O volume de chuvas maior que o habitual para esta época do ano registrado em parte considerável do País nos últimos dias não foi, na agricultura, uma má notícia para todo mundo. Na próxima semana, será iniciado o plantio de soja em Mato Grosso. O prazo legal para o começo da semeadura do grão é 15 de setembro, mas tudo dependia das primeiras chuvas nas lavouras do Estado. E a chuva já veio.
A soja é o carro-chefe das exportações brasileiras, e não apenas no segmento do agronegócio. Mato Grosso, por sua vez, lidera a produção nacional. Em 15 de setembro termina a “noventena” da cultura, um intervalo de três meses durante o qual o cultivo do grão é proibido como forma de controlar a disseminação da doença conhecida como ferrugem asiática, uma das mais danosas para a cultura.
Com as primeiras chuvas depois do dia 15 costuma começar o plantio. Como elas vieram antes disso, a largada não deverá ocorrer, como por vezes ocorre, com o que se chama de “plantio na poeira”. O solo umedecido deverá contribuir para o bom desenvolvimento das plantas em seu estágio inicial.
Não ocorrerá, de qualquer forma, uma corrida desenfreada para a semeadura. Com o lançamento das primeiras sementes ao solo, os produtores ajustam o maquinário. E isso sequer ocorrerá em todo o Estado de uma única vez. Segundo já detectado pelos técnicos do Instituto Mato-Grossense de Economia Agrícola (Imea), as regiões de Lucas do Rio Verde, no médio-norte do Estado, e Sapezal, no oeste, concentrarão os primeiros plantios.
“O pessoal não pode confiar muito nessas chuvas. Elas podem não durar muito. Ainda são muito irregulares”, diz Luiz Nery Ribas, gerente técnico da Associação dos Produtores de Soja do Estado de Mato Grosso (Aprosoja). “Fazia quase 20 anos que não chovia tão cedo assim”.
Não foram, de qualquer forma, chuvas para perdas no campo como as ocorridas em São Paulo. A qualidade do café do Estado foi afetada, assim como as lavouras de cana, que perdem teor de sacarose com a umidade excessiva. No Paraná e no Rio Grande do Sul, as chuvas afetaram os trigais.
Ainda que se relativize o fato de a umidade do solo ter ocorrido mais cedo que o usual, o dado engorda o pano de fundo do que já se esperava para as lavouras de soja do País neste ano (com Mato Grosso na dianteira): o crescimento da produção, impulsionado pelos preços da oleaginosa, no momento mais atraentes que os do milho. Este deverá perder área para a soja.
Em seu relatório mais recente, de agosto, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) fez a projeção de que o Brasil produzirá 60 milhões de toneladas na safra 2009/10, volume superior às 57 milhões de toneladas que, segundo estimativa do órgão, o Brasil colheu no ciclo 2008/09. Na temporada passada, a produção brasileira foi de 57,08 milhões de toneladas, de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Os custos de produção estão mais baixos que os registrados na safra passada. Com isso, tende a se regularizar o consumo de fertilizantes e defensivos, um fator adicional para o aumento da produtividade da cultura no país – e, em consequência, da produção.
No Centro-Oeste, as chuvas extemporâneas não são exclusividade de Mato Grosso. “Elas ocorrem em todo o centro do país”, diz Francisco de Assis Diniz, assessor técnico do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
Segundo ele, em anos de El Niño – fenômeno do aquecimento das águas do Oceano Pacífico que, no Brasil, costuma causar chuvas no Sul e tempo seco, com temperaturas acima da média, no Sudeste e no Centro-Oeste -, as chuvas chegam mais cedo ao centro do País, que, depois, enfrenta veranicos.