O Brasil decidiu abrir amanhã uma reclamação formal na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra a demora da África do Sul em reabrir seu mercado para as exportações nacionais de carne suína. A notificação, chamada “Specific Trade Concern”, será levada ao plenário do Acordo sobre Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (SPS, na sigla em inglês) da OMC, segundo apurou o Valor.
O objetivo da medida é questionar a África do Sul, em uma rodada multilateral, sobre o que o Brasil considera desrespeito na aplicação de regras internacionais de comércio. Os princípios científicos adotados pelo SPS proíbem o fechamento de mercados quando não ficam caracterizados riscos sanitários para a importação de determinado produto – no caso, a carne suína brasileira. Em conversas informais, a delegação sul-africana presente em Genebra teria reconhecido, segundo fontes, que há um equívoco em vincular a elevação das vendas de vinho sul-africano à reabertura do mercado local para a carne suína brasileira.
A notificação formal é o primeiro passo para a abertura de consultas formais bilaterais com a África do Sul na OMC. Em seguida, o Brasil pode pedir a abertura de um comitê de arbitragem (“panel”) para forçar a reabertura do mercado sul-africano.
A África do Sul é o único país a manter a proibição à entrada do produto, decretada ainda em 2005, após a descoberta de focos de febre aftosa em Mato Grosso do Sul e no Paraná. Desde então, todos os países reabriram suas fronteiras às carnes brasileiras, menos a África do Sul.
Em Pretória, a capital administrativa sul-africana, o ministro do Comércio, Rob Davies, disse ao ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, que o objetivo é trocar vinho pela carne suína. “Swine for wine”, definiu, em inglês, seu propósito. Ele vinculou a reabertura ao suíno à negociação, por uma missão sul-africana, para a derrubada de exigências da Receita Federal e do Ministério da Agricultura. As principais são um selo da Receita Federal e o teste para a presença da substância “malvidina” imposto pelo Ministério da Agricultura. Os sul-africanos estariam dispostos a reabrir seu mercado apenas depois de seis meses. O Itamaraty e o Ministério da Agricultura consideram inadmissível o adiamento imposto de forma unilateral pelas África do Sul.
Mas é justamente esse ponto que o Brasil questionará no SPS amanhã. A África do Sul não pode, segundo os especialistas barsileiros, utilizar uma barreira sanitária contra uma alegada barreira técnica aplicada pelo Brasil. “É inaceitável confundir política com questão técnica”, disse uma fonte do governo. As regras brasileiras do selo e do teste da “malvidina” valem inclusive para os produtores locais. “Há risco zero na importação de suínos. A abertura tem que ser imediata. O Brasil quer o reconhecimento agora”, disse a fonte.
E há um agravante. Os sul-africanos haviam concordado, ainda em junho, em reabrir seu mercado. O próprio Rob Davies garantiu que levantaria a barreira antes da visita da presidente Dilma Rousseff, que esteve por dois dias em Pretória para participar com o colega sul-africano Jacob Zuma de uma reunião do grupo político Ibas (Índia, Brasi e África do Sul). “Mas não ocorreu nada, e agora ele ainda quer seis meses”, afirma a fonte oficial.
Em junho, o Brasil ofereceu dispensar o teste de “malvidina” e até acelerar a liberação dos vinhos sul-africanos no porto, mas insistiu em manter as exigências do selo da Receita e da rotulagem dos vinhos em português.