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Entrevista

Grãos: "Vivemos um cenário preocupante", afirma presidente do Grupo Agroceres

Em entrevista, Fernando Pereira analisa o mercado de grãos após a quebra da safra norte-americana, fala sobre as tendências de abastecimento e preços do milho e soja em curto e médio prazos e avalia os impactos que essa nova conjuntura pode trazer à indústria mundial de carnes.

Grãos: "Vivemos um cenário preocupante", afirma presidente do Grupo Agroceres

Na entrevista a seguir o presidente do Grupo Agroceres, Fernando Pereira, analisa o mercado de grãos após a quebra da safra norte-americana, fala sobre as tendências de abastecimento e preços do milho e soja em curto e médio prazos, avalia os impactos dessa nova conjuntura na indústria mundial de carnes e comenta o que tipo de oportunidades a abertura do mercado japonês pode abrir para a suinocultura brasileira. Confira.  

Suinocultura Industrial – A quebra de safra nos EUA tem gerado muitas preocupações entre os produtores de suínos e aves. Que a análise o senhor faz em relação ao abastecimento e preço de milho e soja em curto e médio prazo? Os grãos se tornaram o grande desafio para o setor suinícola? 

Fernando Pereira – Vivemos um cenário realmente muito preocupante. Por conta da seca, a quebra na safra norte-americana de milho foi grande. E essa perda já está consolidada, não dá para recuperar mais. Ainda não se sabe o número exato, mas as estimativas apontam para uma perda equivalente a uma safra e meia brasileira, e isso é muita coisa. Não custa lembrar que os Estados Unidos respondem por 40% da produção mundial de milho. Em contrapartida, a produção brasileira de milho está se confirmando em níveis excelentes. Temos uma estimativa de produção superior a que tínhamos há pouco mais de um mês. 

SI – Estimuladas pela quebra da safra de milho nos Estados Unidos, as exportações brasileiras do grão tem avançado em ritmo acelerado. Como o senhor analisa esse movimento? Há risco de faltar milho no mercado interno? 

Fernando Pereira – Realmente tem muito milho brasileiro indo para o mercado externo. Simplesmente porque há muito comprador para o milho brasileiro. Diante desse quadro, os demandantes de milho, o produtor de suínos e aves no caso, têm que estar de olho nos volumes que o Brasil conseguirá exportar. Fala-se muito num volume de exportação de 14 milhões de toneladas, que é uma marca que a própria Conab [Companhia Nacional de Abastecimento] anunciou. Se exportarmos somente 14 milhões de toneladas o preço do milho aqui vai cair, porque temos muito mais do que isso para exportar. E tem comprador lá fora. 

SI – O senhor coloca em dúvida a capacidade de o Brasil exportar mais de 14 milhões de toneladas de milho? Se o mercado internacional está aquecido, porque não exportaríamos o volume previsto pela Conab? 

Fernando Pereira – Eventualmente por deficiência de nossa logística, que sabemos, pode não estar preparada para isso. Pode ser que não consigamos, essa resposta ainda não é muito clara, e se não conseguirmos nós temos esse cenário de leve baixa dos preços do cereal aqui no mercado interno. O outro cenário é de que sim, seguimos exportando muito milho, conseguimos elevar nossas exportações para o mercado externo e assim a pressão sobre os custos, mesmo existindo muito milho no Brasil, continuaria. 

SI – No caso da soja, além do preço do farelo estar muito alto, alguns especialistas alertam para uma eventual falta do produto no final da safra, de outubro em diante. Como o senhor vê essa questão? 

Fernando Pereira – Desde o início do ano, já estava confirmado um déficit muito grande de soja. Desde fevereiro/ março já se consolidava uma queda muito grande na produção brasileira, como também na produção da Argentina e Paraguai, por problema de seca, resultando em algo semelhante a 25 milhões de toneladas a menos nesses três países. Ao mesmo tempo com a confirmação da queda de produção de soja nos EUA, que não era esperada, a demanda cresceu. Então estamos com pouca soja e muita exportação de soja. Isto configura um cenário de alto risco ao ponto de haver a possibilidade de déficit de soja, fisicamente falando, no final deste ano até que entre a próxima safra. 

SI – A perspectiva é que os preços do milho e soja mantenham-se elevados neste e no próximo ano? 

Fernando Pereira – Não há dúvida de que os preços permanecerão bem acima de níveis históricos. A magnitude desses preços mais altos vai depender do comportamento da próxima safra brasileira, que é muito promissora. A intenção de plantio e a utilização de tecnologia, tanto nesta safra de verão como na segunda safra, que falávamos safrinha, mas é a principal safra no caso do milho, é excelente. Então devemos ter uma safra generosa, muito generosa eu diria, salvo algum problema climático. E aí nós podemos ter um arrefecimento desses preços para o próximo ano, ou seja, preços um pouco mais baixos do que os praticados neste ano. Mas tudo depende ainda da produção que vamos ter e do comportamento do mercado externo. 

SI – Diante desse cenário pouco animador, que estratégia o suinocultor deve adotar?  

Fernando Pereira – O produtor deve trabalhar com aquilo que está sob seu controle, ou seja, tem que aumentar a sua eficiência interna de produção. Voltamos à velha tônica. Ao mesmo tempo, o produtor tem que redobrar sua atenção ao movimento brasileiro de exportação de grãos. No caso do milho o produtor precisa ter atenção ao volume exportado. Ele precisa acompanhar isso de perto, muito atentamente, para ver que tendência esse mercado vai tomar lá na frente. Que tanto pode ser a manutenção de preços muito altos se exportarmos muito, como pode ser de queda de preços se não conseguirmos colocar para fora tudo o que podemos. Já no caso da soja não há muito o quê fazer, porque não há condições de estocar. Simplesmente porque não se consegue bons contratos em longo prazo. Então é uma situação que nos dá menos margem de manobra. Mas nos dois casos, num mercado altamente especulado, para quem tem condições, é fundamental evitar trabalhar “da mão para boca”. É preciso ter o mínimo de estoque, não estoque para ganhar dinheiro, mas para não estar suscetível à especulação excessiva do mercado. 

SI – O Japão reconheceu Santa Catarina como livre de febre aftosa sem vacinação e deve abrir o seu mercado para a carne suína brasileira. Como o senhor vê essa decisão? Que tipo de reflexos a abertura do mercado japonês trará ao setor? 

Fernando Pereira – O fato de o Japão ter aberto seu mercado para a carne suína brasileira é uma notícia boa, com possibilidade dessa oportunidade se converter num volume importante no médio prazo, não no curto prazo. Acredito em volumes pequenos no próximo ano, com um crescimento gradativo dos embarques. Nada muito expressivo. Entretanto, pelo que se desenha na produção mundial de carnes em geral, e isso inclui a carne suína, e aí está incluído os EUA, nosso principal concorrente, o mercado japonês pode ser uma oportunidade de exportação maior para o Brasil. Toda a produção mundial de carnes está sendo muito impactada pelos altos custos dos grãos. E aí o Brasil, apesar de todos os seus problemas, pode ter uma janela de oportunidade nesse cenário e aumentar de forma um pouco mais acelerada suas exportações de carne suína para outros mercados, inclusive para o Japão. Nesta atual conjuntura global, por ser grande produtor de grãos, o Brasil leva vantagem em relação aos demais países produtores de carne suína.