Foi a súbita interrupção das linhas de crédito às exportações no Brasil, especialmente no chamado Adiantamento de Contratos de Câmbio (ACC), concedido aos fabricantes antes do embarque, um dos principais canais de transmissão da crise em 2008 à indústria brasileira. Agora, com a repentina alta do dólar e os sinais de deterioração da economia internacional, esse canal voltou a ser “o mais preocupante”, segundo estudo concluído na semana passada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que representa o principal parque industrial do país.
Em uma semana, entre 16 e 23 de setembro, o real desvalorizou-se 11%, muito acima da média de uma cesta de 14 das moedas mais relevantes, que se desvalorizou em 5%, e abaixo apenas do rand sul-africano, que teve queda de 14%. A enorme volatilidade da moeda já tem o efeito negativo, no curto prazo, de levar os empresários a reavaliarem seus projetos de investimento e planos de produção. Ainda que um real menos valorizado em relação ao dólar seja desejo confesso de boa parte do setor privado, a impossibilidade de prever uma trajetória para a taxa de câmbio pode até paralisar esses planos e projetos, apontam os especialistas.
Para os economistas da Fiesp, essa grande volatilidade, que apareceu também na crise de 2008, reforça o argumento de que a sobrevalorização da moeda brasileira era impulsionada pelo movimento especulativo dos mercados financeiros. Com a queda na taxa de juros e as medidas de desestímulo à especulação, como o aumento do IOF, a desvalorização foi imediata.
Para a indústria, BC e BNDES devem ficar prontos para reagir
O levantamento da Fiesp mostra que, entre as principais commodities exportadas pelo Brasil, o algodão e o açúcar não conseguiram compensar, com a valorização do dólar, as quedas de preços, de 11,7% e 13%, respectivamente. Para as duas principais commodities de exportação brasileiras, foi menor que a desvalorização do dólar a redução nas cotações na semana passada – de 5,6% no caso da soja e de 1,2% no minério de ferro.
É preciso confirmar, porém, as tendências, tanto dos preços internacionais quanto do câmbio, para avaliar o real impacto dessa movimentação de cotações acelerada na semana passada. Obrigado a manter os olhos no efeito da variação do dólar sobre a inflação, internamente, e sobre as contas externas do país, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, avisou, na sexta-feira, que o BC intervirá não só no caso de excessiva desvalorização do real, mas também no caso de interrupção das linhas de crédito.
Preocupados, os executivos da indústria monitoram o comportamento dessas linhas, que, na avaliação da Fiesp, moderaram o ritmo de oferta em setembro, quando não houve crescimento diário dos desembolsos de ACC em relação a agosto. Ainda não é um desempenho alarmante: o valor do volume diário de ACC é o segundo maior do ano.
Os bancos da União Europeia, nos quais se concentra a piora de expectativas, representam 15% do total de ativos bancários do Brasil e 76% do total dos ativos de bancos estrangeiros no mercado brasileiro, lembram os técnicos da Fiesp. Embora seja recomendável acompanhar o desempenho dessas instituições de perto, não se pode avaliar ainda a influencia que terão na disponibilidade de crédito. O agravamento da crise tende a interromper linhas, reduzir prazos de pagamento e elevar custo de capital, mas é possível que exportadores já estejam trocando o crédito obtido nesses bancos por outros, de outros países.
Tombini, na sexta-feira, procurou tranquilizar o público, garantindo que os fluxos de dólares para a economia brasileira continuam “robustos”, sem redução na disponibilidade de linhas de financiamento à exportação.
A Fiesp não chegou a analisar, ainda, a repercussão do aumento de preços dos importados sobre as cadeias produtivas das empresas instaladas no país – inclusive exportadoras, que, nos últimos anos, vinham substituindo progressivamente fornecedores nacionais por estrangeiros. Possivelmente porque, assim como os fornecedores no país perderam competitividade com o real forte, a desvalorização da moeda nacional pode compensar, gradualmente, esse primeiro impacto negativo.
Mas a falta de crédito, nesse momento, já exige atenção da equipe econômica. Para os economistas da indústria paulista, o Banco Central e o BNDES devem estar atentos para evitar o erro de 2008 e agir rápido em caso de corte nas linhas de financiamento, leiloando reservas cambiais ou ampliando as linhas do BNDES-Exim.