A alta nos preços dos alimentos ao longo do ano tem sido mais cruel para as famílias de renda menor que para o conjunto da sociedade. Enquanto nos primeiros nove meses do ano a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulou alta em torno de 3,5%, o Índice de Preços ao Consumidor de classe 1 (IPC-c1), medido pela Fundação Getulio Vargas (FGV) para as famílias com rendimento entre um e 2,5 salários mínimos acumulou alta de 4,18%. O aumento de 0,42% verificada no IPC-c1 em setembro foi contaminado pelos preços dos alimentos, que saíram de uma deflação de 1,19% em agosto para uma alta de 0,56% no mês passado.
Até agosto, o IPCA, que mede a alta de preços no varejo, calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), acumulou 3,14%. Para setembro, cujo dado só será conhecido na próxima semana, o mercado estima variação em torno de 0,4%, uma vez que sua prévia, o IPCA-15, registrou alta de 0,31% – assim, nos nove meses de 2010, o IPCA acumulou alta em torno de 3,5%.
Principal indicador de inflação do País, o IPCA mede as oscilações de preços para famílias com rendimentos entre zero e 40 salários mínimos. Nesse indicador, o peso dos alimentos fica diluído, uma vez que compromete menos a parcela dos rendimentos de uma família de renda mais alta, que gasta também com bens de consumo, como eletrodomésticos, eletrônicos e automóveis.
O que a FGV faz, com o IPC-c1, é pesquisar nas famílias que recebem entre R$ 510 e R$ 1.275 por mês quanto aumentam os preços. Nessa faixa de renda, os alimentos pesam 40%, quase o dobro dos 22,7% que os alimentos representam no IPCA. O forte salto nos preços dos alimentos, em setembro, para as famílias de baixa renda, foi puxado pela alta de 5% nos preços do feijão carioquinha e de 3% da carne moída – juntos, compõem 1,6% do total dos alimentos para quem recebe até R$ 1.275. O pão francês, que sozinho representa 3% do IPC-c1, ficou 1,5% mais caro em setembro, depois de ter passado por elevação semelhante em agosto.
A alta nos preços dos alimentos já vem sendo captada no atacado, por meio do Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M). No mês passado, os preços de grãos importantes, como milho e soja, tiveram altas expressivas, de 16% e 3%, respectivamente, ao mesmo tempo em que o algodão subiu 31%.
A alta do milho elevou também o preço das aves, que subiu 7,76% em setembro. A pressão no campo, contagiada pela forte elevação de preços das commodities agrícolas no mercado internacional, atingiu os preços dos alimentos processados no atacado, que subiram 4% em setembro. Até então oscilando em torno de zero, a prévia do IPCA em setembro, o IPCA-15, já repercutiu a alta no atacado: os alimentos saíram de -0,68% em agosto para uma forte alta de 0,30% em setembro.
Além dos alimentos, o economista Gian Barbosa, da Tendências Consultoria, destaca a elevação nas tarifas de transporte público coletivo que ocorreu no início do ano. “Os transportes públicos são muito mais importantes para quem tem menor remuneração que para aqueles com salários maiores, que podem morar perto do emprego e também pagar por um carro”, diz. Nos 12 meses terminados em setembro, o item transportes foi o que acumulou a maior alta no IPC-c1, de 8,3%, toda concentrada em janeiro e fevereiro, quando registrou variações de 5% e 2,6%, respectivamente. O item transportes representa 13,1% do IPC-c1.