Redação (02/03/2009)- Anunciada pelo governo como a principal medida para disseminar o uso de seguro no setor rural no país, a criação de um fundo de reembolso a seguradoras e resseguradoras em situações de catástrofes terá que ser reavaliada pelo governo antes mesmo de passar pelo crivo do Congresso Nacional. O projeto de lei do novo fundo, enviado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em maio de 2008, esbarra em fortes divergências entre as empresas sobre a formação de um consórcio único para gerir os recursos do mecanismo de ressarcimento.
O fundo, esperado há décadas pelo setor, deve baixar o custo das apólices ao produtor porque divide riscos e estimula mais seguradoras a entrar no negócio. Hoje, só sete empresas operam no segmento rural. Em conversas informais, as empresas têm dito ao governo temer um eventual conflito de interesses na administração do fundo, já que são concorrentes e têm diferentes estratégias, nichos de mercado e formas de atuação. Além disso, poderia haver a "mistura dos riscos" de perfis diferentes de produtores. Por trás disso, há uma desconfiança mútua entre as companhias em relação à necessidade de capitalização igualitária do fundo.
Dirigentes de seguradoras e resseguradoras pediram a formação de vários consórcios, mas o governo rejeitou a proposta. "Tem que respeitar as características de cada empresa", resume o diretor técnico da seguradora Aliança do Brasil e presidente da comissão de seguros da Fenaseg, Wady Mourão Cury. Nesta semana, a Câmara dos Deputados deve voltar a debater o tema com representantes do governo e das empresas.
O relator do projeto, deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR), questiona outro ponto fundamental: o conceito de catástrofe. "Temos que discutir com o governo uma posição sobre alguns aspectos do projeto", diz. "A definição do conceito de catástrofe é uma delas. O país tem dimensões continentais e os fenômenos e a intensidade deles varia muito em cada região". Micheletto quer realizar quatro audiências públicas sobre o tema em Cascavel (PR), Chapecó (SC), São Borja (RS) e Campo Grande (MS).
Pelo projeto de lei, o fundo teria subvenção anual da União e recursos do consórcio para bancar parte do prêmio das apólices. O PL prevê, ainda, a garantia da União sob forma de emissão de títulos do Tesouro Nacional e a cobertura suplementar para hipóteses de catástrofes.
O governo admite a urgência das alterações. "É preciso definir quem gere o fundo e onde ficará depositado esse dinheiro", diz o diretor de Gestão de Risco Rural do Ministério da Agricultura, Welington Soares de Almeida. Ele reconhece que as empresas têm despesas operacionais elevadas e riscos altos. "As empresas precisam saber que têm um limite percentual para prejuízos e, com umas não confiam na subscrição das outras, vamos mudar o projeto para viabilizar a estrutura", afirma ele.
As seguradoras também reclamam da exigência de contribuição de todas as operações de seguro rural, inclusive no seguro-penhor para financiamento de máquinas, sem o devido benefício fiscal. "Há problemas de tributação que precisam ser revistos", diz Wady Cury. O governo concorda. "Não estão mesmo claros o benefício e a exigência", afirma Welington Almeida.
Nas discussões sobre as alternativas, o governo não descarta mudar o atual Fundo de Estabilidade do Seguro Rural (FESR), criado em 1966. O mecanismo sofre com dificuldades de acesso a recursos do Orçamento da União, o que gera desconfiança no mercado porque o produtor só recebe a indenização após aprovação de um projeto de lei do Congresso. As resseguradoras fica com 90% do risco. Por isso, rejeitam o fundo. O IRB Brasil Resseguros ainda administra esse FESR. Todo ano tem que fazer previsão orçamentária para o Congresso aprovar. "Se tem R$ 5 milhões e dá um gasto de R$ 6 milhões, ele pode remanejar até 10%, mas a diferença precisa ser coberta pelo Tesouro", diz o diretor do ministério.
O projeto acaba com o FESR, que teria que dar estabilidade à carteira das seguradoras e fomentar operações de seguro. A demanda depende da subvenção ao prêmio, caro e incompatível com a renda do produtor. "A oferta depende de um fundo. Precisa de desembolso tempestivo na hora da demanda. Enquanto estiver com a União, não há condições", diz Welington Almeida. O FESR tem R$ 500 milhões em recursos, mas orçamento de R$ 16 milhões no IRB.