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Preços baixos

Valor de commodities estimulam chineses a fazerem estoque com produtos brasileiros.

A estratégia chinesa de repor ou montar estoques de commodities para aproveitar os baixos preços e o menor custo do frete pode ter impulsionado as exportações do Brasil para a China, que crescem a taxas impressionantes para uma época de crise global, avaliam economistas e empresários.

A China elevou em 50% o volume de minério de ferro que comprou do Brasil de janeiro a abril deste ano ante igual período de 2008. Na mesma comparação, a alta chegou a 70% na soja, 130% na celulose, 250% no petróleo e 425% nos produtos químicos, revelam dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) elaborados pelo Conselho Brasil-China.

Os analistas estão perplexos porque isso ocorreu enquanto a economia chinesa desacelerava por conta do colapso das exportações para Estados Unidos e Europa. O PIB da China cresceu 6% no primeiro trimestre, uma taxa expressiva, mas abaixo dos 10% de 2008. “Muitos de nós estão intrigados com os números que vem da China”, disse Arthur Kroeber, economista-chefe da Dragonomics.

Além dos maiores estoques, outros fatores colaboraram para impulsionar as compras chinesas de commodities. A China está gastando US$ 586 bilhões em obras de infraestrutura e os bancos estatais despejaram crédito na economia. Com essas medidas, Pequim incentivou as empresas a evitar demissões e seguir produzindo, apesar da menor demanda externa.

O problema é que ninguém se arrisca a dizer qual é o peso da formação de estoques (uma demanda não sustentável) e do pacote de estímulo econômico (um demanda consistente se a China seguir crescendo forte). Essa proporção que vai decidir, por exemplo, a queda de braço entre as siderúrgicas chinesas e a Vale do Rio Doce pelo preço do minério.

“Existem evidências de que os chineses estão empilhando estoques para se proteger de uma alta de preços e garantir o suprimento de matérias-primas. Também houve um aumento importante do investimento, que exige commodities”, disse Michael Pettis, professor da Universidade de Pequim.

O governo chinês não admite oficialmente a estratégia, mas, em março, o primeiro-ministro Wen Jinbao disse que o país aumentaria as aquisições de recursos naturais enquanto os preços estavam no nível mais baixo em sete anos. Na mesma época, a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, o principal órgão de planejamento chinês, confirmou que elevaria estoques emergenciais.

Fontes do mercado acreditam que a política chinesa de estocar commodities pode ser uma alternativa para aplicar as reservas em meio ao temor de que o valor do dólar venha a cair. “É parte do desejo de diminuir a exposição a ativos em dólar”, disse Brian Jackson, estrategista-sênior do Royal Bank of Canada de Hong Kong, conforme a agência Bloomberg.

Dados da Secex apontam recuo de 6% nas exportações brasileiras totais de básicos nas duas primeiras semanas de maio em relação à média diária de abril e de 37% ante maio de 2008. No mesmo período, a exportação de minérios caiu 38% frente a abril e 47% ante maio de 2008. Ainda não foram divulgadas as vendas para a China em maio. Se a queda persistir, pode corroborar a tese de que os estoques voltaram a um nível normal, o que normalizaria as compras do país.

No primeiro quadrimestre, as exportações brasileiras para a China avançaram 65%, para US$ 5,6 bilhões. O aumento de 56% no volume respondeu pela maior parte da variação, enquanto os preços ficaram praticamente estáveis. É o inverso do que ocorreu no ano passado. Em 2008, o volume de exportação do Brasil para a China subiu 6% (14% até setembro, depois forte queda no quarto trimestre), mas os preços avançaram 44%.

O minério de ferro superou a soja como principal produto da pauta de exportação para a China e respondeu por 45% das vendas neste início de ano. Para Pedro Galdi, analista da SLW Corretora, os chineses estão recompondo seus estoques de minério, após a forte queda das exportações brasileiras para o país no quarto trimestre de 2008, quando a crise global e a desavença entre as siderúrgicas e a Vale paralisou o mercado.

Rodrigo Maciel, secretário-executivo do Conselho Brasil-China, ponderou que os preços do minério ainda estão acima das cotações do início de 2008, mas ressaltou que os chineses não tiveram opção, porque o incremento da demanda por aço, provocado pelo pacote fiscal, pegou o país com estoques perigosamente baixos. Maciel aposta em crescimento do volume de minério vendido para a China este ano, mas admite que o ritmo deve desacelerar.

No caso da soja, o fator mais importante para as expressivas compras chinesas é o preço. O produto estava quase 30% mais barato no primeiro quadrimestre deste ano comparado com igual período em 2008. Outro fator que vai impulsionar as vendas é a menor disponibilidade de oferta da Argentina, que sofreu uma quebra de safra.

Fábio Trigueirinho, secretário-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove), disse que a crise não afetou a demanda por soja, pois os alimentos são menos sensíveis à variações de renda. Ele estima que, no ano, o volume exportado de soja para a China deve ser similar ao de 2008, já que a produção brasileira não vai variar muito. No ano passado, a China absorveu 48% das exportações de soja do Brasil.

O petróleo é outro produto que sofreu forte recuo de preços, o que incentivou as compras da China. A queda das cotações chegou a 52% na comparação do primeiro quadrimestre de 2009 e igual período de 2008. Segundo Adriano Pires, economista do Centro Brasileiro de Infraestrutura, a oferta de petróleo não evoluiu como se esperava e qualquer sinal de reação da economia mundial pode puxar os preços. “Os chineses perceberam isso e estão estocando commodities, pois o preço do petróleo é referência para esses mercados”.

Na celulose, os chineses também interromperam as compras no fim de 2008, mas voltaram ao mercado com vigor em março, conta Elizabeth de Carvalhaes, presidente da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa). Ela explica que o Brasil está ganhando market-share no país, principalmente por conta do fechamento de fábricas concorrentes na Finlândia. A China se tornou o maior mercado para a celulose brasileira, superando a Europa. Em março e abril de 2009 foram exportadas, respectivamente, 241 mil e 301 mil toneladas para a China, enquanto a Europa recebeu 164,2 mil e 277,5 mil toneladas.

O apetite chinês tem sido fundamental para o Brasil. Graças a isso e às fracas importações, o superávit do país com o mundo nos 12 meses até abril chega a US$ 27 bilhões, acima dos US$ 24,7 bilhões de 2008 – um resultado inesperado na crise. Alguns analistas já falam em saldo de US$ 30 bilhões este ano, mas muitos esperam US$ 15 bilhões a US$ 20 bilhões, apostando que as exportações vão desacelerar quando os chineses pararem de fazer estoques.

A China se tornou o principal destino das exportações do Brasil em março e abril – um motivo para tornar mais festivo o encontro de hoje dos presidentes Hu Jintao e Luiz Inácio Lula da Silva em Pequim. Mas os economistas alertam que é cedo para cravar a China nessa nova posição no comércio exterior. Nos 12 meses até abril, as exportações do Brasil para os EUA ainda superam as feitas para a China em mais de US$ 6 bilhões.