Quando Pyotr Stolypin, primeiro-ministro sob o último czar, concedeu aos agricultores o direito à sua própria terra, o país cresceu velozmente em cinco anos, para se tornar o maior produtor mundial de grãos. Um século e uma volta de montanha-russa depois, a Rússia mais uma vez estabeleceu a meta de se tornar um importante ator no mercado de grãos, contando com vigoroso interesse do setor privado, em função dos preços crescentes dos alimentos no mundo.
Esse interesse se mantém, apesar da crise financeira que restringe as ambições financeiras de alguns investidores. “É apenas uma questão de tempo”, diz Arkady Zlochevsky, presidente da Associação de Grãos Russa, o órgão setorial. “Se as condições forem favoráveis, haverá investimento e poderemos acrescentar grandes quantidades de alimento aos mercados mundiais”.
A região já é uma das maiores exortadoras mundiais de trigo, cevada e milho, abastecendo os grandes importadores de cereais na África do Norte e Oriente Médio, mas o Kremlin acredita que há oportunidades maiores. Ele anunciou que quer dobrar as exportações de grãos em 15 anos.
Ucrânia e Uzbequistão estão promovendo metas semelhantes. Para o Banco Mundial, com tecnologia moderna, fertilizadores e recuperação de terras não-produtivas à atividade agrícola, a meta de embarques do Kremlin, de 40 milhões a 50 milhões de toneladas/ ano, pode ser satisfeita.
O governo acredita que os estabelecimentos agrícolas possam impulsionar a produtividade anual de grãos em pelo menos 20 milhões de toneladas. Mais 10 milhões de toneladas poderão ser adicionadas por meio do plantio de 25 milhões de hectares de terras não-produtivas.
O principal problema, diz Samir Suleyman, diretor de política e operações do banco, “é dinheiro, e como atrair investimento direto estrangeiro”. A Black Earth Farming, que captou US$ 255 milhões na bolsa de valores sueca em 2007, por exemplo, acumulou 500 mil hectares de terra russa, grande parte dela no ano passado, e também está investindo em novos silos de grãos.
“À exceção dos hidrocarbonetos, o grão é a melhor alternativa para a Rússia no futuro próximo”, diz Michael Shneyderman, economista-chefe do Agro-Invest, controlador do Black Earth Farming na Rússia. “É uma atividade de longo prazo. Não existe sucesso da noite para o dia”.
O renascimento agrícola na Rússia e outras ex-repúblicas soviéticas será um ponto importante para discussão. Alguns enxergam seu retorno potencial na condição de potências em alimentos como uma benção, nutrindo expectativas de produção mais alta e preços mais baixos para gêneros de primeira necessidade, como o trigo. Outros se preocupam com a perspectiva de depender demais do fornecimento de alimentos russos, em função do uso que o Kremlin fez no passado das reservas naturais para obter influência política.
Mas os países da ex-União Soviética enfrentarão um desafio descomunal se quiserem retornar com sucesso à condição de celeiro global. Seus estabelecimentos agrícolas lutam para fugir do legado da coletivização da era soviética e de anos de negligência que se seguiu à derrocada da União Soviética em 1991.
Apesar do seu clima favorável e de possuir um dos solos mais férteis do mundo, a produtividade média dos grãos é um terço da existente na Europa Ocidental.
A escassez de capital significa que vastas extensões de terra permanecem improdutivas, apesar de serem relativamente baratas. Numa iniciativa destinada a estimular a agricultura, Moscou está implantando regulamentações que obrigarão os investidores a cultivar terras agrícolas ou renunciar às suas propriedades. Um registro de terras cultiváveis, elaborado com a ajuda do Banco Mundial, prepara o terreno para o desenvolvimento de um mercado imobiliário, onde os agricultores possam usar terra como garantia para empréstimos.
Mas tornar a terra produtiva e melhorar os índices de produtividade será a parte fácil. Os principais entraves ao crescimento são os gargalos nos transportes e na armazenagem. A capacidade dos terminais de exportação naval nos portos marítimos russos é extremamente baixa. No Cazaquistão, alguns campos de trigo estão a mais de mil quilômetros dos terminais de exportação. São necessários imensos investimentos em infraestrutura.
A estatal russa United Grain Company, criada por decreto presidencial em março, convidou investidores privados a participar no programa de US$ 4 bilhões para a construção de novos silos de grãos e terminais de exportação para diminuir o congestionamento nos portos do Mar Negro. Mas os investidores estrangeiros continuam com receio de despejar milhões na região, onde governos ainda debatem suas respectivas políticas nacionais de segurança alimentar.
Eles ainda se lembram de que, durante a crise alimentar do ano passado, Moscou e também Astana restringiram as exportações de commodities agrícolas para manterem seus mercados locais bem supridos e os preços baixos.