Antes de dar sinais mais claros sobre como pretende conduzir a política fiscal em 2012, a presidente da República, Dilma Rousseff, quer limpar a pauta de interesse do governo no Congresso. Isso significa ver aprovados alguns projetos que considera cruciais, como a prorrogação da Desvinculação das Receitas da União (DRU) – que dá liberdade ao governo para manejar 20% do Orçamento – e a nova regra de divisão dos royalties do petróleo – num arranjo que não represente ônus para a Petrobras.
Quer, também, afastar os riscos de aprovação de dois temas que o Palácio do Planalto considera “dramáticos”: a regulamentação da Emenda Constitucional 29 – que define os recursos e cria nova contribuição para financiar a saúde; e a proposta de emenda 300 – que institui piso salarial para policiais civis, militares, bombeiros, ativos e aposentados, pelos padrões do Distrito Federal, a custo estimado em cerca de R$ 30 bilhões.
Somente depois de resolver esses contenciosos é que o governo poderá dar contornos mais nítidos à meta fiscal de 2012, a partir do compromisso já assumido de produzir um superávit primário “cheio” de 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Tudo aponta para um forte contingenciamento das despesas públicas, nos moldes dos R$ 50 bilhões feitos este ano, e o Planalto não quer embaralhar o debate no Congresso com a perspectiva de mais um corte nas emendas parlamentares em 2012, tal como também ocorreu este ano.
A presidente avalia que deu demonstrações cabais de que não brinca com o dinheiro público em duas ocasiões recentes. Primeiro, ao aumentar em R$ 10 bilhões o superávit primário deste ano ao invés de elevar o gasto público com a previsão desse excesso de arrecadação. E, nos últimos dias, ao endurecer com os recorrentes movimentos grevistas do funcionalismo público.
Categorias como auditores da Receita Federal e Polícia Federal, que sempre conseguem arrancar aumentos salariais, não tiveram reajustes este ano mesmo sob a ameaça de greve. Em compensação, Dilma sancionou a lei que eleva para 90 dias o tempo do aviso prévio, num gesto de agrado ao movimento sindical.
A apresentação de um programa fiscal convincente para 2012 seria importante para ajudar na reversão das expectativas de inflação. Hoje, o mercado, segundo a pesquisa Focus, projeta 5,61% de IPCA para o próximo ano, percentual distante da meta de 4,5% que o BC se comprometeu a atingir.
Uma outra preocupação, porém, divide com a inflação as atenções da presidente: a possibilidade de as taxas de crescimento do país em 2012 e 2013 serem baixas. É real o temor do governo de voltar ao padrão de crescimento do período do governo FHC – intercalado por várias crises internacionais -, quando a média de variação do PIB foi de 2,29%, percentual bem inferior à média de 4,01% registrada na gestão Lula – que, de 2003 a meados de 2008, governou embalado pelo crescimento dos países avançados.
Por isso, na visão do Palácio do Planalto, a partir da mudança no mix da política econômica – ao dar maior peso ao controle do gasto público do que ao uso da taxa de juros -, a calibragem entre a austeridade fiscal e a redução do juros básicos deve ser feita com uma certa sintonia fina. O governo busca trilhar o fio da navalha ao optar pelo controle da inflação com as atenções voltadas para a preservação de uma taxa de crescimento não menor do que 3% nos próximos dois anos. O que não está claro é para onde vai pender a opção de Dilma, caso tenha que fazer uma escolha de curto prazo.
A presidente acha que as pessoas, no Brasil, estão subavaliando os efeitos da crise externa sobre o nível de atividade doméstica dos próximos dois anos e, consequentemente, sobre o processo de desinflação no país durante esse período. Segundo seus assessores, ela acredita que as lideranças europeias vão salvar o sistema bancário da zona do euro, mas não tem a mesma certeza sobre o destino dos governos encalacrados em um elevadíssimo endividamento.
Dilma herdou do seu antecessor um processo de aceleração inflacionária e um forte aumento do gasto público. “O ano de 2011 está sendo um freio de arrumação”, disse um assessor da presidente. Ela até poderia tentar reproduzir o desempenho de Lula no primeiro mandato – quando no primeiro ano, 2003, o crescimento foi de apenas 1,1%, mas subiu para 5,7% em 2004 -, mas as condições da economia internacional não devem lhe permitir.
Na agenda do governo para 2012 há temas espinhosos, como a mudança nas regras de indexação da caderneta de poupança. O Palácio do Planalto ainda está avaliando se há condições de priorizar, também, a votação do projeto que limita o aumento do gasto com a folha de salários do funcionalismo público, que tramita no Congresso desde 2007.
Poupança e salários dos servidores são temas politicamente muito sensíveis e de difícil aprovação pelo Congresso, sobretudo em ano de eleições municipais.
As relações do Palácio do Planalto com o Congresso tendem a seguir azedas, se, no contingenciamento de 2012, as emendas parlamentares forem novamente varridas do Orçamento. Ao contrário do seu antecessor, Dilma não pensa em mudar o curso da política fiscal por causa das eleições. Quando confrontada com esse tema, segundo um assessor próximo, a presidente responde: “Isso é problema de Luiz Inácio”.