A tragédia de Mariana tomou a proporção de uma das maiores catástrofes ambientais do Brasil. Além de devastar distritos inteiros, também provocou prejuízos aos produtores rurais de Minas Gerais e está levando apreensão ao Espírito Santo.
A lama destruiu mais de mil pés de pimenta biquinho da associação do distrito Bento Rodrigues, formada principalmente por mulheres. Na propriedade de um hectare elas plantavam, colhiam a pimenta e faziam a geleia. Eram produzidos duzentos e cinquenta potes por dia que eram vendidos para sacolões e supermercados da região. Nove famílias viviam da produção.
A fábrica ficou de pé, não foi atingida pela lama. O problema é o risco do rompimento de outras duas barragens. Por segurança, o pessoal da associação nem pode ir à sede. “A gente não sabe o que vai ser daqui pra frente da associação. A gente espera que seja construída outra como a gente tinha”, diz Keila Vardela Fialho, presidente da Associação de Produtores de Bento Rodrigues.
Camargos é outro distrito que também foi atingido pelo mar de lama. Ele fica a seis quilômetros de Bento Rodrigues. Para chegar até a casa do produtor Geraldo Marcos da Silva o acesso é difícil. Trilha estreita, com muita lama. É preciso se segurar nas árvores e galhos.
Geraldo vai até a propriedade pelo menos uma vez por dia, para dar comida à criação. Ele perdeu vacas, galinhas e as ferramentas usadas na roça, que estão enterradas na lama
Cerca de 2.700 hectares foram atingidos em Minas Gerais, segundo a Secretaria de Estado da Agricultura. Mais de 200 propriedades rurais foram afetadas no estado. Ainda não dá para calcular o prejuízo. “É difícil falar, é difícil falar, porque acabou minha vida. Era pouquinho, mas eu não dependida de ninguém. Eu tinha minha sobrevivência. Agora eu não sei como é que vai ficar”, lamenta Geraldo Marcos da Silva, agricultor.
A lama desceu das encostas e percorreu cerca de 500 quilômetros em Minas Gerais até chega ao Espírito Santo, em direção ao mar.
A água barrenta chegou silenciosa em Aimorés, divisa de Minas Gerais com Espírito Santo. Os sedimentos se deslocaram por debaixo do lago, sem sujar a lâmina d’água da barragem do município. Por volta das 8 horas da manhã da última segunda-feira, as comportas do vertedouro passaram a jorrar o barro que tingiu o rio Doce dali para baixo.
Do alto, a cena estava assim: uma cor no lago, outra já barrenta no curso natural do rio. Imagens mostram o momento que a lama se misturou à água.
A lama chegou ao Espírito Santo antes do previsto. “Ela veio de surpresa, surpreendeu todos, até os biólogos. Foi até mesmo um pânico, porque a gente estava com os barcos no rio, resgatando os peixes. Não sabia se parava ou se continuava. A gente espera que não morram todos os peixes, que consigam sobreviver, mas é aguardar agora para saber qual é o tamanho do impacto ambiental”, lamenta Normilda Soares, agende da Defesa Civil de Aimorés.
A cena foi registrada pelo celular do seu Ideraldo Luiz de Souza, o administrador de uma fazenda com sete mil cabeças de gado, que dependem exclusivamente da água do rio Doce. Os animais continuam bebendo a água do rio, porque não há alternativa.
Diante das incertezas que vieram junto com a lama, o presidente do Sindicato Rural de Aimorés, Antônio Pedro Serrano, diz que o agricultor não teve tempo, nem orientação, para tomar qualquer medida preventiva. “O produtor está igual cachorro que caiu do caminhão da mudança. Ele não sabe o que fazer nem o que vai acontecer”.
Na quarta-feira (28/11), a lama cortava a cidade de Colatina, no Espírito Santo. A sensação era a do encontro de dois rios, o mais claro e o mais escuro. A diferença é que um está matando o outro.
Em nota, a mineradora Samarco, controlada pela brasileira Vale e pela anglo-australiana BHP, informou que está prestando assistência às propriedades rurais, com atendimento médico veterinário, alimentação e estrutura para resgate de animais. E que trabalha em parceria com órgãos públicos para recuperar as áreas atingidas.