A guerra cambial terá, provavelmente, que se acirrar para que os principais envolvidos resolvam negociar uma solução séria. A mais recente oportunidade de discussão desperdiçada, a reunião dos ministros de finanças e presidentes de bancos centrais do G-20, grupo que reúne 19 países industrializados e emergentes mais a União Europeia, terminou sábado sem qualquer resultado concreto, apesar dos discursos inflamados. O mesmo desfecho infrutífero teve debate semelhante na reunião semestral do Fundo Monetário Internacional (FMI), realizada no início do mês. O impasse foi agora transferido para o próximo encontro do G-20, reunindo os chefes de Estado, marcada para os dias 11 e 12 de novembro.
A reunião dos ministros do G-20, realizada na cidade turística coreana de Gyeongju, acabou sendo mais comemorada por ter finalmente aprovado mudanças importantes e há muito tempo reivindicadas na estrutura de poder do FMI, dando mais votos aos países emergentes. Em relação ao desequilíbrio cambial, que distorce não só os fluxos de capital mas também a balança comercial de diversos países, as discussões não passaram das intenções.
Os principais interessados em mudanças, como o Brasil e os Estados Unidos, apressaram-se em esconder o desapontamento com manifestações aparentemente otimistas. O secretário do Tesouro americano, Timothy Geithner, que havia surpreendido seus colegas ao sugerir o estabelecimento de metas numéricas de superávits e déficits comerciais entre os países, se disse satisfeito com o fato de os ministros terem chegado a um acordo em relação à necessidade de se conter os desequilíbrios comerciais no futuro para que o crescimento global seja mais equilibrado.
A Coreia do Sul, que ocupa a presidência do G-20 até o próximo mês, sugeriu que a meta ficasse em 4% do Produto Interno Bruto (PIB), tanto para o déficit quanto para o superávit. Mas a proposta dos Estados Unidos (déficit em conta corrente projetado em 3,2% do PIB neste ano) recebeu mais críticas do que aprimoramentos, não só do alvo mais evidente, a China (superávit em conta corrente estimado em 4,7%), que nem quer discutir o assunto. Alemanha (6,1% de superávit) e Japão (3,1%) também fizeram críticas. A Alemanha afirmou que sua vantagem comercial vem da competitividade e não da sua moeda, de resto compartilhada com outros 15 países, que nem por isso têm o mesmo desempenho nas contas externas.
Geithner aparentemente contentou-se com o compromisso do G-20 em cooperar nas políticas cambiais, de modo que países com moedas subvalorizadas caminhem para modelos mais orientados pelo mercado, refletindo os fundamentos econômicos, “como a China vem fazendo agora”, afirmou em seu comunicado após a reunião. Ele confia no compromisso de que o G-20 não vai cair na tentação de embarcar em uma política de desvalorização competitiva ou de subavaliação de suas moedas.
Um dos pontos do comunicado do G-20 foi especialmente elaborado para acalmar o governo americano: os ministros se comprometem a “resistir a todas as formas de protecionismo” e a se esforçar para reduzir as barreiras comerciais.
Mas o comunicado também faz referência às responsabilidades dos Estados Unidos ao explicitar que “economias avançadas, inclusive aquelas com moedas de reserva, serão vigilantes contra a volatilidade excessiva e movimentos desordenados nas taxas de câmbio. Essas ações ajudarão a mitigar o risco de volatilidade excessiva nos fluxos de capital que alguns países emergentes enfrentam”.
O texto cifrado dos comunicados abre espaço para prováveis ações coordenadas globais nos mercados de câmbio.
A expectativa agora é que os chefes de Estado do G-20 avancem em direção a um compromisso mais concreto, com efeitos no curto prazo. Um sinal de que as coisas podem estar caminhando foi o encontro que Geithner teve, após a reunião na Coreia, com Wang Qishan, vice-primeiro-ministro do conselho de Estado chinês e representante especial do presidente Hu Jintao. Os dois encontraram-se em uma sala especial no aeroporto chinês de Qingdao. De oficial, apenas soube-se que se tratava de uma conversa preparatória para a cúpula de novembro e espera-se que as divergências tenham diminuído.