O nervosismo que dominou os mercados de grãos da semana passada para cá e provocou fortes valorizações na bolsa de Chicago não foi suficiente para evitar que soja, milho e trigo encerrassem agosto com cotações médias mais baixas que em julho.
Segundo cálculos do Valor Data baseados nas médias mensais dos contratos futuros de segunda posição de entrega (normalmente os de maior liquidez), o milho lidera as perdas (8,12%), mas a queda da soja também é expressiva (6,17%). No caso do trigo, que oscilou à reboque dos outros grãos, mais negociados, a baixa é mais modesta (2,46%). O balanço foi fechado no dia 29.
Dessa forma, a tendência estrutural de queda dos preços dos grãos derivada da recomposição da oferta nos Estados Unidos prevalece, mas todos os sinais indicam que ainda haverá fortes emoções nesses mercados em setembro, reta final do desenvolvimento das lavouras americanas.
Como o clima quente e seco que afeta um quarto do Meio-Oeste dos EUA (incluindo o coração do cinturão do milho), é uma realidade, não apenas fruto da imaginação de especuladores (ver página B15), as próximas semanas prometem uma bateria de testes para cardíacos – ainda que as perdas tendam a ser bem menores do que indicam os eletrocardiogramas.
Assim, antes da confirmação desse cenário os preços médios dos grãos ainda poderão interromper, em setembro, a trajetória de queda em que se encontram. Agosto foi o terceiro mês seguido de baixa das cotações médias da soja em Chicago, o quinto mês de recuo do milho e o terceiro de desvalorização do trigo.
Só que as médias de agosto foram pressionadas pelo comportamento dos preços nos primeiros 20 dias do mês. Ontem, em Chicago, a segunda posição da soja fechou a US$ 13,6850 por bushel, ante média mensal de US$ 12,7693. O milho chegou a US$ 4,8150 por bushel, ante média de US$ 4,6913, e o trigo ficou em US$ 6,54,25 por bushel, ante média de US$ 6,5367. E os patamares atuais mais elevados puxarão as médias de setembro para cima.
Decisivo para essa definição será o próximo relatório de oferta e demanda que será divulgado pelo Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) no dia 12. No levantamento publicado no início deste mês, o órgão cortou em cerca de 5 milhões de toneladas suas previsões tanto para a produção de milho quanto para a colheita de soja do país em 2013/14.
A tesoura refletiu as adversidades climáticas do Meio-Oeste, e novos cortes são esperados – daí as recentes altas de preços. Mas, apesar dos ajustes, as produções serão muitos superiores às do ciclo 2012/13, castigada pela mais severa estiagem nos EUA em mais de 50 anos – daí a tendência estrutural de baixa.
Do ponto de vista inflacionário, pode não ser uma boa notícia. Mas haverá espaço para que os produtores brasileiros acelerem as vendas antecipadas da grande produção esperada no novo ciclo (2013/14) em condições melhores do que as que vinham sendo observadas. E o câmbio também permanece favorável para isso.
“É importante que os produtores aproveitem essas oportunidades porque o cenário de queda perdura. Ainda é preciso dimensionar corretamente os danos causados pela atual estiagem nos EUA, mas não deverá ser nada capaz de interromper a tendência”, afirma Fabio Silveira, diretor de pesquisa econômica da GO Associados.
Enquanto isso, o manancial segue rico para especulação. Para Silveira, ela se concentrará mais na soja, em linha com o que vem progressivamente acontecendo desde o marcante aumento da “financeirização” dos mercados de commodities agrícolas, na década passada.
“É um dos mercados de commodities de maior liquidez do mundo, atrás do petróleo. Com isso, tem atraído os investidores que querem se rentabilizar nos mercados futuros diante da piora dos retornos em outras aplicações. Mas a tendência é que esse movimento perca força”.
Silveira observa que hoje há no mundo uma massa monetária que tem funcionado como um colchão para os preços agrícolas. Mas medidas como o provável aumento dos juros nos EUA, por exemplo, poderão desinflar esse colchão, o que abriria espaço para uma baixa mais acentuada dos preços.
“Esse movimento derrubará sobretudo a soja, que, por sua grande liquidez, tem sido o principal bastião de resistência nos mercados futuros agrícolas”. Um dos motivos que explicam a preferência especulativa pela soja é o volume proporcionalmente elevado para comercialização no mercado externo.
Conforme o USDA, as exportações globais de soja em grão deverão atingir 107,4 milhões de toneladas em 2013/14, ou 38,1% de uma produção mundial estimada em 281,72 milhões de toneladas. No milho, os embarques somarão 104,02 milhões de toneladas, ou 10,9% da de uma produção global calculada pelo órgão em 957,15 milhões.
Entre as “soft commodities” negociadas na bolsa de Nova York, o destaque é a alta de 7,96% dos preços médios dos contratos futuros de segunda posição de entrega do cacau, basicamente motivada pela escassez de chuvas no Oeste da África, onde estão localizados os principais países produtores da amêndoa.
O açúcar recupera parte das perdas recentes e fecha o mês com cotação média 0,97% superior à de julho, enquanto o algodão continua a se afastar das mínimas de 2012 e sobe 2,11%. Já o café ainda sente a pressão da oferta global confortável e cai 2,27% e o suco de laranja, sem danos causados por furacões à citricultura da Flórida, recua 2,61%.