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Código Florestal

Novo Código Florestal: um retrocesso?

Editorial do jornal Valor Econômico afirma que projeto para o novo Código Florestal é um retrocesso.

Novo Código Florestal: um retrocesso?

O diagnóstico que deu origem ao projeto de Código Florestal está recheado de equívocos e as soluções propostas, que serão encaminhadas em breve ao Congresso, deixam o Brasil a descoberto na proteção ao ambiente. Sob o pretexto, em parte justo, de que o velho Código foi desfigurado por acréscimos e tornou-se inaplicável, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) faz várias coisas erradas ao mesmo tempo. Seu projeto reduz drasticamente as exigências de reserva legal e de preservação de encostas, morros e várzeas, as áreas de preservação permanente (APPs), entrega aos Estados boa parte do poder de legislar sobre ambiente, elimina a exigência de áreas de conservação em propriedades de até quatro módulos fiscais – segundo o Incra, 90% dos 5,2 milhões de imóveis rurais – e caminha em direção a uma anistia ampla e irrestrita para os desmatadores.

As premissas de Rebelo são ruins. “O equilíbrio existente hoje é uma legislação criada pelas ONGs que inviabiliza a agricultura do País completamente”, diz. (Valor, 17 de maio). A consequência, para ele, é que as ONGs a serviço de interesses estrangeiros querem congelar, com as leis ambientais, as fronteiras agrícolas e impedir o Brasil de manter sua competitividade nos mercados internacionais. A legislação não inviabilizou a agricultura e a prova é o sucesso do Brasil tanto em prover alimentos baratos para sua população como a força de suas exportações, as maiores do mundo de suco de laranja, carne bovina e de frango, café, açúcar e as segundas maiores de soja. Depois, há terras disponíveis suficientes para se elevar a produção agrícola sem que seja necessário devastar a Amazônia.

A verdade está em outro lugar. O Código Florestal é abertamente desrespeitado e o desmatamento no Brasil, especialmente na Amazônia, é escandaloso. Com a atual legislação, sumiram 870 mil km2 de vegetação nativa nas APPs, que deveriam ser preservados, segundo cálculos do professor Gerd Sparovek, da USP (“O Estado de S. Paulo”, 9 de junho). A comissão especial que prepara o novo Código tem um cálculo maior, de 960 mil km2. Quando o relator diz que não aceita que “agricultores sejam acusados de inimigos do meio ambiente”, pode-se concluir que ele está certo e que são fantasmas os responsáveis por tanta devastação. Ou que está errado, já que há agricultores e agricultores, e que se a sede de lucro não for detida pela consciência, preceitos legais claros e punições tempestivas, o Brasil se transformará em um deserto.

O objetivo do novo Código, pela proposta do relator, é claramente diluir as exigências legais de proteção e garantir que o passado seja apagado e os responsáveis por desmatamento ilegal, anistiados. Para supostamente enfrentar o caos do Código, mas ampliando-o ainda mais, Aldo Rebelo dá mais poderes aos Estados para legislar, inclusive sobre APPs e reservas legais. Biomas e bacias hidrográficas são por natureza distintos da divisão política do país em Estado e se localizam em vários deles. É preciso uma legislação federal que dê os parâmetros pelos quais os Estados atuarão na questão. Estados, por outro lado, são mais suscetíveis aos interesses econômicos dos grandes agricultores e o resultado será de terra arrasada, especialmente nas regiões de fronteira agrícola, se os órgãos estaduais passarem a dar as cartas na questão ambiental. O exemplo da quadrilha sob investigação no Mato Grosso, que envolve do ex-secretário do Meio Ambiente ao chefe do gabinete do governo, passando pela mulher e o genro do presidente da Assembleia Legislativa, acusados de falsificar documentos para legalizar madeira retirada ilegalmente, é o exemplo mais recente de uma série que parece não ter fim.

A questão central é que as atividades agrícolas sem controle destroem o ambiente, independentemente da boa ou má vontade do agricultor. A proteção ambiental exige consciência social de quem produz no campo, não só porque é uma garantia para a continuidade de suas atividades como também porque as consequências da devastação afetam de várias formas toda a sociedade. A legislação atual precisa ser aperfeiçoada, não destroçada. Que uma legislação dessa importância vá a discussão em período eleitoral, em que o governo precisa de apoio de todos os partidos para eleger sua candidata à Presidência, dá uma boa ideia de sua finalidade – atender aos velhos anseios da bancada ruralista. Se passar, será um retrocesso irreversível.