Após amargar um aumento anual médio de 10% nos preços dos alimentos nos últimos cinco anos, o governo decidiu que é hora de agir com uma política forte de abastecimento.
Na semana passada, a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, convocou os representantes do Ministério da Agricultura e da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para uma reunião com o objetivo de pôr em prática a estratégia de vender estoques públicos de grãos para conter a inflação dos alimentos – apontada pelo governo como um dos principais fatores para a elevação de 5,84% no IPCA em 2012.
Gleisi foi avisada, porém, que a Conab não tem estoques suficientes para levar a ideia adiante, apesar do crescimento contínuo da produção de grãos nos últimos anos. Hoje, a estatal praticamente não tem milho e feijão em seus armazéns e conta com apenas 756 mil de toneladas de arroz, o suficiente para um mês de consumo. O efeito da venda desse volume de arroz sobre os preços no varejo seria inócuo, já que a safra está sendo colhida e as cotações tendem a cair naturalmente nos próximos 45 dias.
Diante da impossibilidade de vender estoques públicos, o governo começou uma ofensiva para coordenar as expectativas do mercado. Na segunda-feira, em discurso a produtores rurais no Paraná, a presidente Dilma Rousseff enfatizou que não faltará crédito para a agricultura brasileira neste ano. “Se gastarem o dinheiro, terá mais. O que gastarem, nós cobrimos. Estamos oferecendo 115 aqui, 18 ali, tudo bilhão “, disse ela, durante o Show Rural, evento promovido pela cooperativa Coopavel.
Ontem, também em entrevista a uma emissora de rádio do Paraná, a presidente disse que o governo está estudando desonerar integralmente a cesta básica dos tributos federais. À tarde, o ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro, declarou que a safra 2012/13 de grãos, até então estimada pela Conab em 180 milhões de toneladas, deve alcançar 185 milhões. Um conjunto de notícias que acalmaria os preços e, portanto, as expectativas de inflação.
A Conab só tem autorização legal para adquirir produtos no mercado quando as cotações estão mais baixas do que as fixadas pela Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM). O Ministério da Agricultura compra os excedentes ou financia a estocagem, sempre que o preço de mercado cai abaixo do mínimo. Para aquisições acima desse valor, é necessária autorização por Medida Provisória (MP).
No mês passado, governo editou a MP 603, que autoriza, em caráter excepcional, neste ano, a aquisição de até 300 mil toneladas de milho em grão, ao preço de mercado, por meio de leilões, para recompor os estoques públicos.
O objetivo dessa MP é o de ofertar milho diretamente para pequenos criadores de aves, suínos, bovinos, caprinos e ovinos sediados nos municípios da área de atuação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), por causa da longa estiagem. A ajuda, porém, não deve sair do papel devido à proximidade da colheita de milho.
Com a alta dos preços das principais commodities agrícolas nos últimos anos, os gastos do governo para manter os valores mínimos vêm caindo. Para aquisições por meio da PGPM, o governo chegou a gastar R$ 3,1 bilhões em 2009. Em 2012, ano de alta nas commodities, a despesa foi bem menor, de R$ 568 milhões. Em 2013, o ministério estima que um gasto ainda mais modesto, abaixo de R$ 300 milhões.
A carência de estoques não é culpa apenas dos preços altos. Na avaliação da Presidência da República, o Ministério da Agricultura não agiu no momento adequado nas aquisições. No início de 2012, a Conab recomendou ao ministério a compra de milho para formação de estoque, o que não foi feito. A pasta não considerou que haveria gargalos de abastecimento no ano, devido à safra recorde de milho, que foi de 72,9 milhões de toneladas.
Agora, no curto prazo, não há condições de reforçar os estoques de grãos. Por isso, a Conab decidiu que vai aumentar o preço mínimo do feijão e da farinha de mandioca para incentivar o plantio dessas culturas. O feijão perdeu área no Paraná para a cana-de-açúcar, e a seca no Nordeste está prejudicando a produção tanto do grão quanto da mandioca.
Na reunião da semana passada, a ministra-chefe da Casa Civil perguntou para os representantes do ministério da Agricultura por que a Conab não vendeu arroz em dezembro, quando o preço estava subindo.
A resposta foi que o ministério havia decidido suspender um dos leilões marcados para janeiro, contra a recomendação da Conab, atendendo a um pedido de deputados da bancada ruralista e da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), que temiam uma desvalorização do produto.
Não foi o que aconteceu. A saca de 50 quilos custa atualmente R$ 50,86 em Mato Grosso, longe do preço mínimo – R$ 28,23. No Rio Grande do Sul, o valor está em R$ 33,45, com o preço mínimo a R$ 25,28. O cereal subiu 36,6% em 2012.
A alta do arroz, porém, não é o problema que mais preocupa o governo. O feijão carioca, variedade mais consumida no país, registrou aumento de 31,53% no ano passado. O feijão preto, segundo mais consumido, subiu 44,20%. Ao contrário do arroz, que deve cair nos próximos meses, o feijão trilha o caminho contrário e, para piorar, os estoques são irrisórios. A Conab não comprou feijão em 2012, pois o produto já estava acima do preço mínimo devido à estiagem que atingiu o Sul e Nordeste do país.