O secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Timothy Geithner, vai discutir com o governo brasileiro formas de ressuscitar as negociações da Rodada Doha de liberalização comercial e também reafirmar interesses comuns dos dois países para lidar com a subvalorização da moeda chinesa, em visita que faz a Brasília e São Paulo na próxima segunda-feira.
“Os dois países têm interesse em dar prosseguimento às discussões de Doha”, disse ao Valor um funcionário do Tesouro, sem apontar nenhum caminho concreto. Segundo essa fonte, a Rodada Doha certamente fará parte da agenda econômica da visita do presidente americano, Barack Obama, ao Brasil em março. As negociações estão emperradas desde 2008, devido sobretudo à resistência de economias avançadas em cortar subsídios agrícolas.
Os EUA afirmam ter interesses comuns com o Brasil em relação à subvalorização da moeda chinesa, porque os dois países mantêm regimes de câmbio flutuante. ” “É importante que grandes economias emergentes também permitam que suas taxas de câmbio respondam às forças de mercado”, afirmou o funcionário do Tesouro.
No governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a equipe econômica manteve posição ambígua em relação à manipulação da moeda chinesa, apontando a política monetária expansionista dos EUA como o principal motor da valorização do real, ao alimentar fortes fluxos de capitais estrangeiros ao país. A presidente Dilma Rousseff, porém, tem indicado que adotará uma postura mais dura em relação à China.
No ano passado, o déficit comercial do Brasil com os EUA subiu de US$ 4,5 bilhões para US$ 8 bilhões, o que significa que boa parte do ajuste externo americano recente está recaindo sobre a economia brasileira.
Na visão dos EUA, porém, o desequilíbrio comercial entre as duas economias ocorre porque os consumidores americanos estão mais retraídos e reduzindo dívidas, enquanto países emergentes, como a China, continuam baseando o crescimento na demanda externa.
Se países como a China não estimularem a demanda doméstica nem deixarem o câmbio se valorizar, economias com regime cambial mais flexível, como o Brasil, vão arcar com uma parcela maior do ajuste feito pelos consumidores americanos. “De novo, é uma história em que Brasil e EUA têm interesses comuns, não divergentes.”
Para o funcionário do Tesouro americano, o que realmente está por trás dos fortes fluxos de capitais estrangeiros ao Brasil não é a expansão monetária feita pelo Federal Reserve, mas sim o ritmo mais forte de recuperação econômica no Brasil do que nos EUA. “Temos que trabalhar juntos para administrar as diferentes velocidades de recuperação econômica”, afirmou.
Nas reuniões em Brasília, Geithner deverá também se mostrar um aliado do Brasil contra eventuais mudanças no mercado mundial de commodities. A França, país que coordena os trabalhos do G-20, defendeu uma regulação nos mercados futuros de commodities para evitar altas exageradas de preços, que têm levado as cotações aos maiores patamares em décadas. O Brasil, como grande exportador de alimentos e outras commodities, é contra mexer nas regras do jogo.
“Certamente é preciso melhorar a transparência dos preços e assegurar que esse mercado seja o mais sólido possível”, afirmou o funcionário do Tesouro. “Mas acho que temos muita coisa em comum com o Brasil, pois ambos os países têm demonstrado o interesse de ter os preços das commodities determinados pelo mercado.”