Conhecer sobre o Mercado de Carbono na atual conjuntura de negócios que acontecem no cenário brasileiro adquire notada relevância, pois se trata de um assunto contemporâneo ao planeta e traz consigo mudanças significativas tanto no contexto econômico global quanto nos sistemas comportamentais locais.
Nas regiões norte e centro-oeste há uma intensa discussão sobre os projetos florestais, conhecidos por REDD, com uma expressiva interface aqui no sudeste. De forma concomitante projetos de lei correlatos aos créditos de carbono e suas interfaces disputam a atenção em Brasilia.
Tem se falado muito sobre as metas de reduções de emissões já segmentadas por setores da economia, nos levando a crer que não longe haverá um mercado brasileiro de carbono, regulamentado, funcionando “entre” e “intra” empresas.
Toda esta movimentação e esforço de alguns setores da sociedade em consolidar novos modelos de negócios, novas leis, procedimentos e hábitos demonstram o grande interesse pelo tema, pois a questão do carbono impacta em toda a economia do país. E também do mundo.
No entanto, é relevante reafirmar que a relação do homem com a natureza não deve ser entendida apenas como uma relação econômica polarizada entre extração, produção e descarte, mas sobretudo, como uma experiência múltipla e integral, de preservação socioambiental, a fim de garantir a sobrevivência da humanidade.
Mercados de carbono
Hoje existem basicamente dois tipos de Mercado de Carbono: o Mercado Regulado e o Mercado Voluntário de Carbono.
O Mercado Regulado se traduz pela existência da obrigatoriedade do atingimento às metas de redução dos GEE, pelos países do Anexo I, no caso do EU-ETS(European Union – European Trade Scheme), regido pela normas do Protocolo de Quioto.
Outros mercados regulados:RGGI/USA,Alberta/Canadá,New South Wales/Austrália.
No EU-ETS, o maior mercado regulado, os países possuem metas de emissões que são desdobradas para o seu parque industrial, e assim as indústrias passam a buscar cumpri-las, sob risco de imposição de penalidades pelo não cumprimento.
O cumprimento das metas de redução, quando extrapoladas, pode se realizar via aquisição dos créditos de carbono gerados nos países em desenvolvimento.
O MDL, mecanismo de desenvolvimento limpo, é um dos instrumentos deste modelo e viabiliza a comercialização dos créditos de carbono junto aos principais mercados, o europeu e o japonês.
No Mercado Voluntário de Carbono (VCM), os compradores adquirem os créditos de carbono de acordo com sua conveniência e necessidade, seja ela responsabilidade socioambiental, posicionamento competitivo ou investimento financeiro, já prevendo as oportunidades futuras de trading.
Não há regime de metas de redução neste mercado.
Os mecanismos deste mercado são mais ágeis permitindo a negociação de créditos de carbono entre empresas e entre empresas e cidadãos.
Um deles é o OTC- over the count, um esquema de mercado de balcão que viabiliza a comercialização dos títulos (créditos de carbono).
O mercado de carbono no Brasil
O país ocupa a terceira posição mundial como desenvolvedor de projetos de MDL, atrás da China e Índia.
As receitas geradas com as vendas de créditos de carbono, representam o 17° produto de maior valor entre as exportações brasileiras correspondendo a uma receita anual de US$ 476,5 milhões. E tende a aumentar. Na esteira vem o Mercado Voluntario com volume em evolução.
Este mercado vem tornando-se a cada ano, em seu contexto geral,mais atrativo para os investidores nacionais e estrangeiros por diversos motivos. Um deles é o potencial do Brasil para gerar projetos de carbono, seja de energia ou florestais.
Apesar do fato de que a matriz energética nacional seja majoritariamente renovável, portanto de baixa emissão de GEE e ao contrário de países como Índia e China,aqui existem alguns projetos que são emblemáticos em nível mundial devido ao volume de créditos gerados e pelo grau de complexidade. É o caso de projetos na industria química, sucroalcooleria,suinocultura, ou ainda de alguns aterros sanitários.
Para complementar, o surgimento da modalidade conhecida por REDD – redução das emissões por desmatamento e degradação da terra, está descortinando uma grande oportunidade de novos negócios com foco na preservação da biodiversidade e com possibilidades de uma robusta geração de créditos de carbono para o mercado voluntário
Neste contexto vamos discorrer sobre ambos os mercados citados acima e adicionalmente, algumas modalidades de projetos:
I- Projetos de carbono no âmbito do VCM;
II- Projetos de REDD,também no âmbito do VCM ;e
III- Projetos de MDL no âmbito do Protocolo de Quioto.
(A Bolsa de Chicago não será contemplada nesta abordagem).
I- Projetos do VCM
Sendo processos menos burocráticos, oferecem algumas vantagens reais: são mais ágeis,em até 6 ou 8 meses um projeto pode ser registrado e seus créditos comercializados. No caso dos projetos florestais do VCM, este tempo é mais extenso e o processo um pouco mais complexo, todavia ainda são mais viáveis e bem mais valorizados quando comparados ao MDL.
Para agregar credibilidade, agilidade e nivelar procedimentos hoje são encontrados disponíveis nada menos que 17 diferentes padrões para certificação de projetos no VCM.
O VCS- Voluntary Carbon Standard é o mais utilizado. Gera um ativo financeiro conhecido por VCU- Verified Certification Units. Outros padrões também utilizados são ACR (CAR), Gold Standard (GS) , Carbono Social. Este último, brasileiro.
Outro nome dado à redução de emissão de 1 tonelada de CO2e é VER – Verified Emission Reduced, termo mais comumente encontrado. Ambos significam toneladas de carbono equivalente (CO2e) reduzidas e depois de formalmente registrados em órgãos específicos, os Registros, são usualmente reconhecidos como “créditos de carbono”.
Lado da Demanda
A demanda pelos créditos tende a aumentar principalmente porque os EUA já vêm discutindo há algum sobre a aprovação da legislação federal que controlará e provavelmente taxará as emissões internas de carbono.
Caso isto aconteça, e tudo parece indicar que será em 2011, então estabelecerão uma política nacional de redução e controle dos GEE e isto implicará em um aumento exponencial da demanda.
Assim, caso país desenvolva e implemente mecanismos financeiros e instrumentos técnicos e jurídicos que produzam a credibilidade e segurança necessárias terá grande chance de vir a ser o principal fornecedor neste mercado que promete ser cinco vezes maior que o do Protocolo de Quioto.
No Brasil o crédito tem sido comercializado junto á investidores estrangeiros ao redor de 4-5 U$ por unidade.
Nos países europeus, o mercado secundário, varia entre 6 e 15 dólares por unidade. Alguns estudos apontam para raríssimas exceções que poderiam chegar até 40 U$ por unidade.
Em nível global este mercado tem apresentado expressivo crescimento. Em 2007 negociou cerca de U$ 263 milhões, em 2008 saltou para U$ 396 milhões em 2009, ao redor dos U$ 700 milhões e em 2010 a tendência de expansão se mantém.
Sinais complementares vêm reforçar a tendência de crescimento deste mercado: (i) aumento da conscientização por segmentos da sociedade ocidental a qual passa a desejar cada vez mais os produtos com “pegada ambiental mais leve” e portanto, instigando o segmento industrial à ações de redução e compensação de emissões; (ii) significativas metas voluntárias de redução assumidas pelo Brasil no final de 2009 e as recentes e discretas manifestações do governo simbolizando que não longe haverá o estabelecimento de metas para alguns segmentos da economia, e por conseqüência a estruturação de um mercado brasileiro de emissões.
Cenário que está levando algumas empresas a repensarem seus posicionamentos quanto ao carbono.
Não há uma estimativa clara sobre o tamanho deste mercado no Brasil, mas é perceptível o potencial de expansão e a existência de oportunidades para desenvolvimento de novos projetos.
II- Projetos de REDD e Florestais.
O conceito básico do REDD é manter a floresta em pé evitando o desmatamento e queimada, ao mesmo tempo em que remunera o proprietário da floresta por esta atividade.
No entanto, cada vez mais a dimensão social, complementar à ambiental, tem ocupado mais espaço nos projetos de REDD. Conhecidos por “REDD+”, estes projetos incorporam em suas ações as boas práticas socioambientais e incluem técnicas de manejo sustentável da floresta assim como a integração de atividades Agrosilvipastoris. Embora desperte curiosidade e um grande interesse por parte dos investidores, Redd ainda não é um caminho consolidado, estabilizado. Falta escala de projetos realizados, cases reais, acessíveis, sobretudo, aos proprietários de médio e pequeno porte, e por fim que possam ser replicados.
Dinamica do REDD
A floresta intacta mantém o carbono estocado em sua estrutura física; raízes, caule, copa. Este carbono estocado é passível de ser contabilizado e valorado, estabelecendo-se assim as unidades negociáveis de créditos de carbono.
Em linhas gerais, desta forma REDD ajuda a evitar a emissão dos GEE. O desmatamento, em todo o mundo, hoje é responsável por 17,4% do total das emissões de GEE ,maior que o setor de transporte.
REDD é amplamente discutido nas CoP e talvez tenha sido a questão que melhor resultado obteve em termos pragmáticos, nestas ultimas conferencias globais. Além do que, se mostra como sendo a esperança que centralizará as discussões em Cancun, e que muito possivelmente produza resultados bastante concretos.
Alguns países concordaram em aportar recursos financeiros.A Noruega prevê o aporte de 1 bilhão de dólares e os EUA também 1 bilhão de dólares, mas escalonados ao longo de 3 anos.
Adicionalmente REDD representa oportunidades de desenvolvimento de novos negócios periféricos quando se considera todo o entorno dos projetos: cadeia de logística de produtos e serviços, instituições e comunidades.
Os Estados do Mato Grosso, Acre e Amazonas estão investindo fortemente no arcabouço jurídico-legal e simultaneamente produzindo incentivos para o estabelecimento de projetos de REDD.
Há uma intensa e fértil discussão entre uma diversidade de atores da sociedade em várias partes do país sobre projetos florestais.
No Brasil já são 17 projetos de REDD em fases distintas de desenvolvimento. Destes projetos, quinze estão na região amazônica e dois no Vale do Ribeira, na região sudeste. Por estados, a divisão é seis no Mato Grosso, cinco no Pará, quatro no estado do Amazonas e dois no Paraná.
A reserva do Juma, no estado do Amazonas é o projeto pioneiro e emblemático.
Juntos, a rede de hotéis Marriot, Coca-cola e FAS – Fundação Amazonas Sustentável desenvolvem a iniciativa responsável por manter a floresta em pé, ocupando-se inclusive dos aspectos socioambientais da área (590 mil ha) e seus habitantes.
Sobre REDD ainda há muito que se discutir, sobretudo sobre políticas nacionais e sub-nacionais para gestão e controle, questões correlatas à linha de base, tempo de permanência, gestão dos riscos dos projetos.
O interesse por esta modalidade é crescente.
Há um grande numero de interessados procurando entender como desenvolver os projetos ao mesmo tempo em que os investidores procuram por modelos factíveis: rentáveis e seguros para o investimento, uma vez que são projetos com maturação em médio e longo prazos.
III- Projetos de MDL: No ano de 2012 expira o primeiro período de metas de redução do Protocolo de Quioto. Por conseqüência o MDL, enquanto mecanismo de mercado, também se vê pressionado e requerido á uma reavaliação quase que estrutural de suas premissas.
O assunto foi amplamente debatido durante em Copenhagen e não houve definição, situação que trouxe insegurança a todos que atuam neste Mercado.
Lado da Demanda
O mercado de carbono que gira em torno do Protocolo opera hoje acima dos 130 bilhões de dólares/ano e sinaliza que triplicará seu tamanho até o ano de 2014. As novas atividades de projetos como o CCS – Captura e Estocagem de Carbono no subsolo, e algumas nações adotando perfil de economias de baixo carbono certamente contribuirão para este crescimento.
No mercado global do MDL, o CER primário e o CER secundário representam juntos 22 bilhões de dólares/ano.
MDL no Brasil
Num esforço de trazer segurança e visão de continuidade alguns projetos de MDL foram comercializados com entrega para o pós-2012 em operações fomentadas pelo Banco Mundial e fundos investidores.
Perda de Atratividade
Hoje os projetos de MDL perdem atratividade e espaço. Veja as causas:
(i) Futuro Incerto: a indefinição sobre o que acontecerá após o ano de 2012, em relação á um acordo climático global que substitua ou complemente o Protocolo de Quioto, tornou-se um fator preponderante para o futuro do MDL.
(ii) Janela de Tempo: com a aproximação do ano de 2012, tudo se torna mais complexo no âmbito do MDL.O tempo necessário para validar, registrar e emitir os RCEs de um projeto na ONU costuma levar de 18 a 24 meses, podendo até ser superior.Isto desmotiva o investidor, pois representa risco adicional.
(iii) Custo x Risco: o custo de transação do projeto de MDL pode chegar aos 150/200 mil dólares o que representa um obstáculo para empresas de pequeno e médio porte. Ficam excluídas do processo.
Estruturar o projeto com recursos próprios e ao mesmo tempo correr os riscos inerentes, tem gerado desistência.
(iv) Complexidade do processo: as etapas de desenvolvimento e aprovação do projeto são complexas e passam por avaliações extremamente criteriosas e lentas. Existem casos onde os projetos têm de retornar à etapa inicial do para revisão integral.
Além disso, questões relativas à interpretação de critérios, como Adicionalidade, por exemplo, tem colocado à margem inúmeros potenciais projetos.
(v) Projetos aprovados e registrados na China têm apresentado um elevado grau de desconfiança.
(vi) O fato de o Japão estar adquirindo créditos originados na Rússia e região, por preços muito abaixo da média e oriundos do conhecido Hot-Air, adicionalmente tem gerado desconforto no Mercado de Carbono.
MDL Programático
Recentemente o Banco Mundial lançou uma carta-convite para que esta modalidade fosse avaliada com o intuito de que se entendesse quais as razões que “emperram” esta modalidade no Brasil. Neste momento existe um projeto em andamento no estado de Minas Gerais com 40 usinas de cana, um banco alemão e uma consultoria de mercado.
(v) os chamados “low hanging fruits “já foram quase todos realizados; captação de metano em aterros sanitários e em projetos de suinocultura; co-geração com bagaço de cana; substituição de matriz energética nas industrias.As grandes empresas praticamente já desenvolveram seus projetos de MDL ou então aguardam momentos de melhor definição para fazê-lo.
Existe a possibilidade de êxito da modalidade CCS (carbon capture and storage), mas ainda há muito para se aguardar. Esta atividade de projeto deve tomar corpo por volta de 2012.
Os projetos florestais, na contexto do Protocolo, continuam a representar um cenário pouco atrativo.A menos que as regras de Quioto mudem, este potencial será amplamente aproveitado pelo mercado voluntário.
Portanto o MDL encontra-se cada vez mais limitado enquanto oportunidade de redução de GEE e de geração de receitas. Mas,… tudo pode mudar.