O governo brasileiro vai rechaçar a proposta de compensação financeira para o eventual dano causado por organismos vivos modificados (OGM), que será apresentada nas discussões internacionais sobre biodiversidade em Nagoya, Japão, em outubro. Na mesa está a aprovação de um seguro para países exportadores de transgênicos, o que elevaria os custos desse tipo de comércio.
De acordo com o Itamaraty, trata-se de uma barreira não-tarifária de commodities agrícolas. “Esse item preocupa muito o Brasil. Vai ser uma discussão complicada”, afirmou ao Valor o chefe da divisão de Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, Paulino Franco Carvalho.
O nó da discussão é o Artigo 10 do protocolo suplementar que será debatido durante a 5ª Reunião das Partes do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança (MOP5). Criado em 2003, o protocolo conta com 160 países signatários e tem como principal objetivo regular a movimentação transfronteiriça de organismos vivos modificados – transgênicos que possam transferir ou replicar seu material genético e afetar a diversidade biológica.
O artigo torna mandatório aos signatários exigir dos “operadores” (exportadores, importadores, transportadores e desenvolvedores da tecnologia) a adoção de garantias financeiras para cobrir possíveis danos causados por esses organismos à biodiversidade. O item é defendido por países africanos e Malásia. Brasil, América Latina e Japão são contrários. A União Europeia preferiu a “discrição”, segundo negociadores.
“O artigo faz com que o Brasil fique numa posição pior que a de outros exportadores de commodities, já que EUA, Argentina, Austrália e Canadá não ratificaram o protocolo para não se comprometer”, diz Carvalho.
Embora seja impossível calcular o impacto econômico – não existem seguros para transgênicos -, a medida vai onerar não só operadores mas outros setores. “O impacto no preço de alimentos, energia e do próprio desenvolvimento de novas tecnologias pode ser imenso, o que impõe ponderar se a proposta de seguros respeita a Organização Mundial de Comércio”, diz Rodrigo Lima, gerente-geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone) e autor de um estudo sobre a questão.
Em vez de um seguro compulsório, o Brasil vai propor em Nagoya uma menção à realização de estudos técnicos que mostrem o impacto econômico que ele traria ao comércio e a sua real eficácia. “Até que ponto o seguro seria útil em termos ambientais?”, questiona o Itamaraty, que tentará, dessa forma, empurrar o debate para a próxima reunião, em 2012.
O sucesso do protocolo suplementar, porém, é de interesse do governo federal. Ao contrários das discussões sobre mudanças climáticas, onde a culpa pelos problemas ambientais é depositada pelos países emergentes nos países ricos, a biodiversidade é um tema de interesse do Brasil. O país possui quase um quarto da biodiversidade do planeta.
“Se dizem que os alimentos transgênicos são seguros, o setor precisa assumir isso. Se há uma contaminação de lavouras convencionais, quem sai perdendo somos nós”, diz Ricardo Tatesuzi de Sousa, diretor-executivo da Associação Brasileira de Produtores de Grãos Não Geneticamente Modificados (Abrange).