A falta de investimentos destinados à infraestrutura prejudica como nunca o negócio agropecuário – cujo desenvolvimento está atrelado a meios de transporte e armazenagem -, de tal modo que empresários do campo passaram a assumir projetos nessa área. O problema logístico, que se intensificou na década passada com a expansão da economia rural, foi debatido nesta semana, em São Paulo, por representantes do setor.
Graças ao boom das commodities, as exportações brasileiras de mercadorias básicas cresceram 132,8% nos últimos dez anos, sendo que o agronegócio foi responsável por 35% do superávit comercial, de acordo com a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). “E o que aconteceu com os portos nesses dez anos? Nada”, afirmou o presidente da entidade, José Augusto de Castro.
O mar é a principal via de exportação dos produtos brasileiros: pelas vias marítimas se exportam aproximadamente 90% do volume total, segundo Castro. “Nós deveríamos ter os melhores portos do mundo”, disse ele, durante um evento promovido pela Fundação Getulio Vargas (FGV) em São Paulo.
Outro participante do encontro, o vice-presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), José Ramos Torres de Melo, pontuou que a falta de infraestrutura para o transporte e a armazenagem de mercadorias agrícolas provoca “um abortamento da produção” no País. Isto é, por falta de meios para escoar ou estocar os frutos da safra, regiões inteiras produzem menos do que poderiam.
Mais uma consequência da falta de equipamentos públicos (ou da falta de investimento) é o custo do frete, que aumentou 204% no Brasil entre 2003 e 2008, segundo a CNA. “O Brasil, hoje, exporta frete”, frisou Castro. O valor médio subiu de US$ 28, há nove anos, para mais de US$ 100 na safra atual. “Quanto maior a distância do porto, maior o preço do frete e menor a produtividade”, destacou Melo.
A causa do déficit logístico, segundo os representantes: pura e simples falta de investimento público – o governo federal investe menos de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) nesse campo. “O investimento do Brasil está abaixo da média mundial. Abaixo da média mundial… é muito triste!”, lamentou Torres de Melo.
O professor e consultor de Logística em Transportes Hermann Gonçalves Marx, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), apresentou alguns números de 2008 durante o seminário da FGV. Naquele ano, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) empenhou orçamento de R$ 700 milhões em hidrovias, R$ 7,9 bilhões em ferrovias e R$ 33 bilhões em rodovias. Mas os valores adequados para esses modais seriam de R$ 15 bilhões, R$ 86 bilhões e R$ 93 bilhões, respectivamente, de acordo com análises técnicas da Confederação Nacional do Transporte (CNT).
“A necessidade de investimento, para manter o status logístico atual, é de no mínimo 3% do PIB ao ano. O Brasil investe menos do que isso, então, presume-se que a infraestrutura seja anualmente degradada”, analisou Hermann. Em consequência, a iniciativa privada investe o equivalente a 20% do PIB nesse campo. “No Brasil, para ser competitiva, uma empresa tem que lucrar duas vezes”, afirmou o professor.
Ação privada – O investimento das companhias agropecuárias em projetos de infraestrutura ficou patente neste ano, com, por exemplo, a entrada da Cosan Alimentos na empresa de transportes América Latina Logística (com participação de cerca de 5%) e a inauguração de um terminal intermodal, em Ribeirão Preto, pela Copersucar.
“As empresas estão procurando mudar de condição. Antes, as da área sucroalcooleira não investiam em logística”, observou Melo. “A iniciativa privada tem uma série de projetos em infraestrutura, mas há muitas limitações. O governo tem de participar”, acrescentou.