Os países da América Latina e do Caribe devem trabalhar juntos em estratégias de médio e longo prazo para reduzir a sua aguda dependência da importação de fertilizantes químicos – nisso concordaram os peritos convocados pelo Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA).
A atual crise de disponibilidade e preços de fertilizantes, que gerou graves desequilíbrios neste ano devido ao conflito bélico no Leste Europeu, mas que já se tinha manifestado em 2021, tem dado maior visibilidade a um tema que acarreta grave ameaça à segurança alimentar e à sustentabilidade ambiental da agricultura na região – concluíram os especialistas.
A questão foi debatida em um seminário na sede central do IICA, em São José da Costa Rica, e teve importante participação virtual. O propósito da atividade foi analisar o impacto da crise global dos fertilizantes e do seu custo para os Estados sobre consumidores e agricultores da América. Também foram analisados e avaliados possíveis caminhos para os países da região frente aos desafios colocados pelos cenários futuros.
Na ocasião, foi apresentado um trabalho de pesquisa encarregado pelo organismo de desenvolvimento agrícola hemisférico. Consistiu na elaboração de uma metodologia, simples e aplicável de imediato nos países da região, que permite analisar possíveis efeitos de medidas alternativas ou complementares para atenuar as condições vigentes nos preços de importação dos fertilizantes e a sua repercussão nos principais atores do sistema agroalimentar.
O seminário foi aberto pelo Diretor Geral do IICA, Manuel Otero, e a metodologia foi apresentada por Carlos Pomareda, Gerente Internacional de Serviços para o Desenvolvimento Empresarial (SIDESA).
Do debate participaram Diego Arias, Gerente para Agricultura e Alimentos do Banco Mundial na América Latina e no Caribe; Carolina Trivelli, Especialista em Desenvolvimento Rural e Pesquisadora do Instituto de Estudos Peruanos; e Hugo Chavarría, Gerente do Programa de Bioeconomia e Desenvolvimento Produtivo do IICA.
Além disso, Joaquin Arias, Especialista em Políticas e Análise Setorial Agrícola do IICA, disponibilizou, para fins de intercâmbio de conhecimentos sobre a questão, o Observatório de Políticas Públicas para os Sistemas Agroalimentares (OPSAa), uma ferramenta digital que o Instituto criou neste ano para ajudar os países a transitar por esse período de instabilidade.
“Os fertilizantes são o talão de Aquiles da agricultura do continente, o ponto mais vulnerável”, disse Manuel Otero.
“É um tema que escondíamos um pouco, mas que neste ano aflorou para os países do Mercosul, para os centro-americanos e para os da zona andina, que precisam responder às demandas de uma produção mais sustentável e enfrentam aumentos nos custos de produção. A situação é muito grave”, acrescentou.
Otero observou que o mercado dos fertilizantes tem uma oferta muito concentrada, em que os centros de produção em geral estão longe da América Latina e do Caribe, situação agravada devido aos custos de transporte e energia.
O IICA vem realizando diversas ações para abordar o problema dos fertilizantes e busca levar aos ministros da agricultura de seus países membros informações concretas e claras sobre qual é o impacto da crise e quais são os cenários alternativos.
Do Banco Mundial, Diego Arias indicou que “o trabalho realizado pelo IICA agrega valor e conhecimento à discussão, porque não conhecemos tanto do mercado de fertilizantes e do impacto dessa volatilidade de preços na segurança alimentar. A pesquisa sobre os fertilizantes sempre esteve muito relacionada ao impacto dos subsídios, mas não ao mercado em si”.
E acrescentou: “No Banco Mundial, estamos tentando fazer um monitoramento do mercado de fertilizantes na região. Faltam informações e, na América Central, por exemplo, é grande a diferença de preços dentro dos próprios países. Podemos unir esforços com o IICA para promover maior transparência nos mercados”.
Pomareda deu detalhes do trabalho de pesquisa realizado sobre a situação do mercado de fertilizantes no Peru, com a contribuição de técnicos, empresários e produtores.
“Em 2021, já se viam aumentos nos preços dos fertilizantes, mas os valores dispararam a partir de fevereiro com a invasão russa da Ucrânia. Em seguida, desde julho, a Rússia e a Ucrânia chegaram a um acordo para reiniciar as exportações e os preços têm tendido a baixar”, disse Pomareda, que explicou que o maior desafio é a disponibilidade de ureia para cultivos como arroz e cana-de-açúcar, uma vez que em outros casos os agricultores tiveram menos obstáculos para encontrar soluções.
Chavarría, por seu lado, referiu-se à importância de que os governos disponham de ferramentas idôneas para elaborar e executar políticas públicas e à necessidade de se pensar em uma estratégia de longo prazo para fertilizantes na América Latina e no Caribe.
Ele também falou do crescente interesse despertado pelos bioinsumos na região. “Os países da região”, observou, “estão tentando fomentar o uso desses produtos, que não pretendem substituir o pacote tecnológico atual, mas complementá-lo, para aumentar a eficiência e a sustentabilidade ambiental da agricultura”.