como os produtores tinham que pagar 32,5% da dívida em dinheiro para ter o benefício, não aderiram 45 mil contratos que têm dívidas de R$ 4,342 bilhões em valores de hoje. Dos produtores que aceitaram as regras e renegociaram em 2002, há hoje quase 20 mil contratos inadimplentes, que somam R$ 1,743 bilhão em atraso. De novo, a culpa recaiu sobre a burocracia. As dívidas vencidas eram corrigidas pela taxa Selic mais 1% de juros anuais, houve perda do bônus de adimplência e distorções na equivalência em produto. Resultado: a prestação teria aumentado 85% desde 2001, quando o saldo vencido era de R$ 400 milhões – e hoje soma os R$ 4,342 bilhões.

Os grandes produtores, que rolaram débitos pelo programa de saneamento de ativos (Pesa) em 1998, somam R$ 1,457 bilhão em juros vencidos e não pagos. São 13 mil contratos – 95% acima de R$ 200 mil – que não teriam sido honrados porque, em 2002, os produtores tinham que quitar os juros até então vencidos para entrar na nova renegociação, que limitou os encargos a 9,5% ao ano e ainda deu um desconto de 5 pontos percentuais nas taxas de juros.

No caso dos produtores dos fundos constitucionais, foram renegociados R$ 1,923 bilhão por uma lei de 2001 (n 10.177). Desse total, 31% estão inadimplentes – ou R$ 597 milhões. Além disso, R$ 5,02 bilhões ficaram de fora dos benefícios da lei – 45% desses débitos estão inadimplentes. No Pronaf, foram renegociados pela Lei n 10.696, de 2003, R$ 803 milhões. Não há inadimplência porque as parcelas começam a vencer neste ano. Mas ficaram de fora da rolagem outros R$ 1,85 bilhão em dívidas de mini e pequenos produtores – R$ 290 milhões (16%) estão inadimplentes.

A proposta dos ruralistas de fazer nova renegociação de R$ 12,3 bilhões em dívidas beneficiaria cerca de 1 milhão de produtores. Segundo o deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS), parte das despesas com a medida já está prevista no orçamento da União pelas legislações de rolagens anteriores. “Esses despesas só não foram realizadas pelo governo”, afirma. O projeto, segundo ele, busca “viabilizar” o recebimento das dívidas carregadas pela União.