Redação (06/11/2008)- A Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frangos (Abef) decidiu engrossar a voz nas negociações que tentam contornar o impasse com a União Européia em torno das cotas para as vendas de cortes de frango salgado do país para o bloco com tarifa mais baixa. Davilym Dourado/Valor
"É hora de o país mostrar que negocia diferente", diz Christian Lohbauer, diretor-executivo da Abef, sobre o impasse
Segundo Christian Lohbauer, diretor-executivo da Abef, as 18 empresas que fazem parte da entidade concordaram em não aceitar a contraproposta da UE sobre a distribuição das cotas para o comércio do produto. A próxima reunião entre as partes sobre o tema está marcada para o dia 14.
Como já informou o Valor, os europeus não gostaram da mudança na administração das cotas determinada por resolução da Câmara de Comércio Exterior (Camex), em agosto passado.
Conforme a resolução, que respeita as regras internacionais de comércio, a administração das cotas do frango salgado, que vinha sendo feita pela UE, passou à responsabilidade do Brasil, que optou por distribuir 90% dela com base no histórico das vendas das empresas exportadoras entre julho de 2005 e junho de 2008.
Os 10% restantes foram reservadas a novos grupos exportadores – e aqui as divergências ocorrem também no front doméstico. Ocorre que empresas médias e pequenas sem histórico de exportação consideraram a divisão desigual e reclamaram mais espaço.
Em tese, a posição das pequenas e médias vai ao encontro da contraproposta que será defendida pela UE no próximo dia 14. Segundo Lohbauer, os europeus admitem que a cota seja dividida pelo Brasil, mas querem que novos grupos interessados nesse comércio tenham uma fatia de 50%.
"Não aceitaremos essa contra-proposta", garantiu o executivo. Ele sabe que, caso o impasse perdure, a emissão de licenças continuará suspensa e a disputa poderá parar na Organização Mundial do Comércio (OMC), hipótese que desagrada ao Itamaraty. Ainda assim, afirma Lohbauer, "é hora de o país mostrar que negocia diferente" e as empresas exportadoras estão irredutíveis.
A origem da briga data de 2002. Foi quando Brasil e Tailândia, grandes exportadores de carne de frango, descobriram que havia uma linha tarifária especial na UE que permitia a entrada de cortes de peito com teor de 1,2% de sal a uma taxa bem menor. Se o peito congelado normal pagava 1.024 euros por tonelada (equivalente a uma tarifa ad valorem de 88%), o peito salgado pagava 15,4% ad valorem.
O Brasil chegou a exportar 150 mil toneladas por meio da linha especial, mas em 2003 a UE resolveu fechar a porta e aplicar uma tarifa ad valorem de 75% nos cortes salgados. Brasil e Tailândia foram à OMC e venceram a disputa, em resultado que saiu em 2006.
Os juízes da OMC decidiram que a tarifa de 15,4% deveria voltar a vigorar em junho de 2006, mas a UE recorreu a um artigo do GATT e pediu a revisão dessa taxa. O muro subiu para peito salgado, frango cozido e peru temperado, e, como exigia o artigo do GATT, os europeus tiveram que compensar brasileiros e tailandeses. Vieram as cotas com tarifas preferenciais.
Conforme acordo bilateral assinado em outubro de 2006, o Brasil ficou com uma cota de 170 mil toneladas para o peito salgado, de 79 mil toneladas para o cozido e de 92 mil toneladas para o peru. Nesse acordo, o Brasil conseguiu impor a criação de um certificado de origem especial para o comércio intracota, em uma tentativa de monitorar o movimento dos importadores.
O problema, diz Christian Lohbauer, é que a UE distribuiu licenças de importação para qualquer empresa européia que já tivesse importado carne de frango do Brasil – inclusive para coligadas menores de grandes grupos. Assim, afirma, no primeiro trimestre em que regime de cotas entrou em vigor (julho a setembro de 2007), começou a se formar na Europa um mercado paralelo de licenças, em que importadores vendiam os papéis para outros importadores, encarecendo as exportações sem que esse "plus" fosse para os exportadores.
Independentemente do volume a ser importado, a administração européia da cota previa um depósito de 500 euros pela licença, resgatáveis posteriormente. Em dólar, calcula a Abef, a diferença entre o preço cobrado dentro da cota para o valor fora da cota chega a US$ 1 mil por tonelada no caso do peito de frango.
Para a entidade, se o Brasil administrar a cota segundo a divisão que propôs (90% pelo histórico, 10% para novos players), esse comércio paralelo passará a ser marginal, ao passo que pela divisão européia (50% pelo histórico, 50% para novos players) ele será apenas reduzido, mas ainda influenciará a formação de preços.
Já foram distribuídas cotas de acordo com os termos da portaria da Camex, e a previsão é que passassem efetivamente a valer em 1º de outubro. Mas, como a UE não concordou, parou de conceder licenças no mês passado e o mesmo pode acontecer em novembro, caso as partes não cheguem a um acordo na reunião dos próximos dias. Como esse processo é trimestral, sem licenças o comércio é paralisado no trimestre seguinte.
"Se a UE não aceitar os nossos termos e não emitirem novas licenças em novembro, poderá ser acusada na OMC de romper acordo e fechar mercado", diz Lohbauer.
As sócias da Abef (Sadia, Perdigão e outras grandes exportadoras) respondem por 95% dos embarques de carne de frango do Brasil. A fatia total da UE nos embarques do país é de 17%, mas o bloco é referência.(Colaborou Assis Moreira, de Genebra)