A capacidade de escoamento de grãos do Brasil chegou muito perto do limite e pode impor barreiras à expansão da produção, caso os investimentos em novas rotas de saída não se tornem realidade nos próximos anos. Segundo lideranças e empresas ligadas ao setor rural reunidos ontem em São Paulo em evento promovido pela Agroconsult, as dificuldades para embarcar soja e milho nos portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR) já surtem efeito sobre a comercialização da safra 2012/13.
“Até agora, a logística deficiente sempre significou um custo ao produtor brasileiro. A partir de agora, é uma restrição real ao crescimento”, afirma André Pessôa, sócio-diretor da Agroconsult. Esse esgotamento ocorreu em razão da colheita recorde deste ano. Segundo a consultoria, o Brasil colherá 84,4 milhões de toneladas de soja nesta safra 2012/13, 27,1% mais que em 2011/12. Segundo Pessôa, o desempenho foi assegurado pela recuperação da produção no Sul, região castigada pela seca no ciclo passado. O país deverá colher, ainda, 36,7 milhões de toneladas de milho nesta safra de verão e volume semelhante na colheita de junho.
Segundo Pessôa, a demanda internacional abre espaço para que o Brasil eleve a produção de soja em 50% nos próximos 10 anos, o que significa um acréscimo de cerca de 40 milhões de toneladas à produção atual. Já a produção de milho deverá alcançar 100 milhões de toneladas, ante pouco mais de 73 milhões em 2012/13. “Já ultrapassamos 90% de utilização da nossa capacidade e não dá mais para estressar a logística”.
Segundo o consultor, a dificuldade de escoar a produção de 2012/13 pode ter efeitos negativos sobre o preço da soja brasileira na segunda metade do ano. O risco, explica, é o Brasil exportar menos soja do que poderia no primeiro semestre, um período de oferta escassa nos EUA (que começam a colher sua safra apenas em agosto). “Se carregar estoques elevados para o fim do ano, o Brasil enfrentará a concorrência da safra americana, o que dá mais poder de barganha aos compradores”.
Pessôa diz, ainda, que muitas tradings tiveram de arcar com custos de frete muito superiores aos que previam quando fecharam a compra da atual safra brasileira. “Para o produtor, a conta será paga no ano que vem, quando for vender a sua safra”. Segundo o consultor, as incertezas em relação à logística podem, inclusive, reduzir a comercialização antecipada da safra brasileira.
De acordo com Aurélio Pavinato, diretor-presidente da SLC Agrícola, uma das maiores produtoras de soja do país, a empresa já decidiu reduzir o ritmo de vendas nos próximos meses à espera de uma redução nos custos de frete, que nesta temporada subiram mais de 40% em Mato Grosso. “Já vendemos aproximadamente 62% da nossa produção, mas a tendência agora é esperar o segundo semestre para comercializar o resto”.
O executivo acredita, porém, que o Brasil deve destravar as novas rotas de escoamento da produção nos próximos anos. “Chegamos ao limite. A complementação da BR-163 está avançando, e a nova Lei dos Portos deve destravar a construção de terminais privados na Região Norte”, afirma. A pavimentação da BR-163 no Pará viabiliza o escoamento da produção de Mato Grosso pelo porto de Santarém (PA) e outros portos fluviais da Bacia Amazônica.
Segundo Eraí Maggi Scheffer, da Sementes Bom Futuro (maior produtor de soja do país), algumas obras pontuais e de custo relativamente baixo podem aliviar a pressão sobre os portos de Santos e Paranaguá. Entre as obras, ele destaca a pavimentação da BR-080 no trecho de 180 quilômetros entre Ribeirão Cascalheira (MT) e Luís Alves (GO), por onde passa a ferrovia Norte-Sul, que dá acesso ao Porto de Itaqui (MA).
“Perco todos os anos R$ 30 milhões por não poder utilizar esse trecho. É uma obra que poderíamos fazer e que se pagaria em poucos meses, e por onde poderíamos escoar 3 milhões ou 4 milhões de toneladas, mas está parada há anos à espera das licenças ambientais”. Para o produtor, a concessão de licenças é o maior entrave aos investimentos em logística no país. “O problema no Brasil não é, nunca foi dinheiro. É burocrático, normativo. O governo não tem força para fazer as coisas andarem”.
O megaprodutor afirmou, ainda, que as obras de pavimentação da BR-163, que liga Mato Grosso ao Porto de Santarém, estão de fato avançadas. “Para mim, deixou de ser um problema. A questão agora são as dificuldades para destravar os investimentos em Santarém”.