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Brasil x EUA

O gol do suíno com o algodão

Brasil e EUA realizaram acordo preliminar sobre subsídios ao algodão, evitando o passo seguinte: a retaliação comercial.

O gol do suíno com o algodão

Após oito anos e vitórias sucessivas nas diversas instâncias do sistema de solução de controvérsias da Organização Mundial do Comércio (OMC), Brasil e EUA realizaram acordo preliminar sobre subsídios ao algodão, evitando o passo seguinte: a retaliação comercial.

Não é o fim do processo, porém, representa importante etapa. Como parte do acordado neste momento, os EUA deverão colocar em consulta pública nesta sexta-feira, dia 16, resultado do estudo que vinham realizando para habilitar Santa Catarina a exportar carne suína ao mercado norte-americano. Como participei dos processos, tanto no algodão como na carne suína, acredito ser interessante chamar a atenção sobre alguns pontos. Um dos avanços da Rodada Uruguai ? além do Acordo sobre Agricultura, que trata de subsídios e acesso a mercados, infringido pelos EUA no algodão ? foi a obtenção do Acordo Sanitário e Fitossanitário (SPS), cujo ponto central é proibir barreira sanitária sem fundamento em critérios científicos. Infelizmente, o SPS ainda não conseguiu ser devidamente respeitado.

O entendimento sobre o que é critério científico depende muitíssimo de cada país. A ciência norte-americana difere muito da europeia e da asiática. Ou melhor, a interpretação prática da ciência apresenta divergências consideráveis. Alguns critérios exigidos estão longe do que poderia ser considerado ciência. Pior do que diferenças entre interpretações sobre ciência é que o SPS não fixou nenhum tipo de prazo para que as análises sobre o atendimento dos critérios sejam realizadas. Cada país demora o tempo que quiser avaliando se importações podem representar algum tipo de risco sanitário. A realidade é que, infelizmente, somente autorizam importações quando querem.

O Brasil é o terceiro maior exportador de carne suína, porém não está habilitado a exportar para os principais mercados. Processos visando à aprovação tramitam há vários anos, nos diversos países, inclusive nos EUA, onde agora o suíno recebe o impulso do algodão. Em maio de 2007, Santa Catarina obteve o reconhecimento da Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) de região livre de febre aftosa sem vacinação, status sanitário máximo. Em julho de 2007, o Brasil solicitou a vários países importadores reconhecimento e habilitação para exportar. Em abril de 2008, o AnimalPlant Health Inspection Service (Aphis), autoridade sanitária norte-americana, enviou missão veterinária a Santa Catarina para coletar informações visando à realização de estudo sobre eventual risco que importações de carne suína do Brasil poderiam acarretar. Em dezembro daquele ano, informalmente se sabia que o estudo tinha confirmado a sanidade.

Em 2009, o Brasil cobrou insistentemente dos EUA o próximo passo do processo que, dentro da legislação norte-americana, seria colocar em consulta pública por 60 dias o resultado da análise de risco sanitário e a proposta de abertura do mercado para importações. Findos os 60 dias, teríamos que aguardar para que as interpelações do público fossem respondidas, o que poderia ainda demorar mais de um ano. Resumindo: após certificação internacional da OIE, em maio de 2007, e análise técnica dos EUA, que demorou cerca de um ano e meio, teríamos que aguardar mais de dois anos. Com o empurrão do algodão, inicia-se no dia 16 de abril a consulta pública e esperamos que também um compromisso com o fim do processo.

Ficou a lição: atenção e prioridade política são essenciais para que as questões sanitárias caminhem. Não se resolve o assunto só com ciência veterinária. Encontrar um contencioso que ofereça esta prioridade é muito raro. A derrubada de barreiras sanitárias precisa ser uma real prioridade da política externa.

Felizmente, o suíno estava na área quando o algodão criou a oportunidade e o Brasil pôde marcar esse gol. Faltam ainda, no campeonato, as habilitações no Japão, Coreia do Sul, China, México, Canadá e União Europeia, para citar somente os grandes.