Os entraves logísticos que dificultam o escoamento da safra de grãos do Brasil começam a ter reflexos sobre as negociações com soja do país. Em entrevista ontem à agência Reuters, um gerente da divisão de soja da Sunrise, a maior trading da commodity da China, afirmou que a empresa poderá cancelar a compra de quase 2 milhões de toneladas do produto brasileiro em razão do atraso nos embarques provocados por congestionamentos nos portos.
Ao Valor Pro, serviço de informações em tempo real do Valor, Stefan Tomkiw, analista do Jefferies Bache, em Nova York, afirmou que no mercado especula-se que apenas dois dos 12 navios que a Sunrise teria contratado do Brasil, com entregas entre janeiro e fevereiro, foram efetivamente entregues. “Para os chineses, teria havido uma quebra de contrato, já que o prazo não foi respeitado, e eles estão colocando pressão para que o vendedor respeite as entregas programadas de abril em diante. Agora, eles devem estar renegociando prazos de entrega”, disse.
Tomkiw afirmou, ainda, que circulam notícias até de que poderia haver mais cancelamentos por parte da Sunrise. “Só que não existe uma confirmação oficial, porque, diferentemente dos Estados Unidos, o Brasil não tem um sistema que divulgue esse tipo de cancelamento”. Eventuais cancelamentos, se confirmados, podem “transferir” a demanda de volta aos EUA, onde os estoques já estão enxutos e também há dificuldades para encontrar navios disponíveis.
Steve Cachia, analista da Cerealpar, lembrou que os chineses não têm onde comprar soja neste momento, já que os EUA têm pouco grão disponível e o foco da Argentina está em farelo e óleo, não no grão. O analista também acredita que a especulação sobre possíveis cancelamentos podem ser uma estratégia dos importadores para comprar a soja a preços menores. “Agora que os preços caíram (na bolsa de Chicago), eles podem querer recomprar em níveis melhores”, afirmou Cachia.
Daniel D’Ávila, da corretora Newedge USA, ressalta que cancelamentos são comuns nessa época do ano, mas que 2 milhões de toneladas é um volume muito expressivo. “Alguns de nossos clientes dizem que é mentira”, afirmou ele ao Valor Pro. No primeiro bimestre deste ano, as exportações brasileiras de soja em grão para todos os destinos somaram 2,3 milhões de toneladas, 52,2% a menos que em igual período de 2012.
Ontem, a fila para carregar soja nos portos brasileiros chegou a 203 navios, segundo informações da agência marítima SA Commodities reproduzidas pela agência Dow Jones Newswires. Trata-se de um aumento expressivo em relação ao mesmo período de 2012, quando 123 embarcações esperavam pelo carregamento. Do total, 50 navios aguardavam para atracar em Santos (SP) e outros 70 no porto de Paranaguá (PR).
A notícia sobre o possível cancelamento por parte dos chineses não teve influência significativa sobre os preços da soja na bolsa de Chicago ontem. Os contratos com vencimento em julho (que ocupam a segunda posição de entrega, normalmente a de maior liquidez) fecharam com uma retração marginal de 0,46%, a US$ 13,88 por bushel.