Dois fatores têm caracterizado o mercado internacional do milho: a forte volatilidade nos últimos meses e os preços mais elevados dos produtos agrícolas durante a primeira metade do ano de 2011. Esses fatores têm despertado preocupações dos governantes dos países desenvolvidos. Essa preocupação deriva dos impactos que a elevação no custo da alimentação tem sobre a inflação interna em cada um deles, mas também do impacto que o aumento no preço dos produtos agrícolas tem sobre a estabilidade política nos países menos desenvolvidos.
Em recente reunião dos ministros de Agricultura dos países do G20 (19 maiores economias, mais a União Europeia) foi desenvolvido um plano de ação com objetivo de implementar ações para reforçar a segurança alimentar no Planeta. Esse plano de ação contempla desde ações voltadas para estimular o aumento da produtividade agrícola e da produção de alimentos quanto para a melhoria na transparência e na informação nos mercados de commodities agrícolas.
Nos três últimos meses, os preços do milho no mercado internacional se apresentaram incrivelmente instáveis. Esse comportamento está mais marcante no mês de junho quando, após atingir o recorde histórico de US$ 7,99 por bushel (cerca de US$ 311,00 por tonelada), os preços despencaram para algo em torno de US$ 6,50 (cerca de US$ 255,00 por tonelada) no dia 28 de junho, subiram para cerca de US$ 7,00 no dia 29 e fecharam em US$ 6,30 no dia 30 de junho.
Essa súbita queda nos preços do milho em Chicago vem a reboque da liberação do “Acreage report” do USDA – Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (no dia 30 de junho), que informa uma área de 22,8 milhões de hectares plantada com milho na safra de 2011 nos Estados Unidos. É o terceiro ano consecutivo de aumento e a segunda maior área plantada com milho, abaixo apenas da verificada em 2007. O crescimento na área com milho foi de mais de um milhão de hectares em relação ao registrado para a safra de 2010.
Com esse resultado, as culturas vencedoras da “guerra das áreas” nos Estados Unidos foram o milho e o algodão, sendo que a soja teve sua área reduzida em mais de 600 mil hectares.
Esses são apenas os números iniciais da safra. Existem indefinições tais como o real prejuízo do atraso no plantio e também do efeito das inundações que ocorreram em algumas áreas produtoras, durante o mês de junho. Entretanto, caso as estimativas iniciais de rendimentos se concretizem, esta safra de 2011 tem tudo para ser uma das maiores dos EUA. Pela reação dos preços, essa aparentemente é a visão dos operadores de mercado.
Situação Interna
No Brasil, os preços continuam se situando na faixa entre R$ 22,00 e R$ 26,00 o saco nas principais regiões consumidoras, muito acima do verificado há um ano. Com a proximidade da colheita da safrinha (em algumas regiões de Mato Grosso a colheita já se iniciou), os preços começaram a cair. Isso ocorre em regiões como Lucas do Rio Verde (MT), Rio Verde (GO) e Uberlândia (MG), que estão mais próximas das regiões com maior produção de milho na safrinha do Centro-Oeste. O caso de Lucas do Rio Verde é o mais característico dessas regiões, pois o preço caiu de R$ 18,50 para R$ 13,60/sc na última semana, demonstrando que o mercado local ainda é relativamente fraco para absorver grandes quantidades de milho. Ao contrário, em localidades próximas à região de safrinha do Paraná, os preços ainda não apresentam sinais de redução, indicando uma situação em que a produção a ser obtida nessa época estará mais ajustada à demanda regional.
Com relação à produção de milho na safrinha, o Imea – Instituto Matogrossense de Economia Agrícola – liberou no dia 24 de junho seu boletim semanal do milho, com as mais recentes informações sobre a estimativa de produção do cereal na safrinha de Mato Grosso. Por conta do atraso na colheita da soja, que impediu o plantio de milho safrinha na época mais adequada, confirmou-se a redução de 10% na área plantada.
Como resultado do plantio atrasado, a colheita também está. No ano passado cerca de 20% da área já tinha sido colhida em Mato Grosso. Neste ano, apenas 5%. Pelo mesmo motivo, e agravado por restrições hídricas, a produtividade esperada é cerca de 10% inferior (como a colheita ainda está no início, esse valor pode ser alterado).
Como resultado, os números do Imea indicam uma redução de 1,7 milhão de toneladas na produção estadual, com uma sobra de cerca de 4,0 milhões de toneladas para exportação ou para comercialização em outros estados (após retirar 2,5 milhões de toneladas para o consumo estadual).
Embora o Mato Grosso seja o estado com maior área plantada com milho na safrinha, e o efeito dessa drástica redução na produção certamente impactará o mercado no segundo semestre, ainda falta verificar as informações mais atualizadas para a produção em Goiás e no Paraná, que serão liberadas pela Conab (Companhia Nacional do Abastecimento) na próxima semana.
De qualquer forma, a safra brasileira de milho 2010/11 se encaminha para um maior equilíbrio do que o verificado na safra de 2009/10. Menores intervenções do governo serão necessárias para garantir níveis mínimos remunerativos de preços. O problema é que a memória dos preços do ano de 2010 permanece. Porém os consumidores devem lembrar que aquela situação foi o que se pode chamar de fundo de poço e que sua repetição, além de ser indesejável para o bom funcionamento da cadeia de produção e transformação do milho, será difícil de ocorrer.
Menos mal que essa conjuntura esteja ocorrendo em um ano em que as condições de produção no Nordeste tenham sido muito favoráveis, com a menor necessidade de transferência de milho de outras regiões para abastecer o mercado nordestino.
Nessa nova situação, as exportações ainda serão necessárias para regularizar o mercado interno, evitando que os preços caiam a níveis desestimuladores para a implantação da próxima safra. A esse respeito, as exportações de milho pelo Brasil continuaram recuando. Em maio foram exportadas apenas 60 mil toneladas (a menor quantidade exportada nesse mês, desde 2005), com uma grande redução do preço médio para US$ 179,00 por tonelada. Com a contínua valorização do real frente ao dólar americano, o mercado interno tem se mostrado ser mais interessante. Esse mercado será mais bem definido após o mercado americano terminar os ajustes provocados pelas recentes divulgações das condições de produção de milho nos Estados Unidos.
João Carlos Garcia e Jason de Oliveira Duarte, pesquisadores da área de economia agrícola da Embrapa Milho e Sorgo.