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Economia

Sem eficácia, IOF não freia enxurrada e dólar despenca

Fed amplia pressão e há dúvidas sobre impactos na meta de inflação brasileira.

O Brasil lançou mão de dois aumentos na alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nas aplicações de investidores estrangeiros em renda fixa no Brasil no intervalo de quinze dias em outubro e assustou o mercado. Mas essa medida de controle de capital já perdeu a eficácia. Dólares continuam aportando no País. Em outubro, o ingresso líquido foi de US$ 6,917 bilhões. Descontando operações extraordinárias de capitalização da Petrobras em setembro deste ano e Santander praticamente um ano antes, o fluxo cambial do mês passado é o maior desde o início de 2009.

O Banco Central continua remando contra a maré e já comprou US$ 36,953 bilhões de janeiro a outubro. O governo vai ter que tomar novas medidas para conter a apreciação do real que voltou a se intensificar ontem, quando o Brasil seguiu o rali global de ativos financeiros e commodities deflagrado pela decisão do Federal Reserve (banco central americano) de injetar US$ 600 bilhões na economia até meados do ano que vem. Moedas do mundo inteiro avançaram frente ao dólar. O real se valorizou em 1,37%, para R$ 1,678.

Apesar das dúvidas dos analistas quanto ao poder do afrouxamento monetário do Fed resgatar a economia americana ativando o consumo, a ampla liquidez externa conspira contra a disposição do governo brasileiro de conter a apreciação cambial e também contra o controle da inflação.

“A implicação de curto prazo da decisão do Fed é ampliar o fluxo de capitais para os emergentes. As commodities, já em alta em dólares, devem continuar. Mas o impacto inflacionário não deve preocupar, desde que o governo não impeça os movimentos do câmbio. Isto é, se deixar o real valorizar, as commodities não sobem tanto em reais, diminuindo o potencial efeito inflacionário; as commodities só vão subir substancialmente em reais – com impacto na inflação – se o governo continuar evitando a apreciação do real por intermédio de mais controles de capitais e intervenção no câmbio”, pondera a economista da PUC-Rio, Mônica de Bolle, sócia da Galanto Consultoria e diretora da Casa das Garças, que não concorda com a ideia de que o governo brasileiro precisa fazer algo para conter a apreciação do real. “Não vejo riscos de ‘desindustrialização’ que justifiquem medidas mais agressivas do que as já adotadas”, afirma.

A economista considera que a grande questão a ser avaliada na gestão macroeconômica é o câmbio. Depois, a inflação. “Sabemos é que o real vai valorizar e isso, penso, é natural nas atuais circunstâncias, em que o emissor da moeda internacional está desbastando o dólar com medidas de afrouxamento quantitativo. Mas existem pessoas, que podem fazer parte do governo Dilma, que defendem o intervencionismo cambial. São aqueles que dão ouvidos aos clamores de desindustrialização”, afirma a economista, que lembra da opção do Brasil pelo câmbio flutuante.

Fábio Romão, especialista de preços da LCA Consultores, explica que o mercado não está precificando uma internalização da alta de commodities. “O mercado trabalha com um IGP-M, que é o melhor indicador das oscilações de preços agrícolas e minerais internacionais, em torno de 5,2% no ano que vem, metade do que será registrado neste ano”, diz Romão, que avalia que a valorização do câmbio que ocorrerá em 2011 será capaz de “zerar” o efeito de alta nos preços das commodities.

Marco Franklin, sócio da Platina Investimentos, também não vê inflação preocupante em 2011. “Além de um mercado apertado, sem folga entre oferta e demanda neste ano, as commodities vem sendo pressionadas nos últimos meses por condições climáticas adversas e por uma espuma especulativa nada desprezível. Sem choques climáticos nos próximos meses, os preços ficarão onde estão. E a inflação de alimentos no Brasil pode vir a ser uma surpresa positiva”, afirma o economista para quem “preço é o melhor fertilizante para os produtores. Quem puder plantar, vai plantar e o mercado estará mais folgado em 2012 e sinais já são emitidos nos mercados futuros”.

Para Fabio Silveira, sócio-diretor da RC Consultores, a influência da expansão monetária promovida pelo Fed nos preços das commodities já começou. “Os investidores e especuladores já estão fazendo a festa desde que o Fed anunciou que faria uma injeção de liquidez. A única diferença é que agora o Fed formalizou a expansão, mas os preços já estão pressionados e a tendência é piorar”, avalia. Para o economista, a valorização adicional do câmbio ajudará a atenuar a elevação dos preços dos produtos básicos, mas não o suficiente para neutralizar o processo.

A contínua apreciação do real é o cenário básico citado por economistas que não veem chance de o IOF ou o BC sustentarem a moeda no patamar de R$ 1,70. Para Vladimir do Vale, economista-chefe do Crédit Agricole, o dólar vai ficar abaixo de R$ 1,60 ao longo do primeiro semestre do ano que vem – atingindo, assim, a menor cotação desde os R$ 1,56 registrados em agosto de 2008, antes da crise mundial.

“Teremos uma valorização de pelo menos 6,5% independentemente do que o governo faça”, diz Vale, presente em seminário promovido ontem pela Câmara de Comércio França-Brasil, em São Paulo. Marcelo Carvalho, economista-chefe para a América Latina do BNP Paribas, também presente no evento, avalia que a valorização do câmbio “já está precificada” e ocorrerá como reflexo da larga expansão monetária promovida pelo Fed.

Segundo Carvalho, a liquidez gerada pela política do Fed vai “migrar”, em boa parte, para operações com commodities agrícolas e minerais, cujos preços são negociados na Bolsa de Chicago (EUA). “Os preços, então, vão aumentar e isso vai pressionar a inflação de alimentos, o que vai deixar nosso BC ainda mais preocupado em cumprir a meta de inflação, e, então, vai aumentar os juros”, raciocina Carvalho. A elevação dos juros, porém, vai ampliar a atratividade das taxas brasileiras – cerca de dez pontos percentuais acima dos juros nos países ricos, onde as taxas estão em torno de zero.