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Protecionismo

EUA querem acordo com Brasil

<p>Norte-americanos querem discutir um novo modelo de acordo bilateral de comércio e investimentos, capaz de facilitar solução de futuros conflitos na área comercial.</p>

Sem propostas para reduzir os subsídios americanos ao algodão, condenados pela Organização Mundial do Comércio (OMC), o representante do Comércio dos Estados Unidos, Ron Kirk, se reúne hoje (17/09) com o ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, disposto a concentrar suas conversas em Brasília em um ponto: a discussão de um novo modelo de acordo bilateral de comércio e investimentos, capaz de facilitar solução de futuros conflitos na área comercial.

“O propósito dessa viagem não é evitar ou discutir o caso do algodão, meu principal objetivo é buscar meios de ampliar nossa relação bilateral e encontrar o mecanismo apropriado para aumentar nossa estrutura de comércio e investimento”, disse Kirk, ao Valor, na única entrevista exclusiva concedida por ele durante a visita ao Brasil.

Bem humorado, advogado de formação e político de carreira (foi prefeito em Dallas, no Texas), Kirk, o principal negociador comercial dos EUA, ainda se mostra pouco à vontade para entrar em detalhes técnicos nos assuntos de sua área. Ele disse estar disposto até a negociar acordo de proteção a investimento com dispositivos diferentes dos incluídos nos acordos de investimento dos EUA – algo que, até hoje, o governo americano jamais admitiu fazer.

Kirk disse achar insuficiente o atual memorando de entendimentos assinado pelo governo Lula com os Estados Unidos na gestão de George W. Bush, com declarações vagas em favor do incremento de comércio. “Talvez devamos pensar criativamente em outro mecanismo, uma estrutura mais bem definida que o memorando de entendimento que temos agora”, afirmou, deixando claro que falava em termos estritamente bilaterais, sem incluir os demais sócios do Brasil no Mercosul.

“Não quero ser evasivo, mas, mais que falar no Mercosul ou outro formato regional, meu propósito em estar aqui é trazer um maior foco na relação bilateral Brasil e Estados Unidos”, disse. “Se o ministro Amorim quiser falar de Mercosul e Doha falaremos, mas o propósito da viagem é falar de EUA e Brasil”, esclareceu, mencionando, sem mostrar muito entusiasmo, outro tema incluído na agenda pelo governo brasileiro, as negociações de liberalização comercial na OMC, conhecidas como Rodada Doha.

Kirk não trouxe boas notícias para os exportadores de algodão, que querem mudança no atual sistema de subsídios americano, condenado na OMC. Em conversas com empresários, na residência do Cônsul dos EUA no Brasil, Kirk indicou que buscará maneiras de compensar o Brasil pela manutenção dos subsídios ao algodão. “Conversamos que seria mais conveniente que seguissem as regras da OMC, e, se precisarem de prazos, que, em lugar de retaliações, houvesse compensações, como cotas para outros produtos”, relatou Roberto Giannetti da Fonseca, diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, também presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne. A carne, o etanol, frango e suco de laranja são produtos sujeitos a barreiras tarifárias que poderiam ter facilitada a importação nos EUA, disse Gianetti.

Ao Valor, evitando responder diretamente sobre o tema, deu a entender que Obama não planeja enviar formalmente ao Congresso proposta de redução dos subsídios. “Esta é uma prerrogativa do Congresso”, reagiu Kirk ao responder se o governo vai reduzir os subsídios considerados ilegais ao algodão.

Ele informou que se reuniu para discutir o tema com líderes do Congresso, mas, lembrando que nos EUA há “uma extraordinária preocupação com a decisão da OMC”, não quis dar detalhes do ânimo dos parlamentares, que vêm retardando decisões sobre acordos de livre comércio já assinados pelo governo.

Durante almoço na Câmara de Comércio Americana, Kirk recebeu insistentes perguntas – que deixou sem resposta clara – sobre o que o governo dos EUA faria caso o Brasil ponha em prática a retaliação autorizada pela OMC, contra direitos de propriedade intelectual de empresas americanas. “Vinda do setor privado, essa pergunta parece um pedido de socorro”, brincou, antes de classificar as retaliações contra direitos de patente e de autor como “a pior coisa que um país poderia fazer”.

Mais tarde, Kirk disse ao Valor que sua atribuição, como representante comercial dos Estados Unidos, é defender “rigorosamente” os direitos de propriedade intelectual de empresas e cidadãos dos EUA, mas evitou dizer se adotará alguma represália, como previsto na legislação americana, caso o Brasil, autorizado pela OMC, decida reagir com medidas como quebra de patentes ou de direitos autorais à manutenção dos subsídios ilegais ao algodão.

“Não há um modelo único para todas as situações”, disse Kirk, ao afirmar que a reação americana a um eventual desrespeito a direitos de propriedade intelectual, pelo Brasil, terá de ser analisado de acordo com a medida e o contexto em que ela for tomada. Ele deixou evidente que só discutirá mais profundamente com o Congresso sobre os subsídios ao algodão depois de saber que medidas retaliatórias o Brasil pretende adotar contra os EUA.

“No contexto da OMC, onde se disputa essa questão do algodão, a medida apropriada de resposta seria a que afetasse algum setor similar”, comentou Kirk. “Mas é bom deixar bem claro que essa é uma decisão a ser feita pelo governo brasileiro”, acrescentou.

Insistentemente cobrado pela recente decisão do governo dos Estados Unidos de impor uma tarifa de 35% sobre pneus importados da China, como medida de salvaguarda (permitida pela OMC), Kirk se recusa a admitir que a medida tem caráter protecionista e contraria o compromisso de evitar novas barreiras comerciais, assumido pelo presidente Barack Obama, com os outros governantes do G-20, o grupo das economias mais influentes do mundo, que se reúne semana que vem, em Pittsburgh, EUA.

A barreira é vista por alguns analistas como uma maneira de reforçar as credenciais políticas de Obama, para tentar a aprovação de acordos de livre comércio em um Congresso avesso a medidas de abertura de mercado. Há temores, porém, de que desencadeie uma guerra comercial entre duas das principais economias do planeta. “Os EUA não buscam guerra comercial com a China ou qualquer parceiro comercial, mas não vamos recuar de nossa responsabilidade de proteger nossos empresários e trabalhadores de condições desequilibradas de competição.”