O superávit da balança comercial brasileira deste ano está sendo revisto para cima e a principal razão é um aumento do valor exportado em decorrência do preço do minério de ferro e de outras commodities. No começo do ano, as projeções para o saldo comercial estavam em torno de US$ 8 bilhões a US$ 10 bilhões. Agora, o intervalo de resultado positivo varia de US$ 15 bilhões a US$ 18 bilhões.
A Associação Brasileira de Comércio Exterior (AEB) também aumentou sua projeção para o superávit comercial, apesar do avanço das importações. O Valor apurou que o saldo projetado para o ano passou para um valor entre US$ 15 bilhões a US$ 16 bilhões, e não mais em US$ 12 bilhões. O novo dado também reduz a estimativa para o déficit em conta corrente do País, que baixa de US$ 49 bilhões para US$ 41 bilhões.
Na nova conta da AEB, as exportações devem encerrar o ano com receita de US$ 183,5 bilhões ante US$ 153 bilhões em 2009, avançando 19,6% com predomínio absoluto de produtos básicos e semimanufaturados. O fato não ocorria desde 1978, informou José Augusto de Castro, diretor da AEB. As importações devem somar US$ 172 bilhões, crescendo 35% ante os US$ 127,6 bilhões do ano anterior.
Todos os analistas revisaram suas projeções e fizeram isso mais pelo aumento das exportações. A LCA projetava, em fevereiro, saldo comercial de US$ 7,8 bilhões, valor agora corrigido para US$ 16,2 bilhões. A principal contribuição para esse aumento veio da expectativa de exportações totais de US$ 195,8 bilhões, US$ 10 bilhões acima da projeção de fevereiro.
Os economistas do Santander também reviram suas projeções. No início do ano, o banco estimava exportações de US$ 162 bilhões, mas agora já trabalha com um resultado de US$ 203 bilhões – um salto de 25,3% em seis meses. “Percebemos que estávamos subestimando as vendas externas, que vieram mais fortes do que as projeções”, diz Cristiano Souza, economista do Santander. Além disso, há o efeito do minério de ferro.
O desempenho da conta de comércio este ano está melhor do que a esperada por causa da alta do preço do minério de ferro, que acrescentou às projeções mais US$ 10 bilhões em relação aos valores antes estimados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MIDC). “As vendas de minério de ferro este ano devem totalizar US$ 23 bilhões e a Vale deve ultrapassar a Petrobras na disputa pelo primeiro lugar no ranking das maiores exportadoras do País”, diz Castro.
As vendas de minério estão tão aquecidas que na segunda quinzena de julho a média diária de exportações do insumo bateu recorde absoluto emplacando US$ 162 bilhões por dia. “De 5 a 11 de julho foram negociados US$ 810 milhões de minério de ferro”, revelou o diretor da AEB. Ele atribui este desempenho singular ao reajuste do minério que subiu mais de 100% no segundo trimestre.
Segundo ele, minério, petróleo e derivados e soja vão responder por mais de 30% da receita de exportações. Isto eleva a participação dos primários , semimanufaturados e commodities como álcool e açúcar refinado na pauta de vendas externas a quase 70%, ante menos de 40% dos manufaturados industriais – a conta ainda não está fechada. “Não vejo este desempenho como um processo de desindustrialização do País, o fato é que o projeto de transformar o Brasil numa plataforma de exportação de manufaturados adernou”, ironizou o diretor da AEB.
Os produtos manufaturados industrializados “made in Brazil” estão perdendo competitividade e atratividade por várias razões, sejam de natureza tributária ou cambial, dentre outras, argumenta Castro. “O que acontece é que ficou caro investir para exportar industrializados no Brasil, sem falar no nosso atraso tecnológico”, dispara.
O diretor da AEB não vê com otimismo o cenário recessivo que se desenha nos países do euro. Os maiores compradores de produtos brasileiros hoje são em primeiro lugar a China (15% da receita de exportação), Estados Unidos (10%) e Argentina (8,8%), seguidos da Alemanha e Holanda. “Se a recessão europeia se aprofundar poderá derrubar o preço das commodities em 10% em 2011. Se isso acontecer, podemos ter déficit comercial ano que vem.”
Souza, do Santander, não tem grandes preocupações com um aprofundamento da crise europeia. Para ele, a recuperação dos países desenvolvidos será lenta, mas ocorrerá. “A China, também, não crescerá tão fortemente quanto vem crescendo. Mas será algo suave, de um PIB que deixa de avançar 12% para aumentar 8% ou 9%”, diz. Esse ritmo menos acelerado, no entanto, acarretará em menor disposição para comprar exportações brasileiras.
O reflexo de um resultado negativo na conta de comércio afeta diretamente o balanço de serviços e consequentemente amplia o déficit em conta corrente. A consultoria OPUS, de José Márcio Camargo, estima que se a crise externa persistir, o déficit em conta corrente pode cravar em US$ 60 bilhões. “O Brasil não pode a longo prazo continuar aumentando este déficit. Ou aumenta taxa de poupança ou vai ter que crescer entre 4,5% a 5%, por conta do mau resultado das contas externas”, analisa Camargo